Singularidades de um mundo citadino
Se há dados adquiridos sobre esta banda, um deles será que as suas músicas sempre foram sinónimo de calor, juventude, intelectualidade e até de – convenhamos – alguma ‘betice’ (no dress-code, pelo menos). Resumindo tudo numa palavra, Vampire Weekend – uma das propostas mais sólidas da indie pop moderna – sempre rimou com o conceito de ‘cool’.
Para além do travo africano com que pontuaram muitas das canções pop da sua estreia homónima, os quatro nova-iorquinos foram expandindo a fórmula no álbum que se seguiu, acrescentando ao baixo galante, à guitarra límpida, à bateria nua e aos teclados ecléticos, as batidas eletrónicas e o uso de samples. Isto, claro, sempre com muito verão e jovialidade à mistura, onde um rock enérgico andava de mãos dadas com uma pop viciante.
Já contra os lugares-comuns tipicamente associados a Vampire Weekend, parece estar a capa do novo Modern Vampires of the City, terceiro lançamento de uma discografia (até prova em contrário) imaculada. Afastando-se os olhos daquela fotografia de uma Nova Iorque excessivamente nublada e prestando-se atenção ao que sai dos auscultadores, constata-se o quanto envelheceram, de facto, estes jovens-adultos.
Trocaram-se, por exemplo, os ritmos frenéticos e o calor da instrumentação por períodos mais contemplativos ou por letras que, mais do que o costume, nos convidam a refletir seja sobre o nosso próprio prazo de validade, seja sobre o que raio é isso de haver (ou não) Deus, bem como outras trivialidades que atormentam essa espécie que é o ser humano citadino. Na teoria, o melhor era desconfiar. Mas, na prática, a coisa funcionou deliciosamente bem.
Afinal, o grupo pegou nas suas forças de sempre – a voz deliciosamente estridente e a pena sempre afiada de Ezra Koenig (autor de muitas das letras), o ecleticismo do teclista Rostam Batmanglij, ou o faro para as boas melodias e refrões – e arrastou-as para novos horizontes. Exemplos disso são momentos como a contemplação exótica de “Hannah Hunt” ou a tensão quase-cinematográfica de “Hudson”, com teclados e ambiências dignas de suspense noturno.
Outro dos avanços sónicos é uma doce canção de embalar chamada “Young Lion”, marcada por vozes cândidas q.b., à medida que alguém brinca com esse instrumento de teclas quase medieval que é o cravo. É também ao som deste instrumento que se constrói aquele que é um dos momentos mais belos e singulares na história dos Vampire Weekend: a deambulação melancólica de “Step”, num aparente tributo à música urbana, onde cabem inclusive alusões à própria efemeridade da vida humana.
Mas se a alegada maturidade dos Vampire Weekend os pôs a compor canções mais reservadas e melancólicas, a verdade é que nem os momentos mais enérgicos e capazes de invocar a genica dos primeiros anos ficaram negligenciados. Onde “Diane Young” (vulgo, ‘dying young’) é façanha de rock vigorosamente difícil de imitar, a aparente farpa ao fanatismo religioso de “Unbelievers” pega no rock desbragado de uma “A-Punk” ou “Cousins” para lhe dar um novo toque de ironia.
Claro que quando um álbum está de tal modo bem construído ou tematizado como é o caso deste Modern Vampires of the City, de pouco servem as discriminações positivas. E, se em quase cada um destes doze momentos é possível encontrar-se um apelo ou solidez dignos de contracenar com o que de melhor os Vampire Weekend tinham feito até aqui, só resta concluir que o terceiro disco será – a seu modo – façanha maior. Caso para dizer que a maturidade (por enquanto) lhes assenta bem. “Ya Hey!”