É tudo vosso: uma viagem de alma e coração
Na matemática o delta (o triângulo – símbolo da banda) serve as equações para identificar mudanças. Na música dos britânicos Alt-J (comando que no Mac OS X gera a tal figura geométrica) identifica a mistura melódica que caracteriza a banda. Joe Newman (Guitarras e Vozes), Gus Unger-Hamilton (Teclados) e Thom Green (Bateria) regressam de Nara com um punhado de novas canções para encerrar o seu segundo álbum de originais, This Is All Yours.
As expectativas estavam altas. An Awesome Wave (2012) brilhou e não foi pouco. Em Portugal passaram discretos no Milhões de Festa e foram recebidos, um ano depois, no outrora Optimus Alive, num palco secundário, onde a quantidade e a qualidade de público fez inveja a muitos palcos principais espalhados pelo mundo.
Ao olhar para o alinhamento de This Is All Yours notam-se várias semelhanças estruturais quando comparado com seu antecessor: uma “intro”; três Naras ao invés de igual número de interlúdios e, até, uma segunda parte de “Bloodflood”. O resto pertence aos próprios e à sua imaginação.
Fonte: Público
Mais, mais, mais
Mais electrónicos, mais melódicos, mais maduros. Os Alt-J de This Is All Yours são diferentes daqueles que fizeram An Awesome Wave. A crítica têm-se dividido entre elogios e condenações àqueles que em 2012 foram apelidados de ‘os novos Radiohead’. A música mais criticada é “Hunger of the Pine” que vai ter com a jovem sensação (??) da música pop, Miley Cyrus. A protagonista de “Wrecking Ball” empresta a voz ao loop ‘I’m a female rebel’, frase interpretada pela cantora em “4×4”, do álbum Bangerz (2013). “Pusher” é, também, uma das músicas menos conseguidas. Apesar de se perceber como uma balada lenta é uma canção que fica muito àquem do que se ouve no género.
Já “Left Hand Free” “Every Other Freckle” e “Warm Footwhills” são as músicas que mais se destacam no disco. A primeira inspira-se no Blues e em alguns trabalhos que os The Black Keys fizeram dentro do género. A seguinte vai até ao Indie Rock e passa pela música experimental, conseguindo criar momentos de singalong com o público. Por outro lado, “Warm Footwhills” – uma música para o pôr-do-sol – ladeia-se no Indie Folk e conta com a participação de Conor Oberst – músico que esteve presente na edição de 2014 do Vodafone Paredes de Coura. Duas músicas para estados de espíritos diferentes e que refletem bem as novas opções da banda.
“Bloodflood pt.II” mostra o calor humano que a banda é capaz de incorporar nas músicas. Um seguimento que marca uma evolução relativamente à primeira demanda, mostrando um lado mais melancólico. “Intro” faz as delícias daqueles que gostam da boa música que o Rock Alternativo é capaz de dar – loops vocais muitos bem conseguidos, sintetizadores fortes e maduros e samples condizentes com este estilo, no registo eletrónico.
“The Gospel of John Hurt” e “Choice Kingdom” – que conta com “Garden of England” como introdução – são músicas que funcionam em crescendo, uma vez que só é possível apreciá-las na plenitude a partir de meio. A primeira embebe cânticos gospel enquanto a segunda vale pelos sons ambientes e pelo falsetto de Joe Newman.

Fonte: The Guvernment
Bem-vindos a Nara!
Nara tem tantas explicações quanto de músicas: pode ser uma referência à cidade (ou província) japonesa de Nara; pode ser um deus da religião Hindu (que em português significa ‘homem’); ou pode ser pura coincidência.
Chega-se a Nara [“Arrival in Nara”] como o Outono chega às pessoas: o ar frio, as noites precoces e a nostalgia de verão sentem-se ao som das linhas de guitarra intimistas, dos segmentos de teclados minimais, dos toques de violino e dos coros preenchidos de inspirações em Bon Iver, Radiohead e, claro, Alt-J.
Já em “Nara” ouve-se o sino da igreja local acompanhado dos “aleluia, aleluia” da banda. No centro, o piano é trocado pelo sintetizador, pelo órgão e pelas samples. O som torna-se mais arrojado e mais escuro. Quase que se troca o outono pelo inverno – resultado das ‘palhetadas’ de guitarra, dos efeitos escolhidos, da voracidade das vozes e do poderio das teclas de Gus.
Chegaram, viram e partiram. “Leaving Nara” é o epíteto dos dois capítulos anteriores. Assusta pelos seus 16 minutos e três segundos, mas a maioria do tempo faz lembrar a música “4’33” de John Cage – uma música que é, em toda a sua composição, silêncio. A nível musical, os loops e samples introspectivos, no fundo, não acrescentam nada ao que já havia sido apresentado de Nara.
Ao deixar este espaço (físico ou metafísico, consoante a explicação escolhida) fica a sensação de que Nara é o local para afogar tristezas, expulsar energias negativas ou então ficar a remoer a música melancólica característica dos dias outonais ou invernais do ser humano. Mas, como este ser peculiar também precisa de libertar Dopamina (a ‘hormona da felicidade’), os Alt-J proporcionam momentos alegres, de bater o pé e, quem sabe, de sonhar com o verão que cada um consiga construir. Isto é tudo vosso.