Depois de no ano passado ter eliminado o Nacional, o Santa Maria, equipa do Campeonato Nacional de Seniores, voltou a fazer história na Taça de Portugal. A formação barcelense venceu a Académica, em casa, com um golo de Hugo Veiga, o capitão, na conversão de uma grande penalidade. O ComUM voltou a acompanhar o regresso do plantel ao trabalho.

Grande penalidade. Bola na marca. Silêncio, olhares vidrados e mil pensamentos. O momento é de cortar a respiração. Ansiedade crescente, coração acelerado. Uma equipa, um estádio e uma freguesia em suspenso. Aquele momento pode representar uma página histórica. Aliás, mais uma.

Exige-se frieza, calma e segurança a quem tem a responsabilidade de marcar. Um homem transformado em pedra, imune e concentrado. O tempo corre, parece que passou uma eternidade e ainda continua tudo na mesma. Soa o apito. Seco e estridente. É agora. Não há volta a dar.

Lá no meio, Hugo Veiga diante da baliza. O capitão tem o olhar no guarda-redes, parece calmo e sereno, quase alheado de tudo. O facto de ser psicólogo talvez ajude a explicar a tranquilidade. Corrida de balanço, remate, golo. Descarga de adrenalina, festa e a vontade de repetir a proeza do ano passado torna-se cada vez mais forte.

«Estava muito calmo, muito ponderado na hora de tomar a decisão. No momento do penalty esquecemos os adeptos, os treinadores, tudo o que está à volta e a partir daí as coisas saem de forma natural», explica Hugo Veiga. A tranquilidade do capitão é uma imagem de marca e não se nota apenas no relvado, porque o discurso de Hugo segue a mesma linha – sereno, realista e nada eufórico. «Ele é a alma da equipa», diz Fernando Santos Portela, vice-presidente do Conselho Fiscal e pai do presidente do clube.

O capitão sente-se bem com os elogios, não se esconde do lugar que ocupa, mas prefere partilhar as luzes dos holofotes com os colegas de equipa. «É também o reconhecimento do papel que eu tenho desenvolvido no clube. É evidente que gostamos de ser reconhecidos individualmente, mas foi, acima de tudo, um momento colectivo», atira Hugo Veiga. E não, não se sente herói. «Encaro este momento de uma forma normal», diz.

 

Uma equipa diferente e um treinador de «máquinas»

Entre o jogo com o Nacional e o jogo com a Académica há um espaço temporal de um ano. O plantel do Santa Maria está diferente e somente quatro jogadores repetiram a titularidade – Hugo Veiga, David Freitas, Miguel e Venú. Para o presidente, Francisco Portela, a primeira vez foi mais marcante. «São vitórias diferentes. A do ano passado foi mais sentida da minha parte, porque foi a primeira vez que o Santa Maria conseguiu eliminar um clube da Primeira Liga», confessa o líder do clube.

Pelo meio das duas proezas, o Santa Maria trocou de treinador. No fundo, tratou-se quase de um regresso à casa de partida, porque Nuno Sousa, que saíra para o Freamunde e deixara o lugar vago para Pedro Rocha, regressou ao clube em dezembro de 2013 – Pedro Rocha é agora treinador do Merelinense, clube da principal divisão da AF Braga, onde também joga Telmo, o herói da época passada.

«Esta vitória é o reconhecimento do trabalho de toda a gente, desde o homem que chega cá primeiro para abrir as portas até aos diretores que fazem tudo para que não falte nada», afirma o treinador, de 34 anos, orgulhoso do que os jogadores fizeram frente à Académica. Nuno Sousa quer uma equipa altiva, personalizada e confiante. Que lute, corra e… ganhe.

«Os jogadores sabem o que eu quero. Quero que sejam máquinas a jogar futebol», dispara. A exigência, percebe-se, é máxima.

 

Querer chegar alto sem ser na Playstation

No ano passado, a história da festa do Santa Maria escreveu-se em volta dos leitões, quatro ou cinco, segundo se disse na altura, que o presidente da Assembleia Geral do clube tinha prometido ao plantel. Afinal, sabe-se agora, a promessa não foi cumprida. Por isso repete-se a ideia de que as histórias são escritas e rescritas conforme as circunstâncias. Este ano, foi Hugo Veiga quem decidiu dar uma recompensa ao plantel: uma Playstation. É palavra de capitão.

Ao contrário da época anterior, não está previsto nenhum prémio financeiro por parte da Direção do clube. Para o presidente, há outras formas de recompensar o esforço. Continuar a dar nas vistas, por exemplo, é uma delas: «O Santa Maria tem fornecido bastantes jogadores para as ligas profissionais e esperamos que, dentro de um ano ou dois, alguns elementos deste plantel também cheguem lá».

O orgulho na formação é, aliás, indisfarçável. O clube gosta de projetar os jovens, permitindo-lhes chegar mais alto – da equipa do ano passado, saiu o guarda-redes Fábio Pereira para o Aves, da Segunda Liga. Por isso, no Estádio da Devesa há imagens de Nélson Oliveira, Paulinho, Hugo Vieira ou Fonseca, quatro jogadores profissionais que passaram pelo Santa Maria. «Essa é a maior recompensa que podemos ter», orgulha-se Francisco Portela.

 

Reportagem: Ricardo Costa | Telmo Crisóstomo

Edição e Produção: André Malheiro | João Ribeiro