Terminada a licenciatura em Ciências da Comunicação na Universidade do Minho, Ana Luísa Alves ingressou, em setembro de 2014, no mestrado em Relações Internacionais e decidiu fazer Erasmus no segundo semestre. Do Rio de Janeiro, a jovem natural de Ponte de Lima fala, em primeira mão, dos quase quatro meses que leva na ‘Cidade do Samba’.

No início de Fevereiro, para fazer a vontade ao Olavo Bilac, decidi ser um “estrangeiro no Rio de Janeiro”. Com 70% do meu núcleo familiar e de amigos a vaticinar uma série de catástrofes que iam desde assaltos, violência, doenças e até – o pior de todos os cenários – não me adaptar ao país, decidi fazer um semestre de intercâmbio na cidade que tem muito de maravilhoso.

A minha ingenuidade impediu-me de me precaver para a primeira dificuldade: o português de Portugal não é o do Brasil. E a grande maioria das pessoas nunca teve contacto com o nosso sotaque (apesar da elevada qualidade, as novelas da TVI ainda não chegaram a este lado do Atlântico, como acontece com as da Globo). Nos primeiros dias, quando perguntava onde era a paragem de autocarro (ponto de ónibus) respondiam: “Spanish? English?”. Quando pedia um gelado (sorvete) repetia-se: “desculpe, não falo estrangeiro, só português”. Ou, quando pedia uma cerveja (chopp), entreolhavam-se e diziam: “Acho que é russa!”. Em vez dos biquínis e óculos de sol, o investimento num curso de português do Brasil era bem mais útil.

Aterrei precisamente no reboliço do Carnaval. E quando dizem que é a maior festa do mundo, (apesar de eu nunca ter ido às festas de Santo Aleixo da Restauração em Beja, nem aos Grandiosos Festejos em honra de São Mateus em Viseu), não posso senão concordar categoricamente.

Mas falemos de coisas realmente sérias e úteis. Eu vim para estudar. Não vou dar conselhos sobre a melhor balada da cidade, a mais insana boate da lapa, ou o ‘boteco’ (bar) com a melhor cerveja e as melhores empadas de frango. Apesar de ter concluído a minha licenciatura em Ciências da Comunicação, encontro-me a fazer mestrado em Relações Internacionais. Sendo da área ou não, penso que todos reconhecemos que o nosso ensino é muito focado nas dinâmicas da União Europeia.

Eu queria experimentar uma realidade diferente. Uma visão do mundo por aqueles que, sendo territórios outrora colonizados e apesar das dificuldades, sempre lutaram por um lugar no cenário internacional e têm conseguido nos últimos anos fazer-se presentes nas principais decisões de política internacional (veja-se o caso dos BRICS). E consegui! Tenho aprendido muito. A visão brasileira do mundo é diametralmente oposta à europeia, em diversos âmbitos: social, de defesa e segurança coletiva e até ambiental. Posso exemplificar, mas não aqui (aceito solicitações para consultadoria de política brasileira mediante um preço justo). Ao nível académico, o balanço tem sido profundamente positivo.

Os brasileiros são um povo “descolado”, que no final do trabalho vai tomar uma “gelada” com os amigos e estende a conversa até altas horas da noite. São alegres mas não conseguem esconder a revolta pelas desigualdades com que se confrontam no dia-a-dia. Qualquer espaço é lugar de reivindicação, de desejo de mudança. E de melhoria da cidade da qual orgulhosamente falam. Tive oportunidade de participar em alguns projetos de voluntariado em favelas do Rio de Janeiro. Entrar nestas comunidades é como fazer uma imersão num filme que toda a gente pensa que é ficção e no final lá vêm as letrinhas “baseado em factos reais”.

Para mim intercâmbio não é apenas sinónimo de oportunidade de conhecer um bocadinho do mundo todo e pelas pessoas tão distintas com quem convives, mas também saber que quando regressarmos vamos voltar aos nossos amigos e família que nos espera de braços abertos. Vai ser tudo igual… menos nós. Menos o nosso ponto de vista. Menos a nossa vontade de querer mais e melhor em todos os aspetos da vida.

O Michel Teló avisou… e o Rio de Janeiro me pegou!