A sete de setembro deste ano, o Conselho Geral (CG) da UMinho aprovou a proposta de Estatutos da Fundação, apresentada pelo Reitor, António Cunha, dando o último passo em direção à transformação para o regime fundacional.
Esta foi a segunda vez que a universidade tentou a passagem a fundação, novamente num período eleitoral. Pedro Passos Coelho disse, durante a campanha, que o decreto-lei está “pronto” para ser aprovado, mas o cenário político do país pode comprometer de novo o processo.
Mas o que significa esta transformação para a Universidade e para a comunidade académica?
O ComUM faz as perguntas e responde.
O que é uma Universidade Fundação?
Uma Universidade Fundação Pública com regime de Direito Privado – é este o nome completo na lei – é, simplesmente, um modelo de gestão de universidades que, mantendo-a pública, permite o recurso ao direito privado, nomeadamente na gestão financeira e do património da Universidade, na contratação de recursos humanos e na aquisição de bens e serviços.
Qual é a diferença entre uma Universidade Pública e uma Universidade Fundação?
As diferenças são várias. Por exemplo, enquanto numa universidade pública é o Estado que supervisiona e tem maiores poderes sobre a instituição, no regime fundacional a relação com o Governo é expressa através de um contrato com objetivos plurianuais. É através destes contratos que as universidades fundação obtêm o seu financiamento proveniente do Estado. Na prática, isto implica que os recursos financeiros deverão vir também da universidade, numa proporção de 50% para cada lado.
Mudam também as carreiras dos professores, investigadores e até funcionários, sendo que as contratações a partir do momento da transformação em universidade fundação têm de respeitar “genericamente” o paralelismo com as carreiras nos restantes estabelecimentos de ensino superior público. A universidade passa assim a não ser obrigada a cumprir totalmente as normas previstas para os funcionários públicos. O contrato de trabalho passa também a ser individual, mas apenas para os docentes que entrem em funções após a transformação.
O modelo de Universidade Fundação traz consigo uma outra peculiaridade: a existência de duas entidades ao mesmo tempo. Uma é o estabelecimento de ensino chamado Universidade do Minho, responsável pelos cursos, centros de investigação e outros serviços. A outra é a Fundação Universidade do Minho, que será responsável pelos edifícios, equipamentos, fundos e pessoal.
E ainda é o reitor a mandar na Universidade?
Numa universidade pública, a gestão pertence ao Conselho Geral, ao Reitor – que preside ao Conselho de Gestão – e ainda ao Conselho Científico ou Técnico-Científico, e ao Conselho Pedagógico – que no caso da UMinho têm as suas funções centradas no Senado Académico, um órgão de consulta do Reitor, sem poder para tomar decisões. No regime fundacional, é acrescentado o Conselho de Curadores, que é nomeado pelo Governo – sob proposta da instituição – e o substitui parcialmente no controlo da universidade.
Este Conselho de Curadores superioriza-se a outros órgãos da universidade, na medida em que tem o poder de aprovar ou não várias decisões do Conselho Geral, incluindo a eleição do Reitor e “iniciativas para o bom funcionamento da instituição”. Porém, Conselho Geral e Reitor são quem ainda delibera sobre o orçamento da universidade e as suas contas.
Porque é esta segunda vez que a UM tenta passar a fundação?
A primeira vez que o Reitor foi mandatado pelo Conselho Geral para negociar com o Governo a transformação da UMinho em fundação foi a 30 de Maio de 2011, a poucos dias das eleições legislativas desse ano. Mas nunca se chegou a avançar para negociações com o Governo, uma vez que a nova equipa ministerial, liderada por Nuno Crato, era contra este regime jurídico.
No entanto, o Governo alterou o seu ponto de vista sobre o assunto no início deste ano, não alterando a lei que regula os vários regimes jurídicos das instituições de ensino superior e, poucos dias depois, o Conselho Geral voltou a mandatar António Cunha para negociar com o Governo.
A proposta de decreto-lei que institui a Fundação Universidade do Minho foi aprovada a sete de setembro deste ano com 12 votos a favor, 7 votos contra, e ainda uma abstenção. É de referir que, entre os representantes dos alunos, a proposta foi aprovada, assim como fizeram os membros externos do Conselho Geral.
Pedro Passos Coelho declarou, durante a campanha eleitoral, que o texto estaria à espera de ser aprovado em Conselho de Ministros. Contudo, a atual conjuntura política nacional não deixa certezas.
Quais são as vantagens de a UMinho passar a fundação?
Em 2010, durante o início da primeira tentativa de passagem ao regime fundacional, o Reitor António Cunha, na apresentação e debate da sua proposta em Conselho Geral, enumerou várias “vantagens objetivas” da mudança de regime jurídico.
Essas vantagens são o “reforço e afirmação da Universidade do Minho” e das suas Escolas e Institutos, o aumento da “flexibilidade de gestão de património e de recursos financeiros”, a maior autonomia na “gestão e na contratação de recursos humanos”, um “alargamento das oportunidades de financiamento” e a “expansão das possibilidades de interação com a sociedade”.
O Reitor falou ainda, nessa ocasião, do maior “leque de oportunidades” de financiamento para as Escolas e Institutos, da manutenção do regime de propinas e de ação social escolar.
E as desvantagens?
São várias as vozes dentro do Conselho Geral que se opõem ao processo desde o seu início. A maior parte dos seus alertas foca-se na situação delicada e instável em que podem ser colocados os contratos de professores, investigadores e funcionários, assim como na percentagem elevada de verbas próprias exigidas pelo regime jurídico em casos de universidade-fundação.
Outra das preocupações é o não respeito por parte do Governo da autonomia atual da universidade – questionando-se se esse respeito existirá no novo regime – tal como a possibilidade de eliminação ou negligência de cursos por não serem rentáveis, principalmente os pertencentes às áreas das ciências sociais e humanas, onde é mais difícil obter financiamento
Uma das críticas expressas na apreciação sobre o estudo das implicações da transformação da UMinho em universidade-fundação, citada também em várias reuniões do Conselho Geral, era a falta de estratégia de negociação do Reitor com a tutela do Ensino Superior, tornando o processo “solitário”.
Por último, foi também mencionada a perda de legitimidade democrática nas decisões de topo da universidade, já que o Conselho dos Curadores não inclui nenhum representante eleito da comunidade universitária.
Esta alteração quer dizer que vou ter de pagar mais propinas?
Este é outro dos receios expressos por vários membros do Conselho Geral. Dado que a UMinho tem que atingir os 50% de receitas próprias para financiamento – foi apontado em Conselho Geral, em 2011, que a Universidade atinge apenas pouco mais de 30% – teme-se que o aumento do valor das propinas seja um dos recursos usado para cumprir o exigido.
O Reitor abordou estas preocupações várias vezes, garantindo que isso não vai acontecer, dizendo mesmo em 2010 que “não deverá haver aumento porque o tecido social existente não acolhe essa possibilidade.”
Ainda assim, António Cunha reconheceu numa outra reunião do CG no mesmo ano “não ter qualquer dúvida que a UMinho terá de procurar meios para aumentar as receitas próprias, quer seja fundação ou não.”
Não foi ainda esclarecido que método será usado para cumprir as regras de financiamento sem recorrer ao aumento de propinas.
Isto já acontece em alguma outra universidade pública portuguesa?
Sim. Em 2009, dois anos depois da criação deste modelo de gestão das universidades, as Universidades do Porto e Aveiro passaram ao regime fundacional no mesmo dia de Abril, seguidas pelo ISCTE em Maio desse mesmo ano.
A experiência destas universidades é, no entanto, pouco conhecida ou pouco esclarecedora sobre as vantagens e desvantagens do modelo. No entanto, são conhecidas algumas situações, nomeadamente a existência de casos em que professores não passaram aos quadros apesar de preencher os critérios, temendo-se que isto possa perpetuar a estadia das mesmas pessoas em cargos de decisão da universidade. Sabe-se também que o Governo não tem cumprido os contratos-programa, não entregando as verbas prometidas.
O que pode, na prática, mudar na minha vida universitária?
É difícil saber, pois, como referido acima, as experiências das Universidades do Porto e de Aveiro, e ainda do ISCTE, são pouco esclarecedoras, e foram afectadas por legislação que impossibilitou a avaliação completa das aplicações deste regime fundacional, ao retirar alguma da autonomia, assim como pelo incumprimento por parte do Estado dos contratos-programa.
Os receios, porém, concentram-se à volta do possível aumento do valor das propinas e do aumento da precariedade dos trabalhadores da Universidade do Minho, assim como se teme o encerramento de alguns cursos.
Nada é, no entanto, claro quanto ao que pode acontecer na vida da Universidade.