A conversão de videojogos para o grande ecrã sempre foi território conturbado. Talvez por não respeitarem o legado da obra original, ou por não conseguirem os nomes certos na indústria. Basta olharmos para exemplos como Max Payne, Far Cry ou até o execrável Street Fighter: The Legend of Chun-Li para perceber que Hitman: Agent 47 tinha uma tarefa colossal entre mãos. E em vez de um tiro certeiro, algo a que o protagonista da franquia sempre nos habituou, desta vez, o Agente 47 abre um novo precedente e falha o alvo.
Realizado por Aleksander Bach (que se estreia neste papel), Hitman: Agent 47 gasta uns largos minutos iniciais em exposição narrativa, sob a forma de narração, que, para além de ser excessiva, acaba por não fazer muito sentido. De forma semelhante aos videojogos (e as semelhanças por aqui terminam), é atribuído um novo contrato ao Agente 47 (Rupert Friend) através de Diana (Angelababy), que consiste em encontrar Katia Van Dees (Hannah Ware) e o seu pai Dr. Litvenko (Ciarán Hinds). Este último é o homem responsável pela criação do programa Agent, que serve de mote aos acontecimentos do filme e que é explicado com desnecessária minúcia nos minutos iniciais.
Na consequência do desaparecimento de Litvenko, Le Clerq (Thomas Kretschmann), o vilão que nunca sai do seu escritório altamente vigiado que mais se assemelha a uma sala de pânico, incorre em várias tentativas falhadas de criar o seu próprio exército de agentes geneticamente modificados. Litvenko é a peça fundamental de que Le Clerq precisa de maneira a poder ressuscitar o programa que o Agente 47 quer terminar a todo o custo.
John Smith (Zachary Quinto), moço de recados de Le Clerq, compete com o Agente 47 na corrida por Katia Van Dees e, depois de algumas reviravoltas altamente previsíveis e sequências de luta competentemente coreografadas (auxiliadas por um trabalho de câmara e montagem que cumprem o seu dever), rapidamente percebemos que a filha de Litvenko não é tão indefesa como inicialmente aparenta, tendo ela própria o seu conjunto de habilidades únicas e, diga-se de passagem, pouco plausíveis.
Segue-se um jogo do gato e do rato entre a dupla de protagonistas e John Smith, que os persegue incessantemente, dando azo a uma série de confrontos que pautam pela banalidade e que nunca se atrevem a sair de uma fórmula que, embora competente, está longe de ser impactante.
Todavia, o maior crime de Hitman: Agent 47 não é o genocídio que o protagonista comete a cada vinte minutos, por entre piruetas que desafiam as leis da física e armas com munições infinitas, mas antes o atropelo desrespeitoso do legado que a série de videojogos criou e respeitou ao longo de vários anos. Hitman, o jogo, não se trata de tiroteios inconsequentes. Enfatiza, antes, a acção furtiva, o planeamento estratégico e o uso criativo do mundo de jogo que só em última instância obriga o jogador a recorrer a armas de fogo. Foram essas características distintivas que fizeram com que Hitman tivesse uma identidade e um factor diferenciador no meio de um mercado saturado de jogos de acção. E aqui reside o maior problema de Hitman, o filme: (ausência de) identidade.
Ao descartar por completo os elementos que fizeram de Hitman um ícone no mundo dos videojogos, arrisca-se a ser mais um filme de acção medíocre, que, embora tenha os seus momentos, se alicerça numa narrativa desinspirada, vilões facilmente olvidáveis e artíficios típicos do género que já vimos melhor executados em outros filmes.
Crítica – Hitman: Agent 47 (2015)
Realizador: Aleksander Bach
Elenco: Rupert Friend; Hannah Ware; Zachary Quinto; Ciarán Hinds; Thomas Kretschmann; Angelababy
Argumento: Michael Finch; Skip Woods
Produção: Adrian Askarieh; Charles Gordon; Skip Woods; Alex Young