Após o lançamento de Painting With, em Fevereiro, Dave “Avey Tare” Portner disse à Pitchfork que os Animal Collective queriam “ter o seu próprio som”, e compreendia que este álbum “era para algumas pessoas e não para outras”. De facto, se querem começar a ouvir Animal Collective, não comecem com Painting With.
Os sons são bem novos: a variação entre as vozes de Portner e Noah “Panda Bear” Lennox está presente em todas as músicas, mas é diferente de qualquer outra coisa que os nove álbuns anteriores trouxeram. Os músicos não cantam muitas vezes em conjunto, mas antes vão trocando entre si frases, sílabas até, num hino à exímia técnica vocal dos Animal Collective.
Mas esta troca de vozes é demasiado constante. Anteriormente, em Feels, por exemplo, cada letra era cantada de forma emocionada, cativando os ouvintes com as suas melodias; agora, esta é vulgarizada, é primitiva.
Todo o processo de construção de Painting With remete para a primitividade humana. Durante a gravação, a banda transformou um dos estúdios mais icónicos de Los Angeles, o Western, colocando piscinas para bebés e decorando as paredes com imagens de dinossauros. Inspiraram-se também em pinturas rupestres e ritmos tribais.
O álbum abre com o single, “FloriDada”, que imediatamente nos soa bem jovial. Não percebemos bem toda a estrutura da música, que nunca se desenvolve além do refrão infantil e alegre. Soa-nos a uma brincadeira, pese embora a complexa troca das vozes já abordada, e a boa profundidade melódica. O single é um dos destaques mais sonantes do disco.
Acaba-se “FloriDada”, e esperamos algo mais claro, diferente. Não tão alternativo e intrínseco. “Hocus Pocus” é-nos, no entanto, estranho, pois ouvimos pela primeira vez a troca de sílabas entre Avey Tare e Panda Bear. Constatamos a partir daqui algo constante em Painting With.
Há uma maior preocupação como ouvinte em perceber a letra por trás das trocas vocais, do que propriamente perceber a inspiração no primitivo que os Animal Collective tentaram passaram. Há brilhantismo no trio, ao qual falta mencionar Brian “Geologist” Weitz. Há génio na construção melódica e frásica. Mas neste álbum, a banda esforçou-se demasiado por procurar um som próprio, tornando-se pouco perceptível. A banda tem um tom próprio, mas este é muito instrospectivo, e notamos que após estes anos, os Animal Collective ainda se tentam encontrar.
Há músicas que fogem, no entanto, à ‘regra’. “The Burglars” é bem construída em termos frásicos. Percebemos um avanço ao longo da música, e entramos numa fuga à realidade que acelera cada vez mais, que nos vicia, e acabamos exaustos quando a música acaba.
Quase a acabar o álbum, encontramos “Golden Gal”, que para mim, é a melhor faixa de todo o disco. É uma verdadeira lufada de ar fresco em Painting With. O baixo do sintetizador é usado de forma dinâmica, dando imensa profundidade e ritmo, e nesta música as vozes de Avey Tare e Panda Bear exibem-se ao seu melhor nível. A música é muito simplesmente sobre um episódio da sitcom “Golden Girls”, outra pérola de outros tempos a servir de inspiração.
Painting With não é melhor álbum para os mais novos admiradores de música alternativa, tirando algumas músicas. É, no entanto, pura genialidade técnica e lírica, apesar de não ser genialidade melódica. E podemos esperar um concerto bem interessante no Porto.
“Painting With”
Animal Collective
Domino Records
2016