As “salutares bofetadas” custaram caro a João Soares. O ex-ministro da Cultura não perdeu apenas uma pasta, mas desceu também os últimos patamares de dignidade e respeito que ainda lhe restavam.

Não é a primeira vez que um post num social media deu aso a despedimentos. Mas é a primeira vez que um ministro cai em Portugal por essa razão. Quatro meses com a pasta da Cultura que corresponderam a quatro meses de situações e palavras menos próprias. Um post publicado no Facebook, às 06h12, na passada quinta-feira, falou por si só aquilo que o recém ex-ministro João Soares deixou, ou melhor foi deixando, desde 1999, bem claro: os jornalistas deste país não devem fazer uso de um direito constitucional, o da liberdade de expressão. Dessa publicação, resultou a apresentação de demissão de João Soares. Demissão que o primeiro-ministro António Costa aceitou “naturalmente”, porque os membros do Governo “nem à mesa do café podem deixar de se lembrar que são membros do Governo”.

Mas o primeiro post não chegou. Numa segunda publicação, feita no dia da sua demissão, o ex-ministro da Cultura dava a saber, na rede social, que saía “por razões que têm a ver com o [seu] respeito pelos valores da liberdade”. E continuou: “Não aceito prescindir do direito à expressão da opinião e palavra“. Posto isto, pergunto-me se João Soares, antes de clicar no botão “publicar”, repensou na ameaça física que fez aos dois colunistas do jornal Público, Augusto M. Seabra e Vasco Pulido Valente. Mas, atenção, no mesmo dia em que tornou a ameaça pública disse ser um “homem pacífico”. Utilizando um ditado popular, e sem nenhum objetivo de agressão verbal, “cão que ladra não morde”.

Creio, profundamente, que João Soares apenas reparou na conveniente pergunta deste social media: ”Em que estás a pensar?”. Um desabafo que lhe custou muito caro, e não falo apenas da pasta que lhe tinha sido entregue por um Governo que prevaricou ideais da Democracia para tomar posse. Parece que o “par de bofetadas” se virou em direção à dignidade e ao respeito que restavam a este ex-ministro que não mediu o poder do Facebook e cometeu o erro de escrever mais do que aquilo que devia… e podia.

Deixo um apontamento: deve haver uma grande diferença entre aquilo que se quer ver escrito e aquilo que vem nos jornais. É a democracia.