Os elogios aos estudantes portugueses, o poder de comunicação das músicas e os problemas mundiais foram alguns assuntos que Gabriel, o Pensador abordou, em entrevista ao ComUM, depois do concerto que terminou a primeiro noite do Enterro da Gata de 2016.
ComUM: O concerto de hoje superou as suas expectativas?
Gabriel o Pensador: Sim, sim. Foi bom de mais. A gente sabe que esteve a chover de tarde, as pessoas preocupadas com isso e que bom que na hora do show não choveu! Todo o mundo já tinha esquecido o frio, a chuva e curtiu bem mesmo. A organização está de parabéns. Tudo ótimo! Palco, som… Não há nada a reclamar. A gente chegou e fez um show, já também com uma energia boa que o Dengaz já estava a fazer. Eu consegui ver o finalzinho do show e gostei. Já vi que o público era bom. Fui lá dar uma olhada, vi que o público era animado e fiquei feliz. A gente já conhece, já se sente bem a vir aqui mas sabe que em cada show pode ter uma pessoa pela primeira vez, pessoas de outros lugares também que não estão a estudar mas que vêm festejar. Então, foi um encontro bem interessante que juntou vários tipos de pessoas. Eu sinto-me mais entusiasmado com a questão dos estudantes mesmo porque a festa é deles e tem todo uma energia concentrada por isso. As pessoas que estão a fazer os seus cursos, um momento importante nas escolhas da vida.
ComUM: Qual a sua opinião sobre os estudantes que estão hoje aqui presentes?
Gabriel o Pensador: Eu acho muito estimulante ver a juventude que sabe organizar-se tanto para a festa como para reivindicações. Casos que a gente sabe de encontros que misturam várias áreas que vão-se espalhar quando saírem daqui. Uns vão ser engenheiros, outros jornalistas, políticos… E cada um vai para um lado. Mas aqui está todo o mundo concentrado e eu sinto um pouco isso quando faço trabalhos no Brasil também com este tipo de público. Sinto um pouco mais forte a esperança nas próximas décadas. Algumas vão estar em atividade, outras já estão e têm essa responsabilidade de fazer um mundo melhor. É um cliché essa expressão mas é uma coisa que precisamos mesmo. Eu tenho dois filhos, as pessoas vão ter os seus filhos… E a gente tem de deixar um mundo melhor e é possível, sim! Acho o jovem português um jovem muito inteligente, muito bem formado, com características que me fazem pensar que são menos alienados do que no Brasil. Eu ainda combato muito nas minhas letras essa questão da alienação no Brasil. Mas aqui parece que as pessoas por estarem na Europa estão a acompanhar muitas coisas, sempre “antenadas”, falando alguns idiomas. Isso também facilita a busca de informações. Eu tenho muitos elogios a fazer a vocês e por isso fico animado com a chegada dessas gerações para tomar as rédeas do mundo.
ComUM: Sendo o único artista internacional a pisar o palco principal do Enterro da Gata de 2016, considera isso um reconhecimento do público português pela sua música?
Gabriel o Pensador: Sim! Eu fico feliz com todos os gestos de reconhecimento. Às vezes até os mais simples são os mais importantes. As coisas que as pessoas falam… Ainda ontem, depois do show do Porto, duas pessoas vieram falar umas coisas bonitas. Uma delas disse que já esteve no fundo do poço e que as minhas músicas ajudaram muito, comentando umas coisas mais específicas sobre uma letra de uma música. A gente ganha a emoção da pessoa. Sabe que a música tem um poder mesmo. Não é só o rap, não é só a minha música… Eu também já senti isso ouvindo músicas e sei que tem algo mais do que a diversão. Tem uma comunicação que pode ser até mais profunda.
ComUM: Então escreve as suas músicas a pensar no impacto que terão nas pessoas que as ouvem?
Gabriel o Pensador: Algumas sim. Algumas músicas têm mais essa característica, outras têm mais leveza, têm temas mais descontraídos. Outras são para fazer pensar em certos assuntos sobre comportamento, preconceito, várias coisas. A música é livre. Eu aprendi com o Bob Marley, por exemplo, que dá para falar de amor, de guerra, de temas sociais e sempre com muita verdade e naturalidade. O Bob Marley é um exemplo que eu posso citar, entre muitos outros artistas, que também têm uma temática variada dentro da obra.
ComUM: Na sua opinião, a letra da música mais recente, “Chega”, e de uma das mais antigas, “Até quando?”, refletem não só a situação política e social brasileira como também de outros países, inclusive Portugal?
Gabriel o Pensador: Sim! Infelizmente, há letras antigas que ainda são muito atuais. Os problemas são parecidos em muitos países. As pessoas querem mais respeito e querem os seus direitos porque fazem tudo o que são obrigados a fazer. Trabalhar, seguir as leis, pagar os impostos… E são muito reprimidas e oprimidas. Isso é no mundo todo. Essas duas músicas são bem semelhantes. A “Até quando?” e a “Chega” têm esse espírito mesmo. Não é uma coisa que reflete só a realidade do Brasil mas foi inspirada nos problemas de lá.
ComUM: Onde e porque é que nasceu o “Gabriel, o Pensador”?
Gabriel o Pensador: Bem, a primeira vez que eu fiz umas músicas eu tinha 11 anos e não era “o Pensador”. Mas eu já gostava de brincar com as palavras e fiz algumas coisas mas depois parei. Aos 15, 16 e, principalmente, aos 17 anos, eu comecei a fazer mais, a fazer de novo e a levar a sério essa ideia e a ouvir rap, entre outros ritmos. No rap, alguns nomes que eu ouvia tinham pseudónimos curiosos e eu quis criar um nome artístico também e eu gostava mais desse lado do rap que faz pensar, do rap que faz refletir e que nos inspira a ter ideias próprias e a não seguir tudo o que nos impõem e esse nome é um pouco por isso. Fui eu mesmo que coloquei e pegou, não é?