O assunto “praxe” volta a estar na ordem do dia. Desta vez, por meio de uma carta aberta, dirigida “a todas as instituições de Ensino Superior” em Portugal e assinada por 100 personalidades de vários quadrantes da sociedade. Dizem que há casos de “violência física, psicológica e simbólica” e recomendam as universidades e politécnicos a criar outras actividades que “configurem uma alternativa lúdica e formativa às iniciativas promovidas pelos grupos e organizações de praxe”.
Abaixo assinada por nomes como o escritor Miguel Sousa Tavares, o sociólogo e professor universitário Boaventura Sousa Santos, a rapper Capicua, a jornalista Fernanda Câncio ou o fundador do Serviço Nacional de Saúde António Arnaut, a missiva começa por dizer que, “em Portugal, as instituições de Ensino Superior universitário e politécnico não ocupam o papel central de integração do estudante na vida académica, fazendo com que os grupos e organizações promotoras de actividades praxísticas não só tenham disputado esse terreno como nele se tenham cimentado, reivindicando hoje para si o papel de agente integrador, muitas vezes exclusivo”. As 100 pessoas lembram o “investimento colectivo que o país empreende” no ensino superior, para que a “transição do Ensino Secundário para o Superior se traduza num processo suave, bem-sucedido e que contribua para o sucesso académico”.
Os subscritores dizem ser “certo que nenhum estudante seja formal ou legalmente obrigado a frequentar as actividades de praxe, seja em que faculdade ou escola superior for”. No entanto, “a pressão para aderir é muitas vezes muito forte e em si mesma uma violência, e a ausência de outros mecanismos integradores é um facto”. A carta, com o título «Integração no Ensino Superior: a democracia faz-se de alternativas», defende que, “em democracia, deve haver sempre lugar à escolha, mas só é possível escolher se houver alternativas consistentes”.
O texto, divulgado ontem e com o objectivo de trazer de novo à discussão o tema da praxe, termina com um apelo: “que as instituições [de ensino superior] informem atempada e eficazmente todos os novos alunos e todas as novas alunas, por exemplo através do envio de um e-mail ou entregando, no acto da matrícula, um esclarecimento nesse sentido, de que as actividades de praxe não constituem qualquer espécie de obrigação”. Deve ser “fornecido um contacto para o qual possam ser endereçadas queixas”, conclui.
O historiador Manuel Loff, que estudou na Universidade do Minho, diz, em declarações ao jornal Público, que “a praxe ganhou uma grande popularidade nos anos 90”. No século XXI, “vem acompanhada do que sempre teve: humilhação de natureza sexual, de um misto da hierarquia e disciplina militar”. O ex-aluno da Universidade do Minho disse ainda àquele jornal que vê “uma total falta de coragem na abordagem deste tema da parte de alguns reitores e directores e administradores das instituições de ensino superior”.
O humorista Rui Unas diz que assinou a carta “por uma questão de justiça”, pois as pessoas “devem poder escolher” — apesar de a missiva que Unas assinou admitir como certo que nenhum estudante é obrigado a frequentar a praxe.
O ComUM tentou obter uma reacção por parte da Reitoria da Universidade do Minho, mas não obteve qualquer resposta até à publicação desta notícia.