Dentro de um álbum cabe muito. Para lá de todas as sensações que possamos absorver ao escutar as faixas que se vão desenrolando ao longo de um disco, como uma história contada melodicamente, há também um universo paralelo que se desenha na mente.

Fonte: The Guardian

Fonte: The Guardian

O universo We Are King, onde todas as paisagens musicais são escritas e produzidas pelas três mulheres que o conceberam, as KING, transporta-nos para locais utópicos, onde floresce a inocência do amor e a tranquilidade da alma.

As vozes, em perfeita simbiose com diferentes sons diluídos entre si, desempenham um papel fulcral neste disco. A acompanhar uma sonoridade que se flexibiliza entre o soul, o dream-pop ou, em momentos, o jazz, a colocação certeira de cada palavra cantada (ou suspirada) lembra um coro celestial, como que se um chamamento divino se tratasse. Há aqui uma calmaria e uma coerência conceptual desfasadas do que, muitas vezes, se costuma ouvir em diversos registos.

A abrir, “The Right One” prepara-nos logo para quase uma hora que pede tranquilidade no conforto de casa ou na relva do parque, sendo procedida pela jóia do álbum, “The Greatest”. O sentimento retro-futurista, a lembrar consolas guardadas no sótão, revela-se como o que melhor resume a flexibilidade presente ao longo de todo o disco. Há um namoro assumido com a música R&B e soul do passado, mas a certeza do presente, num limbo constante e, indubitavelmente, agradável.

A desafiante “Supernatural” parece transportar as KING do estúdio para um concerto jazz, mas “Love Song”, que vem logo de seguida, acalma os ânimos e recorda o sentimento das muitas primeiras vezes que a vida dá. Quase a fechar, “Hey”, que Kendrick Lamar misturou para “Chapter Six”, do álbum Section .80, é a declaração das KING para alguém que tem residência fixa no seu coração. A última, “Native Land”, é o regresso às origens, numa homenagem aos antepassados das três integrantes da banda.

Semelhanças à parte com música já feita, há anos atrás – lembrarmo-nos de Sade ou Erykah Badu é uma tarefa quase impossível -, We Are King consegue afirmar-se como um álbum autêntico, fresco e peculiar em 2016. Apesar de não ser do tipo de discos que ouvimos para devorar todas as faixas à primeira, é um conjunto de peças que se vão encaixando entre si, audição após audição. Sem pressas, como o disco parece pedir.