O fado enche o coração de quem o ouve. Prova disso foi o espetáculo intenso e intimista, onde Mariza apresentou o seu “Mundo”, antes de partir para palcos internacionais. O concerto da fadista ficou marcado por sorrisos e interação com o público, no Pavilhão Multiusos de Guimarães, na passada sexta-feira.
“Boa noite, Guimarães. Já tinha saudades vossas”. Dez minutos depois da hora prevista, as luzes apagaram-se e fez-se silêncio na sala minhota que, nessa noite, pareceu ter o dobro do tamanho. O concerto começou num contexto mais sóbrio, ao som de duas guitarras portuguesas: “Fado Menor do Porto”. A pouca luminosidade e o vestido negro da fadista marcavam um início intenso e tradicional.
A segunda música da noite foi “Loucura”. Neste tema a cantora apresentou-se com um vestido vermelho que a acompanhou durante todo o espetáculo. Mariza mostrou-se muito comunicativa com o público e transmitiu que o fado não tem que ser triste. E esta ideia acompanhou-a ao longo do repertório.
Durante os fados que se seguiram, a artista manteve-se sempre bem-disposta e interventiva. Entre cada interpretação, interagia com o público e previa uma noite de alegria e diversão.
O terceiro tema trouxe também um fado tradicional: “Primavera”. A artista confessou ser o tema predileto. A sua interpretação transformou a alegria do público em comoção e arrepios na pele.
Entre emoção e entretenimento, também houve tempo para revelações. “Bem-vindos ao meu Mundo”. Mariza descreveu o seu mais recente disco “Mundo” como um trabalho feito por amigos que, durante quatro anos, apareceram em sua casa com sugestões de letras e poemas. A cantora considera o melhor trabalho da carrreira. Pelo meio, afirmou que o disco convida a entrar no seu mundo musical, após o nascimento do filho Martim.
Nos temas seguintes, entre eles “Sem ti”, “Padoce de Céu Azul”, “Melhor de Mim” e “Barco Negro”, sentiram-se momentos de partilha de intimidade e interação com o público. E, quando o Pavilhão Multiusos ouviu a interpretação do tema “Melhor de Mim”, cantou-se em uníssono. Ouviram-se aplausos e gritos de alegria. Durante a interpretação de “Barco Negro”, a cantora referiu que esse era um tema particularmente apreciado pelo público do Norte e que não podia deixar de o cantar.
Já na reta final do concerto, a fadista trouxe à plateia vimaranense uma surpresa. Depois de se despedir com um grande agradecimento pela forma como foi recebida, Mariza interpretou a música “Paixão” que escolheu como single do disco e abandonou o palco.
“És linda!” “Volta!” “Só mais uma!” Gritos de emoção misturados com aplausos ouviram-se na sala. E a ovação só acabou quando a cantora voltou, não para o palco mas para o meio do público. Envolvida pelo calor humano, interpretou um fado tradicional sem microfone, apenas com o acompanhamento de duas guitarras. Quase como os tempos em que cantava em casas de fado lisboetas e na taberna dos pais. A fadista pediu silêncio e a sua voz entoou perante uma plateia que parecia hipnotizada pela música saudosista.
“O tempo Não Pára” foi um dos temas finais, recheado de emoção pela cantora, cuja canção dedicou ao filho Martim. “O artista principal desta música hoje não pôde vir, mas vou cantá-la como se fosse ele”, disse com lágrimas nos olhos enquanto se viam fotografias dos dois num ecrã gigante.
No fim, Mariza chamou: “Ó Gente Da Minha Terra”. Antes de cantar, a fadista começou por agradecer à “rainha” Amália Rodrigues pelo legado que deixou na história do fado. Depois, não dispensou agradecimentos ao público: “Não existem palavras para vos agradecer o amor e o carinho durante estes 16 anos.” Enquanto cantava e acenava por entre os corredores da sala de espetáculos do Minho, acrescentou: “A gente da minha terra são todos vocês”.
O fim do concerto levou a cantora, de novo, para o palco. Aí pediu ao público para se levantar, cantar, dançar. Romper com a melancolia característica do fado tornou-se uma vontade, de tal forma que a fadista pediu a Guimarães para fazer uma festa. No seu vestido vermelho, comprido e arrojado, Mariza brindou a cidade-berço com um concerto caloroso onde não faltaram confettis e balões gigantes. Satisfeita, gritou: “Quero sentir boa energia no ar Guimarães!”
Fotografia: Francisca Leite