“What time is it?” Questionam-se as horas, com um sotaque britânico sobressaliente, no Centro Cultural de Vila Flor. O coelho, sempre atrasado, chegou ontem, às 22h00, aos sonhos da Alice. Só que esta Alice é sombria, de cabelos negros, feita de madeira e manipulada por humanos.
O Teatro de Marionetas do Porto veio até Guimarães, para contar, por outros “gestos”, a história da Alice no País das Maravilhas, “Wonderland”. Num registo mais adulto, ainda que com crianças na sala, fez-se o sonho da Alice com cantigas, luzes florescentes e cabeças gigantes.
O piano era ao vivo e acompanhava todos os passos da viagem da Alice. Cresce, diminui e amadurece. É a viagem de uma criança que se debate nos seus conflitos interiores e tudo é perigo e armadilha. Alice voa de um lado para outro. “You have been a bad girl!”, diz-lhe o Chapeleiro Maluco. “Oh Alice, I love you. Kiss me!”, dizem-lhe, figuras indecifráveis, em repetição. Indecifráveis por não se apresentarem como personagens óbvias, mas sim como vozes ecoantes no espaço, as vozes dos pensamentos íntimos de Alice. A jovem continuava perdida.
Quem dava força a estas mensagens subtis eram os atores que, com a sua delicadeza, faziam das marionetas parte do seu próprio corpo. Eram poucas as palavras, muitas delas estrangeiras, um cenário pouco ambicioso, mas organizado. O sonho da Alice foi, para a plateia, mais que real.
Aliado a todo este espetáculo, estava o humor carregado em cada cena. Trata-se de um assunto sério, a perda da inocência. Presenciava-se, porém, um sonho distorcido, e até nas piadas “Off with her head!” se encontrava piada.
No fim, as vozes de todos os atores erguiam-se, tornando as suas palavras cada vez mais incompreensíveis. Num lago de lágrimas, estava a mini Alice. “And her beautiful dream was over.”
Fotografia: Carolina Ribeiro