O bar mais punk de Barcelos fechou portas este domingo. No sábado foi o último concerto, de punk, pois claro. Lamentações há muitas, mas também um reconhecimento claro de que, pela primeira vez, não há alternativa. Até agora, houve sempre.

Se não havia sistema de som, pedia-se emprestado. Se não havia amplificador, alguém arranjava. Se o sistema de som não tinha volume suficiente, ‘que se lixe’. Se o amplificador dava ruído, ‘que se lixe’.

Parece que havia um acordo tácito entre quem organizava os concertos e o público. Quem ia ver as bandas já sabia que não ia ter o melhor som, nem o maior conforto. Se fosse no jardim, estava frio, no Inverno. Se fosse na cave, estava calor, todo o ano.

Foram mais de seis anos de do it yourself, ou “faz tu mesmo”. E fez-se muito. Sem condições à partida, mas tudo acontecia. Se não aparecesse a polícia. Sempre que aparecia, parava-se, e quando as autoridades lá decidiam ir embora, continuava-se até voltarem a aparecer. O importante era todos tocarem. Era essa a missão mais importante de todas as noites de rock.

Mas então porque se insistia num sítio que não estava preparado para tantos decibéis? Mais uma vez, não havia alternativa. Barcelos é terreno fértil para o surgimento de bandas, mas nunca foi rico em espaços. Nem em bares como o Xispes. Todos podiam tocar lá. A banda que vinha do México ou a que dá o primeiro concerto.

Uma espécie de democracia que tinha chegado à música da cidade. Isto tem tudo a ver com punk. Quando surgiu, na década de 70, o movimento buscava espernear contra a forte institucionalização da música por parte da indústria do setor. Na segunda década do século XXI, o Xispes fez o mesmo. Deu palco aos que queriam palco. Havia muito sangue na guelra para ser estancado, e a sua ânsia não cabia nos festivais de verão.

Esta varanda sobre o rio Cávado serviu de berço à geração que viveu o fim da romantizada “capital do rock”. Sobrou gente a dizer: “Se ele pode ter uma banda, eu também posso”. O Xispes recolheu muitas dessas vontades e deu vida a muitas delas.

Sem marcas ou partners, o rock descia do altar. Neste pedaço de terra em que os festivais de verão se multiplicam, faltam caves fumacentas. A do Xispes não volta mais.

Nota: o autor deste editorial foi promotor de eventos, sem fins lucrativos, neste espaço até setembro de 2016.