Carregado de existencialismo chega-nos Pure Comedy, o terceiro projeto de Josh Tillman sobre o pseudónimo de Father John Misty. O sucessor de Love You Honey Bear é um extenso ensaio de 75 minutos sobre a condição humana no mundo atual, onde Josh não se retrai de reflexões críticas acerca da sociedade, fama, religião, ideologias e política.

nit.pt

nit.pt

Father John Misty não precisa de figuras de estilo elaboradas para representar as ideias de Pure Comedy. O cantautor não se prende em rodeios. Vai direto ao assunto e diz o que quer dizer. Tillman despiu-se sonicamente em Pure Comedy. Na voz não há reverbs nem compensações. Os instrumentos prefere mantê-los simples e crus. A construção sonora do álbum é extremamente bela, com orquestras grandiosas a aparecer nos momentos certos. As baladas ao piano ou a guitarra predominam e acompanham a voz de FJM, que tem muito a dizer.

Pure Comedy abre com a faixa do mesmo nome. “The Comedy of Man starts like this” é o primeiro verso do álbum. Neste primeiro capítulo, entramos no mundo que Josh nos preparou. Fala-se sobre religião e fanatismo religioso, mas também sobre política. Um lugar de destaque é ainda reservado para a reflexão sobre os seres humanos e a sua dependência para com os outros. A natureza faz-nos nascer meio formados e frágeis e cabe aos que nos rodeiam moldar a outra metade.  “I hate to say it, but each other’s all we got” confessa depois de uma grandiosa exibição de saxofones e voz.

Segue-se “Total Enternaing Forever”, uma história quase tirada de um livro de ficção científica onde os humanos vivem numa realidade virtual que dá falsas alegrias. Uma imagem sonoramente pintada por uma guitarra em cores mais alegres que, aquando da reflexão nas palavras de Tillman, vemos que nada mais é do que uma distopia para onde caminhamos. “When the historians find us we’ll be in our homes plugged into our hubs”.

A meio de Pure Comedy chega a longa “Leaving LA”, que se estende por cerca de 15 minutos. É uma música franca onde Father John Misty se despe por completo revelando as suas inseguranças. O artista começa um exame à indústria musical e à fama, mas avança para uma introspeção da sua própria imagem e carreira. Admite querer sucesso comercial. Mas, com esse sucesso vem também uma perda de identidade própria. “At some point, you just can’t control what people use your fake name for.”

Things That Would Have Been Helpful to Know Before the Revolution” é outro grande destaque. A instrumentalização embeleza a descrição de um mundo pós-apocalíptico destruído pelo lixo e aquecimento global, que levou os humanos a regressar a um estado primitivo.

Smoochie”, na segunda metade do álbum, embala-nos pela confissão de Tillman à esposa que o apoia nos momentos mais negros. É a canção onde ouvimos notoriamente um phaser que cria um ambiente negro que retrata os demónios e caos que o cantor sente.

Na “Ballad of the Dying Man”, o quarto capítulo do ensaio, é-nos mostrado um retrato de um crítico que faz da sua vida o comentário. Através desta personagem, analisa-se o ego dos humanos. A sua opinião é certa e infalível; a sua mente é brilhante. Mas no fim, até ele se apercebe que não sabe nada. “Eventually the dying man takes his final breath / But first checks his news feed to see what he’s about to miss / And it occurs to him a little late in the game / We leave as clueless as we came”

Pure Comedy é um fantástico ensaio sobre a condição humana. Josh Tillman explora a questão do que é a existência humana em baladas lindas e bem contruídas. O álbum tem um tom melancólico e crises existencialistas. Toda a ação situa-se neste mundo pós-apocalíptico que Father John Misty retrata como o nosso futuro. Nenhuma canção é deixada ao acaso. As músicas avançam de uma forma muito natural e complementam-se umas às outras. Depois de uma densa paisagem pessimista, Pure Comedy acaba otimista com o verso “There’s nothing to fear” a encerrar a “In Twenty Years Or So”.