Este vai ficar para a história. Quando abrem as cortinas do palco, está uma banda filarmónica inteira. É a banda da terra. Muitos nasceram a ouvir falar do festival, agora, tocam no palco principal.

Há 20 anos que a pequena vila minhota recebe o SWR Barroselas Metalfest. Este ano não foi exceção de 28 a 30 de abril. Começou pela mão de dois filhos de Barroselas, Tiago e Ricardo Veiga. Não foi sempre uma relação fácil, mas parece que já muitos gostam e até a banda de escuteiros da terra vai tocar ao festival.

As portas foram abertas. Misturam-se nativos da vila e metaleiros para assistir a este concerto especial. Em palco, tocam “Iron Maiden” e no público faz-se um mosh ao som dos saxofones e dos clarinetes. Deve ser o público mais enérgico que a “Banda Nova de Barroselas” alguma vez teve. E gosta. Não estranham quem sobe ao palco para os felicitar e, de seguida, se manda para os braços do público. Ou para o chão.

Ao fim de cada música erguem-se os trompetes, que nem guitarras, para agradecer o clima de festa criado pelos festivaleiros. A banda incentiva o público, querem palmas ao ritmo e instigam ao reboliço. Querem mais. O público também, e, por isso, tiveram de tocar “mais uma” no final.

Tomem nota, este concerto fica para a história do casamento entre um festival de música extrema e uma pequena vila no Alto Minho.

“Mayhem” e os seus discípulos

A longa relação entre Barroselas e o SWR ficou ferida em 2001. Quando, alegadamente, o cemitério da vila foi profanado por visitantes do festival. O motivo seria o cancelamento do concerto da banda “Mayhem”.

Este ano, eles apareceram mesmo. E com estrondo, capaz de ferir as suscetibilidades daqueles que não estivessem preparados para o ritual.

Foto: Ana Maria Dinis

Foto: Ana Maria Dinis

Ergue-se um altar em palco, com velas e uma caveira. O vocalista dá uma missa, à la black metal, com uma cruz invertida ao peito, com Jesus lá crucificado. Tudo movido por um coro de igreja pouco católico.

É esse mesmo coro que hipnotiza cada um dos que ali estão. Tocam um álbum seminal do black metal e considerado um dos melhores de sempre. Teve influência em muito do que hoje se ouve no estilo. Se houve a “mãe de todas as bombas”, este álbum é o “pai de todos os álbuns” de black metal.

Percebeu-se exatamente isso no festival. Esteve cheio de black metal e adoração a satanás. Foram os portugueses “Corpus Christii” uns dos melhores representantes disso, com um concerto violento. Com 20 anos de palcos, a banda é respeitada como um símbolo do underground português. A música “All Hail (Master Satan)” atingiu o ponto alto deste regresso ao festival, com o público a cantar de braços levantados.

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No segundo dia, “Darvaza”, vindos da Itália e Noruega foram outros dos filhos de “Mayhem”. Invocaram satanás e encarnaram-no. O vocalista responde com um pontapé no copo de um metaleiro que lhe oferece de beber. No fim do concerto, o baterista dá a baqueta ao público atirando-a com toda a força na sua direção. Todo o mau feitio faz parte. Foi também por isso que lá estavam e ninguém leva a mal.

Foto: Ana Maria Dinis

Foto: Ana Maria Dinis

Houve mais para lá do black metal, muito mais

“Este vai ser o melhor concerto do festival”, dizia-se entre o público antes do concerto dos “Oranssi Pazuzu”. A noite de sábado contou com uma das surpresas do festival, para os mais distraídos. Os finlandeses protagonizaram um daqueles concertos que faz qualquer um tirar os tampões. Havia muito para ouvir naquela mistura improvável do psicadélico com black metal.

Foto: Ana Maria Dinis

Foto: Ana Maria Dinis

Paredes de som alinharam-se desde o palco fumarento até ao público deliciado. Picos de complexidade sonora iam-se formando para nunca mais encontrar harmonia. “Já não quero ouvir mais nada, melhor concerto”, dizia uma rapariga no público.

A noite não ficaria completa sem a cota de crust punk anual. Se no ano passado foram os “Doom” que ficaram encarregue por isso, este ano a organização trouxe outro nome histórico. Os “Extreme Noise Terror” fizeram o que lhes competia e distribuíram uma descarga corrosiva por todos os que lá estavam a dar um pouco de si, no meio do pó que se levantou. Em Barroselas, o punk é sempre tiro certeiro para concertos memoráveis.

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Foto: Ana Maria Dinis