Revival é uma demonstração perfeita que cada tipo de música tem um momento específico para ser bem-sucedido na História. Embora Eminem seja um dos rappers mais influentes de sempre, o álbum lançado a 15 de dezembro transmite uma certa inconsistência ao longo de todo o seu corpo artístico. Revival desaponta os ouvintes devido ao facto de o artista lançar um álbum que teria sucesso nos anos 2000, mas não em 2017.

ocolly.com

Quatro anos depois do lançamento do seu autointitulado The Marshall Mathers LP2, Eminem, de 45 anos, considerado por muitos um dos rappers mais influentes de sempre, lançou o seu novo álbum Revival. Embora o projeto não seja bem-sucedido como um todo, existem momentos em que Eminem demonstra o porquê de ser um artista tão respeitado no mundo da música. A primeira canção do álbum, “Walk On Water”, com Beyoncé, é um grande exemplo disso. O rapper consegue ser muito introspetivo e descrever tudo aquilo que sente que levou ao facto de já não ser um artista tão influente como antes era. Versos como “Kids look to me as a god, this is retarded If only they knew, it’s a facade and it’s exhaustive” e “There was a time I had the world by the balls, eatin’ out my palm /Every album song I was spazzin’ the fuck out on /And now I’m gettin’ clowned and frowned on” exemplificam algumas das reflexões de Marshall.

“Castle” e “Arose” também são boas prestações de Eminem, porque fornecem ao ouvinte um sentimento de nostalgia e de emoção, onde o storytelling e a narrativa são muito apelativos. Em “Castle” o rapper fala das pessoas e das coisas que teve de bom ao longo da sua vida, dando um sentimento de passagem do tempo muito fascinante. No fim da canção, o rapper engole um comprimido e morre. Na canção seguinte, em “Arose”, Eminem dá a entender que se encontra morto e fala de um caixão, onde menciona factos de toda a sua vida, pelo que passou, do que se arrepende de não ter feito, e mais. No final da musica, a batida de “Castle” retorna e ouvimos Eminem quase que a voltar atrás no tempo e a descarregar o comprimido pelo cano da sanita abaixo.

Porém, mesmo tendo momentos em que o rapper brilha, Eminem falha em fornecer ao ouvinte um álbum que resolve todos os problemas que mencionou na canção inicial. Muitas vezes, ao longo deste projeto, nota-se que já não é o mesmo Slim Shady. Já não conseguir demonstrar a mesma energia, a mesma cadência e o mesmo ritmo que o tornaram num artista icónico do Hip-Hop.

O artista está constantemente em desarmonia com as batidas e os ritmos de muitas canções. Isto, aliado ao facto de existirem muitos erros e muitas escolhas questionáveis de samples na produção, tornam muitas dessas músicas difíceis de se conseguir ouvir até ao fim por terem uma má execução sónica. Muitas destas faixas parecem estar no álbum apenas para encher e não dão nada de novo ou de importante para o conceito do projeto.

Para além disso, a mensagem que Eminem quer passar com este álbum não é clara, pois menciona muitas vezes o quão desiludido está com a situação política do seu país, como também menciona o quão frustrado está consigo mesmo. Isto torna o conceito do projeto difícil de entender, porque não tem um objetivo concreto.

nme.com

Muitas vezes, ao longo deste álbum, Eminem refere negativamente a família do atual Presidente americano, Donald Trump. Embora alguns dos seus comentários tenham um bom conceito, a quantidade desse tipo de críticas, feitas por Marshall Mathers, faz com que as suas linhas não se mantenham fieis ao contexto de muitas das músicas, parecendo mesmo forçados e sem sentido. “Like Home” é um desses exemplos, onde Eminem tenta, em demasia, fazer com que a canção seja quase como um hino “anti-Trump”, o que acaba por não funcionar. “All he does is watch Fox News like a parrot and repeats/While he looks like a canary with a beak”; Aqui pode ver-se o quão Eminem está desalinhado do mundo da música atual, ao falar de tópicos de uma forma que seria aceite nos anos 2000, mas não em 2017. Este ano ficou marcado pelo lançamento de vários álbuns influenciados por questões políticas e sociais, como o caso de Joey Bada$$, Jay-Z, Open Mike Eagle, e Logic. Nos seus projetos, esses artistas exploraram essas críticas de forma criativa, dinâmica e poderosa, ao contrário de Eminem que dá a entender que se encontra “preso” na forma de pensar dos seus anos de glória e não nos tempos atuais.

A maioria dos artistas convidados atuam de forma muito positiva nas canções, como é o caso de Beyoncé, Ed Sheeran, Kehlani, e Alicia Keys. Chegam a estar tão bem que, muitas vezes, acabam por estar melhor que o próprio Eminem, uma vez que se enquadram melhor no conceito e na música, o que não é bom para o álbum. Porém, algumas canções com outros convidados, como X Ambassadors, P!nk e Skylar Grey, têm tantas semelhanças que quase parecem iguais e chegam a remeter para o modelo do hit “Love The Way You Lie”, que Eminem lançou com Rihanna em 2010.

E, por último, é de referir o quão forçadas algumas das letras do rapper parecem ser e o quão desnecessárias são. Embora um dos pontos fortes de toda a carreira de Eminem seja a sua “lírica sem filtros”, ou seja, o facto de Slim Shady dizer aquilo que quer sem pensar nas consequências, em Revival, o artista leva isso para o cúmulo do ridículo. “Offended” e “Remind Me” são as duas canções onde o rapper está pior, escrevendo linhas “cringy”, sem sentido, e completamente fora do contexto da música, tal como:  “I’m so narcissistic, when I fart, I sniff it.”; “Do a fake dab to smell my armpits with it” em “Offended” e “Your booty is heavy duty like diarreha”, em “Remind Me”.

Embora Eminem seja uma lenda do Hip-Hop e fique para sempre na história do género, Revival é o pior projeto que o rapper alguma vez lançou. Nota-se, não só, o quão forçadas algumas das suas canções parecem, como também o facto de, em 2017, Eminem já não conseguir ter a mesma relevância que teve nos anos 2000.

Ao desconectar este álbum da discografia anterior do rapper, e ao “esquecer” tudo aquilo que Eminem já fez pelo mundo do Hip-Hop, como pessoa e artista, este projeto pode ser considerado um dos álbuns mais fracos do ano.