Foi na última quarta-feira que Viana do Castelo recebeu a peça “O Fascismo (Aqui) Nunca Existiu!”. Encenada pelo Teatro Art’Imagem no Teatro Municipal Sá de Miranda, o espetáculo faz parte de uma trilogia que retrata Portugal nos últimos 70 anos.

Na passada quarta-feira, a companhia de Teatro Noroeste – CDV acolheu o espetáculo “O Fascismo (Aqui) Nunca Existiu!”, produzido pelo Teatro Art’Imagem, no Teatro Municipal Sá de Miranda, em Viana do Castelo. O primeiro espetáculo de um tríptico teatral com o nome de “Identificação de um (o meu) país”. Esta trilogia procura retratar a vida de Portugal nos últimos 70 anos e que será composto por outras duas peças: “Os Anos que Abalaram o nosso pequeno mundo” e “Ai que medo de existir”. Estas fazem um retrato da história de Portugal desde o 25 de abril de 1974 até aos tempos de hoje.

O pano aberto mostra um cenário simples: estantes, senhora de Fátima, fotos de António de Oliveira Salazar e demais figuras preponderantes do Estado Novo. Com dramaturgia e encenação de José Leitão e assistência de encenação de Daniela Pêgo, a peça é interpretada por Flávio Hamilton, Inês Marques, Luís Duarte Moreira, Patrícia Garcez e Susana Paiva.

As luzes da sala apagam-se e surgem entre o público gritos “A guerra acabou! A guerra acabou!”. Com um jornal na mão os autores sobem ao palco e contextualizam. “Ano de 1945, Hitler suicidou-se”, lê uma personagem no jornal.

Ao longo da peça o espetador é transportado para um “império do Minho a Timor”, onde lhe são levados vários testemunhos uns verdadeiros, outros menos verdadeiros. Abordam-se temas importantes de quem viveu o Estado Novo – perseguição, tortura, fome. “A galinha deu o ovo, o Estado Novo deu no povo”, dizem em coro as cinco personagens.

Várias cenas são trazidas a palco. Memórias de mineiros que fizeram greve e que, por isso, eram rotulados de comunistas. Enquanto que uma das personagens exclama “qual comunistas, qual carapuça. Eles não podiam é trabalhar com fome”.

Recordam-se alturas de terror: tortura. O testemunho de uma estudante de direito é trazido pelas três atrizes femininas que representavam uma só personagem. “A PSP e a PIDE estavam juntas”, diz uma. Socos, alucinações privação do sono – isto era a realidade da estudante. “Podem-me proibir de falar, mas nunca de pensar”, grita para com os polícias. Apesar de tudo isso, sobreviveu para contar esta história.

A peça recorda também tempos felizes. “Neste país de desgraça havia gente feliz”, conta no final José Leitão. As brincadeiras de crianças são trazidas e representadas, como por exemplo jogos das caricas, andar descalço, ir à escola e ter uma professora doce, ou uma “velha, gorda” mais conhecida como “Mestre da Palmatória dos cinco olhinhos”.

A peça termina com uma contextualização histórica (1973) onde, ao som de “Venham mais cinco” de Zeca Afonso, começam manifestações em Aveiro. Um ano depois, somos levados para o “Grândola Vila Morena”. A peça termina com o grito “acorda, há uma revolução”.

Uma sala cheia aplaudiu de pé o trabalho destes cinco atores que nunca saíram de cena. São aplausos e lágrimas que enchem o teatro, mas, como o encenador rematou, “o teatro é para chorar e pensar”.

No final da peça houve um digestivo – uma conversa entre o encenador, os atores e o público. O público só quis “agradecer por lembrar o que foi o antes do 25 de abril” e homenagear José Leitão que “não tem vergonha de admitir que andou descalço”. O encenador aproveitou ainda para dizer que “a guerra colonial está guardada”, prometendo um espetáculo sobre a mesma. Acrescentou ainda que, futuramente, a primeira peça do tríptico teatral passará por Braga e pela Póvoa de Varzim. O público insiste que é um “espetáculo para correr o país”.