12 anos depois, volta o Magna Augusta. O festival de tunas académicas organizado pela Augustuna é o espelho de um grupo que volta a crescer, depois de uma paragem forçada.

Uma sala acolhedora pintada com tons quentes. A luz reflete nos vários instrumentos que dão vida à tuna, os sons da guitarra, do contrabaixo e do acordeão dançam melodiosamente com os sons da braguesa, do bandolim e dos ferrinhos, e nascem músicas tão tradicionais, e tão portuguesas.

Ricardo Coelho, conhecido como “Sesimbra”, é magister da Augustuna, uma das tunas académicas da Universidade do Minho, que faz este ano 22 anos. Junto a ele estão Daniel “Cont’aquela” e Diogo “Rolhão”, ainda caloiros. Ao lado, afinam-se as cordas soltas. É uma imagem de uma tuna, pintada a tons de azul, que se prepara para o regresso do seu festival, o III Magna Augusta.

Augustuna

Rafaela Gomes/ComUM

O festival não se realiza há algum tempo. 11 anos, para precisar. É o espelho de um período menos bom na longa idade da Augustuna. Foi fundada em 1996, inicialmente como uma tuna mista, mas a música teve de parar em 2008, por falta de caloiros.

Hoje, vemos a sala preenchida. Desta feita, só de rapazes. “Em 2013, juntaram-se oito pessoas e pegaram na tuna, com o objetivo de retomar esta tradição académica, mantendo sempre um estilo de música mais tradicional, mais autêntico, mais português”, conta “Sesimbra”.

Ricardo Coelho, de 31 anos, foi um destes que voltou a trazer o azul da Augustuna para as salas debaixo do Bar Académico. Magister desde 2017, mostra-se orgulhoso pelo caminho que a tuna tem percorrido desde a “re-fundação”, especialmente depois de um fecho que, para ele, nunca devia ter acontecido. “O facto de sabermos que a Augustuna tinha fechado é, a meu ver, uma perda a nível cultural para a Universidade do Minho”.

Augustuna

Rafaela Gomes/ComUM

Surgem os últimos acordes do “Vinho do Porto”. Vai ser cantada no festival de sábado, e Pedro Ferraz, à frente do círculo, quer que tudo saia perfeito. “Concentrem-se!”. É o nascer de um velho festival bracarense, voltam as meias azuis escuras a encher os espaços de Braga, e renasce o fruto que outra vez foi diminuto.

O tricórnio faz a festa

No meio de todos os sons que preenchem aquele corredor mal iluminado e aquelas salas deterioradas, distingue-se o da Augustuna. São muitos os grupos culturais debaixo do Bar Académico a ensaiar, e os sons que dali saem fazem crescer o Minho para o resto do país.

Festivais de Norte a Sul, e digressões por lá fora, enchem-se de tunas e grupos da academia minhota. Quase tudo em português. Ricardo Coelho reconhece que já há uma expectativa para o público sobre o que vem de Braga e Guimarães, seja que grupo for. “Só o facto de estarmos com o tricórnio, as pessoas pensam ‘pára tudo!’, enquanto olham para nós. Além disso, a malta do Minho é muito hospitaleira e para onde vai leva sempre essa alegria, e qualquer grupo, seja de onde for, vem ter connosco porque já sabem que há festa!”.

O tom de azul da Augustuna destaca-se no traje de caloiro. Assim como em todos os grupos. Pela universidade fora, vemos cantadas e tocadas as cores do verde, do bordeux, do vermelho, do laranja, do castanho, dos azuis mais escuros ou mais claros. Cores boémias que os distinguem do negro sóbrio do país académico.

Diogo Almeida, 22 anos, estudante de Marketing, veste o traje de caloiro este ano, e fala com orgulho dos olhares que passam pela tuna, fora de Braga. “O traje de caloiro é muito bonito e muito diferente dos outros, o que acaba por chamar também a atenção das pessoas”.

Para “Rolhão”, as tunas são uma tradição muito importante na vida académica, marcada por um processo de aprendizagem. Nesta sala onde se aprende músicas, e se ensaia com estandartes e pandeiretas, aprende-se mais. São vivências que vão “muito para além do curso em que andamos, como por exemplo na área do marketing, da comunicação, tudo o que seja relações interpessoais. Falar com pessoas, motivá-las”.

O grupo que, todas as quintas-feiras, se reúne para partilhar gargalhadas, sorrisos, trabalho e lições de vida, vê esta tradição em risco. “Hoje em dia tens muito mais pressão para acabar o curso, o tempo é muito mais curto desde o Tratado de Bolonha. As pessoas não têm tempo para vir aos ensaios, para ir às saídas.. e depois acabam, muitas vezes, por desistir da tuna”, confessa “Sesimbra”, com um tom triste.

Frente a todas as adversidades que se encontram no caminho académico, a Augustuna acredita que “o mais importante é ter espírito”. Espírito este alimentado sobretudo, pela amizade e gosto pela música. Daniel Diaz, 21 anos, caloiro de Engenharia Mecânica, confessa que “era anti-praxe e, claramente, não estava muito inserido no espírito académico e a tuna foi a maneira mais interessante de o fazer”. Hoje, vê a Augustuna como uma segunda casa. Diogo também, mas entrou num contexto bem diferente. “Eu entrei pela minha mãe, porque ela gostava muito, e agora só lhe tenho a agradecer”.

Um velho festival para uma nova fornada

A Universidade do Minho conta com a existência de cerca de 20 grupos culturais: muita cultura, muita diferença, mas poucos para a fazerem. Tal como a Augustuna, que fez uma pausa na sua existência em 2008 por falta de caloiros, são vários os grupos que passam por essas dificuldades. As salas de ensaios são pequenas, mas ainda há muito espaço para preencher.

Atualmente, a tuna conta com cerca de 50 pessoas, sendo que apenas 27 se encontram ativas. Os sons tradicionais conjugados melodiosamente fazem-se ouvir por 20 caloiros, que vestem orgulhosamente azul, e por sete tunos, nos quais o espírito académico nunca morreu.

Tal como a Augustuna, o Magna Augusta reergue-se, 12 anos depois. Um festival marcado por uma reunião de amigos, onde surgirá um reencontro especial com a Tum’Acanénica, Tuna Mista do Politécnico de Leiria. “Temos uma ligação muito especial com eles, é a nossa tuna irmã”, conta Ricardo Coelho, com um sorriso melancólico. Dos muitos cantares e encontros da Augustuna por aí fora, outras tunas retribuem a festa dada para vir a Braga, tunas com as quais já se cruzaram, ou recentemente ou já há mais tempo. “Existe sempre gente mais velha e também não nos podemos esquecer disso”, continua Ricardo.

Augustuna

Rafaela Gomes/ComUM

A pressão característica deste tipo de eventos é experimentada pela primeira vez por esta geração, que anseia com muito entusiasmo este marco tão significativo na caminhada da Augustuna. “Estamos com as expectativas muito altas”, confessam os caloiros, entre gargalhadas sorrateiras.

Os cantares académicos ocuparão o Auditório Adelina Caravana – Conservatório de Música Calouste Gulbenkian, espaço que irá contar com a presença de várias tunas vindas de Norte a Sul, tais como a Tuna do Distrito Universitário do Porto – Ad Majorem Tvnae Gloriam, TASCA – Tuna Académica de Setúbal Cidade Amada e Estudantina Académica de Lamego, tunas a concurso. À parte destas ouvir-se-à também a já mencionada Tum’Acanénica – tuna extra concurso vinda de Leiria. A apresentação será feita pelo grupo Jogralhos – Grupo de Jograis Universitários do Minho.

“Há cada história…”

O Magna Augusta volta saudosamente para mais uma história no livro da Augustuna. É o capítulo do “regresso do herói”, a “comeback story”. Há um novo ar para esta tuna, que na sua pequena sala quer rivalizar com as tunas das salas ao lado.

A paragem foi um grande golpe na biografia da Augustuna. E praticamente ninguém dos que pararam de cantar em 2008 continuam agora a cantar em 2018, dez anos depois. “No fundo, o que estamos a fazer é criar uma tuna nova, mas que já tinha cerca de 18 anos de existência”, resume o magister.

No curto tempo de nova existência que a tuna tem, já leva consigo muitas boas histórias. Como qualquer tuna, há a típica boémia, a típica saudade, o típico amor. “Houve uma história caricata a nível amoroso, muitas de amizade, encontramos sempre pessoas divertidas. Há cada história…”. E como não podia deixar de ser, há sempre “muito álcool”. “A melhor experiência foi, talvez, termos barraca este ano na Receção. Para nós, como caloiros, foi épico, porque fizemos história, criamos a primeira barraca da Augustuna”, conta Diogo Almeida.

Augustuna

Rafaela Gomes/ComUM

Entre tunas e de grupos académicos, a amizade e a união é sempre algo comum a todos. Na Augustuna, é a força motriz, e foi o motor de arranque. O III Magna Augusta é a prova que não há festivais a mais para a Augustuna, e Braga estava a precisar de recordar a sua voz. “A tuna começa a ser mais uma família do que um simples grupo que se junta para tocar”.

Ricardo, Diogo e Daniel contam as histórias e cantam as músicas com um brilho nos olhos. Toda a tuna o faz. E mais caloiros o farão num futuro próximo. A Augustuna renasce das cinzas aos poucos, e volta a soar bem alto pela cidade de Braga.