Editado a 16 de fevereiro, "Linda Martini" marca o regresso dos Linda Martini aos lançamentos. Neste novo projeto homónimo, os portugueses inovam as suas sonoridades e adicionam o fado ao rock que lhes é tão característico.

Os últimos dois meses de 2017 foram marcados pela digressão que levou Linda Martini e The Legendary Tigerman “a combate” por todo o país. Ainda 2018 dá os primeiros passos e o quarteto aventura-se de novo, desta vez com o lançamento de um álbum homónimo. Linda Martini surge como uma espécie de revelação. Afinal de contas, toda a gente conhece a “Unicórnio de Sta. Engrácia”, mas ninguém sabe quem é realmente Linda Martini enquanto mulher. A esta questão a banda responde na capa do novo disco, com um retrato a óleo da italiana a quem o nome pediram emprestado no início do século. O quinto álbum dos lisboetas foi gravado entre Outubro e Novembro do ano passado, na Catalunha, e conta com 10 faixas.

Fotografia: Ângelo Lourenço // facebook.com/lindamartinirock

A verdade é que é raro ver uma banda a melhorar de álbum para álbum. O segundo disco raramente é melhor do que o primeiro. O terceiro não costuma ultrapassar o segundo. À medida que são feitas novas experiências, a qualidade musical tem tendência a baixar. Há muito que os Linda Martini atingiram a maturidade enquanto músicos e hoje são os primeiros a refutar o ciclo vicioso em que tantos outros caem. A paixão e a técnica são características incontestáveis quando falamos de qualquer um dos quatro elementos. Adicionamos inteligência musical e temos a receita perfeita para um disco de sucesso. Linda Martini afasta-se do registo mais limpo e contemplativo de Sirumba e leva-nos de volta à energia do Casa Ocupada. Desde refrões que ficam connosco a riffs a rasgar e a pedir que se aumente o volume, é, sem dúvida, um dos projetos mais arriscados da banda.

O álbum abre com a energia contagiante e o ritmo frenético de “Gravidade”, que fará tremer qualquer sala por onde se fizer ouvir. As rimas, a agressividade da letra combinada com o fervor da batida e a voz rouca de André Henriques elevam desde logo as expectativas para o que se segue.

“Se me agiganto” é, provavelmente, das melhores músicas que a banda já escreveu. Fala sobre o fim de uma relação, mas sobretudo sobre alguém que teve a coragem para se libertar de um sítio onde não estava bem. Começa com uma balada calma, mas triste. A letra confirma a melancolia e à medida que a música avança constrói-se um instrumental libertador.

“Boca de Sal” é o single que aborda o tema da droga com um ritmo vivo e cativante e um refrão que fica no ouvido. A meio, a música parte-se e cria-se um ambiente sonoro completamente diferente que pareceria estranho se não fossem eles a fazê-lo. Com um pouco de estilo King Gizzard à mistura, a reviravolta nesta faixa é surpreendente. Exploram o som com equilíbrio e inteligência, sem deixar que soe demasiado forçado. Importa mencionar o trabalho impressionante da Cláudia com o baixo. É uma música que não queremos que acabe.

Uma sólida primeira impressão e uma despedida memorável são essenciais. Se “Gravidade” nos hipnotiza e pede para ficar, o instrumental “Amares Volta” deixa-nos a querer mais e mais. A última faixa do álbum faz lembrar a banda canadense Anciients. O ritmo acelera e abranda com transições bem conseguidas, que dão a sensação de algo que está bem, depois estabiliza por alguns minutos e no final desvanece para algo mais negro. Termina com o Hélio a “destruir” a bateria. Convida-nos a dar asas à imaginação, mas não são precisas palavras para entender esta música.

Aos Linda Martini importa agora inovar o som, renovar as gerações e manter a identidade única pela qual nos apaixonamos. Combinam instrumentais lindíssimos com aspetos que são tão portugueses, como a poesia nas letras, os trocadilhos lisboetas e até mesmo o registo da voz que se aproxima em tanto ao nosso querido fado. Estas características, que já nos são tão familiares, tornam-se ainda mais evidentes neste último disco. É na voz de André Henriques, na poética bem portuguesa e nos ritmos mais pausados que se nota a força que o fado expressa na composição sónica deste álbum.

Estamos a viver um período incrível na música portuguesa. Há quantidade e há qualidade. Há uma vontade enorme de criar e de fazer música e são nomes como este que elevam o nosso país, que afinal não é tão pequeno assim. Os Linda Martini de hoje podem ser rock e fado, sem nunca perder a essência com que chegaram em 2003. O quinto álbum traz novos sons que pedem inspiração a projetos mais antigos e um cheirinho de rock progressivo, que de certa forma foge à “norma” mas que liga perfeitamente com o registo da banda. Não há dúvidas de que será um dos grandes do ano.