O Sé La Vie abriu em março de 2015, mas Filipe Palas tinha esse sonho traçado há mais tempo. Ao longo de três anos, o espaço foi sedimentando o seu papel na rota da música alternativa nacional.

Desde 2015 que, à sombra da Sé de Braga, a música é a religião predominante. A poucos passos da emblemática catedral bracarense, ergue-se um dos polos mais importantes do underground minhoto. O Sé La Vie é um dos poucos espaços com programação cultural mensal sem apoio da autarquia. Goza de uma localização privilegiada no coração de Braga e apresenta um programa cultural robusto e regular, com concertos todos os fins de semana. Hoje, comemora o terceiro aniversário.

Filipe Palas é o timoneiro do estabelecimento. Começou por programar bandas no Whisky Bar, juntamente com um amigo. Contudo, o desejo de abrir um espaço calibrado para receber concertos é mais antigo. Desde a adolescência que está ligado à música. Começou como espectador de concertos, passando a roadie dos Mão Morta, até membro e fundador de Smix Smox Smux e Máquina Del Amor.

Dada a falta de locais, em Braga, para receber bandas do espectro alternativo, surgiu o plano que foi concretizado há três anos, em conjunto com a sua companheira. A loja de eletricidade e as habitações que haviam sido deixadas ao abandono deram origem ao que é hoje o Sé La Vie. Pelo meio houve um ano dedicado à restauração do espaço.

Palas – como é conhecido nas lides musicais – conta que “a ideia era só abrir uma casa de concertos, mas para isso tinha de rentabilizar o negócio”. A solução foi abrir um bar capaz de receber esses espetáculos.

Em Braga existe uma carência de locais de pequena dimensão que recebam concertos. “Se calhar os outros bares queriam fazer isso, mas não se querem estar a chatear”. Filipe Palas acredita que a burocracia, a falta de apoio da Câmara Municipal de Braga e as reclamações dos moradores desmotivam o surgimento de mais espaços similares.

A par de outras cidades, como Lisboa e Porto, o Município de Braga prepara-se para implementar limitadores de ruído nos estabelecimentos do centro histórico. “Vai haver uma perda de decibéis valentes”, algo que, na opinião de Palas, pode limitar o negócio, visto que trabalha com bandas.

A programação das atuações é orientada por Filipe Palas, que não dispensa a colaboração de promotoras de concertos e bandas. A ênfase é posta “no que se faz em Braga e nas bandas que estão a promover novos trabalhos”.

Ao longo dos três anos de portas abertas, o músico e dono do Sé La Vie recorda com especial carinho a comemoração do primeiro aniversário. Em 2016, os Mão Morta atuaram para dezenas de pessoas, figurando uma das maiores enchentes do espaço. “Trabalhei com eles e para mim são a melhor banda portuguesa”, recorda.

Com o passar do tempo, há cada vez mais pessoas a aparecerem com o propósito de ver os concertos, independentemente da banda. Contudo, nem sempre em número suficiente para evitar noites menos conseguidas.

Ao longo do primeiro ano de atividade, o Sé La Vie teve também espaço para exposições. Algo que foi retomado este mês, com uma exposição de Ana Tinoco. A intenção é continuar esta onda, “se as pessoas quiserem, eu estou sempre aqui com quadros”.

A noite de hoje é de festa no Sé La Vie. Para além de descontos no balcão, a música estará a cargo do grupo que todas as terças-feiras se reúne naquele mesmo espaço para jam sessions. Sendo o convite alargado a qualquer pessoa que se queira juntar e levar um instrumento. Logo depois, a música prossegue com Bazuuca, RUM on the Rocks e Anibal Figueira – presenças habituais da casa.

À sombra da Sé de Braga

Numa cidade muito marcada pela religião, abrir à sombra da Sé Catedral um estabelecimento ligado à restauração e à diversão noturna era uma tarefa difícil. As constantes queixas dos moradores, devido ao ruído, já levaram ao encerramento de um bar localizado a escassos metros da igreja. Hoje em dia, já não se verifica esse modelo.

Fazendo um paralelismo com as grandes cidades da Europa, onde “o centro histórico está munido de bares e movimento”, o gerente do Sé La Vie considera que esse paradigma europeu iria inevitavelmente chegar a Braga. A pressão exercida pela Igreja Católica foi o fator que atrasou esse processo.

Imagem e Edição: Diogo Rodrigues e Rafaela Gomes