Vozes singulares e instrumentos variados. O Grupo Folclórico da Universidade do Minho (GFUM) mostra que a tradição é possível manter. Este ano sopra a vela dos 25 anos.
Todos vestidos a rigor. O folclore português está presente na Universidade do Minho e conta com alunos e outros elementos da comunidade interessados por esta cultura tão tradicional portuguesa. Há quem toque instrumentos, há quem dance, há quem cante. Mas, independentemente do que fazem, todos eles carregam em si os sorrisos e a alegria de pertencer ao Grupo Folclórico, que faz 25 anos de existência este ano.
O grupo surgiu em 1993. “Os elementos ativos da Associação Recreativa e Cultural da Universidade do Minho (ARCUM) sentiam que faltava mais alguma coisa”. O motivo é explicado por André, diretor-técnico do GFUM e presidente da ARCUM. Depois de alguns anos com “menos atividade”, foi em 2013 que se reiniciou a caminhada de levar o folclore mais além. André começou neste mundo quando era criança, mas acabou por se afastar. E em 2013, regressou.
“Juntei-me com alguns colegas da universidade, de outros cursos – pessoas que eu sabia que estavam cá e que andavam noutros grupos nas suas terras, já tinham andado ou que eu sabia que gostariam de fazer parte”, explica. À semelhança de André, também Catarina, diretora do GFUM, fazia parte de um grupo folclórico na sua terra e faz parte deste grupo do Minho desde 2017.
Hoje, os dois são elementos deste grupo onde a idade não importa. Há dos sete aos 67. O grupo folclórico tem pessoas de todos os cantos de Braga, com espírito e histórias diferentes para contar. Mas há algo que os une. Todos têm em comum o facto de fazerem parte de um grupo com força nas raízes minhotas. Pertencer ao GFUM é “conviver com várias pessoas, tanto da nossa idade como também um pouco mais velhas. Apesar disso, não se nota muito essa diferença de idades, porque há bom ambiente e, no geral, julgo que as pessoas se dão todas bem”, conta Catarina, a sorrir, preocupada por achar que não está num bom dia para fotografias.
André conta que expandiram o grupo porque havia pessoas que estavam interessadas em fazer parte, uma vez que acompanhavam o trabalho do GFUM. Até porque o objetivo do grupo nunca foi ter só elementos da universidade. Assim, com pessoas vindas de vários lados, permite continuar o trabalho e fortalecê-lo.
Mas nem toda a gente vê o grupo da melhor forma. Sempre foi visto “com algum preconceito”, segundo André, acrescentando que têm notado “que se está a desvanecer”. Têm lutado contra isso com a presença nas redes sociais. “Queremos que, ao olharem para nós, vejam que vale a pena defender as tradições. É a nossa música. É a nossa dança. E se não formos nós agora a fazer este caminho, vamos perder isto para sempre”, diz, André, a sorrir.
O GFUM é prova de que o gosto pelo folclore passa de geração em geração. “Temos alguns casais no grupo que trouxeram os filhos e temos, se calhar, os pais desses casais”, revela o presidente da ARCUM. A dedicação de todos, sejam mais velhos ou mais novos, está presente em tudo aquilo que fazem. E as pessoas mostram que se esforçam para estarem presentes.
Cantigas do Minho ecoam na igreja
A Canção Bracarense é “bem diferente daquilo a que os grupos estão habituados”, um espetáculo onde só o toque tradicional e o canto estão em destaque. “É um recital de música popular”, conta André. E cá estamos. 15h de domingo. Dá-se início à III edição d’A Canção Bracarense, na Igreja de São Lázaro. Estão todos atentos.
A cor dos trajes realça em relação ao espaço, onde há pouca luz. Os lenços com cor, as saias com cor. É com vozes, cavaquinhos, concertinas e muitos outros instrumentos que se faz música. Quem toca instrumentos está sentado, quem canta está de pé. Há vozes e instrumentos, mas não há dança. Há apenas o bater dos pés no chão e o balanço do corpo. Às vezes cantam em coro, outras vezes não. Há músicas que gelam a igreja, com as mulheres a arrepiar as espinhas de quem está presente; outras, colocam algum do público a cantar e a acompanhar o GFUM.
Os primeiros temas são sobre pastagem e a vida campestre do povo português e minhoto. Apesar deste tema, as mulheres assumem a liderança. Toda a atuação é uma passagem pelos meses de trabalho do povo, pelas diferentes regiões do Baixo Minho e arredores. Cada música simboliza um tempo, uma memória, uma terra. No final, uma ovação em pé leva as pessoas para casa, com o folclore nos ouvidos, e alguns levam-no na carteira.
É no fim que é apresentado o CD “Memórias Cantadas”, que integra a coletânea do Folclore Português. O GFUM é o único grupo académico presente neste disco. “É feito com base em vários cancioneiros que existem na região de todo o Baixo Minho. Temos desde as modas de campo às modas de romaria, desde o canto à capella, como músicas instrumentais”, explica André.
A felicidade está no canto e na dança
O ensaio de terça-feira depois de uma atuação costuma ser dispensado. Mas, desta vez, não foi. O Bar Académico é o palco dos ensaios do GFUM. Para se entrar no grupo só se tem de aparecer aqui. Quem chega ao corredor com várias portas que levam às salas consegue identificar onde está o grupo, dado que as vozes ecoam pelo espaço. Se não se ouvir ninguém, pode-se ler numa das portas: “Associação Recreativa e Cultural da Universidade do Minho”. É aí.
Quando se entra, veem-se os espelhos em frente. À volta estão manequins onde são colocados os casacos (o calor humano obriga a isso), um quadro verde totalmente escrito e desenhado a giz, a combinar com as paredes brancas. Todos em meia lua a cantar para aquecer a alma, mas também o corpo, nesta noite fria de inverno. Veem-se os restantes a chegar a pouco e pouco, descontraídos. As crianças correm de um lado para o outro, enquanto esperam que se dê início à dança. Há quem espere sentado nos sofás e nos bancos e, enquanto não chega toda a gente, ensaiam-se umas cantigas.
André está no centro a ensaiar o grupo, a acompanhar as músicas com as suas mãos. Há um espírito familiar entre todos os elementos. Aproxima-se de cada um para ouvi-los a cantar. “Não podem pensar que é para subir muito, porque não é preciso”, corrige André. É ele quem corrige o tom de voz, mas também é corrigido. “Oh, André!”, diz uma senhora, por o ouvir a subir o tom. Todos se riem.
Chegou a vez da dança. As pessoas estão animadas, com sorrisos de orelha a orelha. Afinam-se os instrumentos. Quem os toca, está em fila, sentado lá atrás. André organiza os pares. Quando é para começar, o silêncio instala-se. Batem-se as palmas. As crianças estão à frente e começam a dança. Todos estalam os dedos, rodopiam, cantam e trocam de olhares em jeito de cumplicidade. Acima de tudo, André quer “que se divirtam, que gostem, e que mostrem que gostam daquilo que estão a fazer”.
Todos se mostram dispostos a conversar. Julita Capelo está apenas há seis meses no grupo. “Não sei se tenho muito para contar. Há pessoas que estão aqui há mais tempo”, diz, insegura. Mas, pelos vistos, tem. Com 65 anos faz parte do GFUM. É ex-aluna da Universidade do Minho, pelo que concluiu os estudos em 1989. A experiência de estar no meio de universitários está a ser “muito interessante”, conta. “Não me reconheço num grupo da minha idade, mas aqui reconheço-me”, assume, com brilho nos olhos. O gosto pela música fez com que quisesse entrar neste grupo. “Ainda tenho saudades da universidade”, admite.
Ainda na universidade está Rita Ribeiro, com 23 anos, que faz parte do grupo há dois anos. “Fazer parte deste grupo é apaixonante”, começa por dizer. “O espírito que se vive é acolhedor. Desde que aqui estou noto que o grupo tem vindo a crescer de forma positiva e gratificante. O nosso trabalho está a ser reconhecido por Braga”, acrescenta. É a olhar para Julita que diz que “não se nota a diferença de idades”. São trocados sorrisos.
Festejar os 25 anos
“Pelo trajar do Minho” foi um dos eventos agendados para celebrarem um quarto de século. Catarina explica o que se passou: “Tínhamos vários trajes e as pessoas tinham possibilidade de ter uma visita guiada a explicar as várias peças apresentadas”. O lançamento online de “Uma dúzia de cantigas” em que ao longo dos doze meses do ano será sempre lançada uma música é uma novidade de cantigas que retrata o canto polifónico do Baixo Minho.
No dia 17 de março haverão as Jornadas de Etnografia e Folclore, na Universidade do Minho. “Serão sobre o traje e o trajar, com o público alvo todos os grupos folclóricos da região que se inscrevam nestas jornadas”, revelam André. O presidente do ARCUM conta ainda que, este ano, o GFUM é o grupo organizador do 7.º Encontro de Amigos Folcloristas, que será no próximo dia 28 de abril, no Parque da Ponte, em Braga. Este é um encontro que junta cerca de 600 elementos de grupos folclóricos de todo o país. No dia 27 de maio, no Dia Nacional do Folclore Português, haverá um flashmob no Braga Parque.
O GFUM faz 25 anos? Então, a festa faz-se todo o ano. A altura do São João é um mês de muita atividade para o grupo, e o ano de 2018 não será exceção. Mas André não quer revelar, para já, o que se vai passar. “Ainda é um bocadinho cedo para desvendarmos o véu, mas a seu tempo o faremos”. O que é certo, e que André garante, é que “será um ano recheado de novidades, de muitas atividades diferentes”.