“Este é um público que curte numa de “vou mesmo curtir””. Foi com este espírito que Agir encerrou a primeira noite da edição deste ano do Enterro da Gata, no passado sábado em Braga.

Agir regressou com gosto ao palco do Enterro da Gata, na primeira noite da edição deste ano. Dias depois do lançamento do álbum “No Fame”, o artista reflete sobre a sua evolução enquanto músico e indivíduo, bem como desconstrói alguns aspetos do seu processo criativo.

Não sendo a sua primeira vez aqui no Enterro, é seguro dizer que gosta deste ambiente?

Agir: Sim. Gosto principalmente de me quererem receber novamente, de poder vir agora com um álbum novo e apresentar coisas novas, portanto fico contente.

Nota alguma diferença entre atuar no Enterro da Gata e atuar noutro tipo de palcos?

Agir: Aqui é maior. É fixe no sentido de que o público geral muitas vezes curte, mas curte numa onda de “vou observar”, enquanto que este é um público que curte numa de “vou mesmo curtir”.

Pode consultar a entrevista ao Agir na Receção ao Caloiro de 2015 aqui.

Como tem sido para si a receção inicial a este álbum novo?

Agir: Tem sido fixe. Eu tenho-me aventurado assim para fazer coisas um bocadinho fora da caixa daquilo que eu costumo fazer, portanto tenho principalmente recebido apoio e demonstrações de apreço de pessoas, de um público que normalmente não costuma dizer-me que gosta. Portanto isso é bom, é uma vitória.

Há pouco disse que neste novo álbum se aventurou um pouco e tem conseguido o apreço de novos públicos. Como sente que evoluiu nestes sete, oito anos desde que lançou o seu primeiro álbum de estúdio?

Agir: Penso que a evolução, para já, é uma evolução normal. Eu acho que qualquer pessoa que faça alguma coisa todos os dias gosta de acreditar que está melhor na semana seguinte, no ano seguinte. Como eu também estou um bocadinho mais velho, é normal que a nível pessoal eu tenha evoluído e ganho novas maneiras de ver as coisas. Portanto, é óbvio que isso irá sempre refletir-se nas letras, na maneira de cantar e em tudo o resto.

Agir

Lara Varanda/ComUM

ComUM: Que músicos são para si uma referência a seguir?

Agir: O meu pai, não apenas como músico, mas também na sua maneira de estar na profissão. Ele é uma pessoa sem derrotismos. Senta-se à mesa com os músicos, convida-os lá a casa. Eu gosto de acreditar que ele me influencia, mas muito para além da parte musical. Até porque, em termos musicais, não tenho nada a ver com o que ele faz, mas gosto de acreditar que realmente fui muito influenciado pelos seus valores. Quanto a outros músicos, gosto muito de Maxwell. Gosto de Drake e de Chris Brown, cenas mais recentes obviamente. Eu bebo um bocadinho de tudo. Como chá [risos].

Várias letras das suas músicas refletem, de algum modo, episódios e sentimentos da sua vida. Quando escreve as letras, sente dificuldade em decidir o que revelar ao público e o que manter privado?

Agir: Eu acho que é sempre possível falar um bocadinho de tudo, mantendo alguma privacidade. Naquelas músicas de hip-hop sou um bocadinho mais puro e duro, não tenho tanto filtro. As músicas que se calhar são mais amorosas eu sou um pouco mais autobiográfico, mas eu tento manter-me genérico. A parte fixe disso é que qualquer pessoa se pode identificar, porque estas músicas contam uma história, mas não contam tanto ao pormenor a minha história. Penso que toda a gente já acabou com alguém, já começou com alguém. Portanto, eu acho que há maneiras de que as músicas se façam sentir para toda a gente, não apenas para mim.

Por outro lado, algumas das suas músicas, como “Vai Madonna” e “Falas Demais” que lançou agora, funcionam como uma crítica à sociedade contemporânea. Na sua opinião, é responsabilidade de um artista dar a conhecer certos problemas que conheça ou observe?

Agir: Eu não gosto de o ver como uma responsabilidade, no sentido de que uma música não tem de dizer alguma coisa. A música pode ser puro entretenimento e não é menos arte por causa disso. Eu acho que o dever do músico é ser verdadeiro consigo próprio. Se sentir isso em algum momento deve expô-lo, mas não acho que o cantor tenha a obrigação. Se eu estiver dois ou três anos a fazer músicas que são puro entretenimento e não são de reivindicar alguma coisa, não são por isso menos significativas.

Existe algum músico português hoje que julgue merecer maior destaque ou popularidade?

Agir: Ei, há tantos, não me é possível nomear apenas um. Há muitos e não apenas músicos cantores. Agora, com o hip-hop, normalmente tem aparecido o nome do produtor do instrumental à frente do título no Youtube, mas ainda é uma luta que precisamos muito. Pelos compositores, pelas pessoas que escrevem às letras… Muitos cantores escrevem as suas letras, mas muitos são só intérpretes. Acho que há muitos músicos e muita gente ligada à música que ficam na parte de trás. Cabe a nós artistas, quando trabalhamos com alguém, dizer: “Fui eu que fiz isto, foi aquela pessoa que me ajudou”. Seria fixe trazer um bocadinho esses compositores e produtores para a parte da frente.