“Quem estava soube aderir bem, soube participar, cantaram quase tudo” Na primeira noite da presente edição do Enterro da Gata, em Braga, Fernando Daniel ficou agradado com um público entusiasmado.

Fernando Daniel estreou-se no passado sábado à noite no palco do Enterro da Gata, em Braga. Em entrevista ao ComUM, elogiou o público que assistiu ao seu concerto e debruçou-se sobre como a música mudou a sua vida, bem como procura relacionar-se com as pessoas através da sua obra.

Foi a sua primeira vez aqui no Enterro da Gata. Como é para si este ambiente?

Fernando Daniel: Vou ser sincero, foi muito fixe e não estava à espera. Por norma, nestas festas da universidade, o pessoal chega sempre muito mais tarde, para curtir mais a noite. Até fiquei bastante surpreendido, porque já estava algum pessoal para ver o concerto e quem estava soube aderir bem, soube participar, cantaram quase tudo. Fiquei muito contente com isso.

Como mudaram as suas expetativas face à sua música desde que participou nos concursos de televisão?

Fernando Daniel: Quando concorri a esses programas já tinha uma noção daquilo que queria fazer, do que queria representar com a minha música. A verdade é que não veio acrescentar nada, mas ajudou-me a ver melhor as coisas. Esses programas são como uma montra, chegam às pessoas muito facilmente. Nos programas de televisão eu consegui ter uma ideia daquilo que deveria transmitir às pessoas e da maneira como me deveria expressar. Parecendo que não, a televisão entra um bocadinho em tua casa, mesmo que não queiras, és apresentado às pessoas e acabas por focar-te no que estas gostam ou não. Foi um risco, mas aprendi como é cantar na televisão e ganhei uma perceção do que as pessoas gostam. Apercebi-me que as pessoas gostavam de mim e por aí tentei que gostassem daquilo que eu faço.

Fernando Daniel

Lara Varanda/ComUM

O que aprendeu com a produção e lançamento deste álbum?

Fernando Daniel: Aprendi bastante. Trabalhei com produtores muito bons, o Agir que está aqui é um deles. Muito trabalhadores, talentosos e dedicados. Ensinaram-me aquilo que eu quero fazer no futuro. Eu componho músicas para outros artistas, toco piano, toco guitarra e faço a letra. A produção da música no computador, sobretudo com microfones, acaba por ser mais complexa. Pude aperceber-me do modo como eles trabalham, pude assimilar alguns hábitos e maneiras de fazer as coisas. Eles próprios deixavam-me à vontade para questionar sobre tudo aquilo que eu quisesse. Como estava a começar, de certa forma olhavam para mim como um miúdo e dispuseram-se para me ajudar. Sempre que eu precisava de ajuda, eles davam-me as luzes.

Mencionou a literatura como um possível projeto futuro. Será que pode elaborar um bocado sobre isso ou ainda é segredo?

Fernando Daniel: Não é segredo. Nós recebemos uma proposta para fazer um livro. Ainda não sabemos ao certo, também não posso desvendar, se é um livro sobre a minha vida e sobre o meu percurso desde que comecei a tocar. Se sair, será apenas no final desta tour. Também há a possibilidade de ser algo relacionado com escolas e universidades. Mas ainda é algo que está muito rabiscado, não é algo de concreto.

As letras das suas canções referem circunstâncias amorosas e sentimentais. Estas refletem, de algum modo, episódios e sentimentos da sua vida?

Fernando Daniel: Claro que sim, alguns temas são autobiográficos. Podem não ser relacionados comigo, mas com pessoas que me rodeiam. Outros são histórias que crio, receios que tenho. Talvez pense de um modo negativo nas coisas atuais. Levo-as ao extremo, mostro aquilo que temo e como reagiria. Tento escrever aquilo que espero que não aconteça no futuro. No entanto, respeito aquilo que as pessoas já viveram e tento escrever para elas saberem que não estão sozinhas, que isso realmente acontece, que é normal. De certa forma, tento tocar nos corações das pessoas com as minhas músicas. Acho que a música é muito uma troca de sentimentos.

Como é para si lidar com todas as responsabilidades de uma carreira musical, consegue equilibrá-las com a sua vida pessoal?

Fernando Daniel: Sim. Agora passo muito menos tempo em casa, sessenta concertos é um bocadinho puxado. Mas sempre que estou em casa tento ser o Fernando da família. Divido a minha vida em duas partes, em 50/50. Quando estou em casa ou fora, quero dar 100% de mim. Graças a Deus consegui conquistar uma vida onde posso estar tranquilo, não tenho de me preocupar em arranjar um trabalho porque consigo viver da música. Nem sempre foi assim, já atuei em bares e trabalhei ao mesmo tempo. Isso também me fez crescer. Cheguei a ter dois trabalhos por dia e atuava à noite. Pouco dormia porque tinha de trabalhar às oito da manhã, tinha uma vida normal. Agora a vida é muito mais pacífica, passo o tempo em casa quando não estou em palco e tento compor. Tento espairecer um bocadinho, para não estar sempre focado na música. Não quero gastar todas as minhas ideias agora, quero ter uma carreira de 50 anos. Mas é fácil equilibrar, passa por ter cabeça e noção das responsabilidades.

Que músicos são para si uma referência a seguir?

Fernando Daniel: Gosto bastante de Rui Veloso, de Miguel Rameiro e de António Variações. O Agir, que está aqui hoje, para além de ser grande maluco, é uma pessoa excelente. Diria que é músico porque não canta só, ele é-me uma inspiração porque trabalha e respira música. O “Mágoa” foi feito em quatro horas, foi super-rápido e ele é muito dedicado.

Pode ler a entrevista do ComUM ao Agir aqui.

Qual é a sua opinião sobre o contexto atual do género pop em Portugal?

Fernando Daniel: Acho que está a abrir horizontes. Penso que, cada vez mais, há pop com elementos diferentes. Temos um pop mais eletrónico do Diogo Piçarra, enquanto o meu é mais orgânico, com mais banda. Tens o Agir, que apesar de eletrónico é diferente do Diogo Piçarra, com mais influências trap. O pop hoje em dia tem ganho diversas vertentes, abrange várias pessoas e vários estilos. Isso é bom, porque tens quem goste de ouvir uma banda física, mas também tens quem goste de ouvir algo mais instrumentalizado, com mais backing tracks. Há gostos para tudo e acho que neste momento há pop para toda a gente.