A música prepara-se para voltar ao anfiteatro natural de Paredes de Coura pela 26ª vez consecutiva. A pequena vila recebe este ano grupos como Arcade Fire, Fleet Foxes e Jungle, entre os dias 15 e 18 de agosto.
O festival Paredes de Coura arranca dia 15 de agosto. Antes, há ainda quatro dias de festas na vila de Paredes de Coura. Os preparativos estão quase prontos, e a praia fluvial do Taboão está quase pronta para receber os milhares de campistas e os cerca de 25 mil festivaleiros diários para mais uma onda de concertos.
O ComUM foi a Paredes de Coura durante as montagens falar com João Carvalho, o diretor e fundador do festival que caminha para a 26ª edição.
ComUM: Estamos a poucos dias do início do festival. Está tudo pronto? Como estão os preparativos?
João Carvalho: Tudo pronto, nunca está. Mesmo no dia, há sempre alguma coisa que se pode melhorar. No entanto, está tudo bem encaminhado, este ano começamos a trabalhar ainda mais cedo, estamos a dar grande importância às zonas de descanso e de circulação e de campismo. Pela primeira vez vamos ter o campismo vedado, sinalizado e com corredores de acesso, aumentamos e melhoramos também a quantidade de casas de banho com ligação à rede de esgoto… Isto para que as pessoas sintam sempre aquela comodidade especial que lhes proporciona Paredes de Coura. Queremos sempre, como costumo dizer e repetir muitas vezes, melhorar aquilo que sentimos que até já estava bem feito.
“Temos um projeto para o próximo ano que é fazer um parque de campismo oficial”
Fizemos também novas parcerias com muitas instituições, o Instituto das Florestas [Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas] para que tenha pessoas a sensibilizar para os cuidados com a floresta, com os bombeiros, com equipas de ambiente, novas equipas de limpeza. Vamos ter uma limpeza das casas de banho ainda mais eficaz.
Portanto, quando o festival chega à dimensão que chegou o Vodafone Paredes de Coura, temos de cuidar do pormenor e temos de cuidar das pessoas, e temos é que as mimar para que voltem a Paredes de Coura, porque não é fácil vir para o interior do país numa terra sem hotelaria… Ainda ontem falava com a minha equipa da dificuldade que será de alguém que não gosta de acampar vir para Paredes de Coura. Infelizmente é uma coisa que tentamos combater mas não temos armas para o fazer, infelizmente vai havendo algum exagero no aluguer de casas, e portanto a alternativa será mesmo as pessoas acamparem.
Daí nós querermos cada vez mais dar condições; inclusive temos um projecto para o próximo ano que é fazer um parque de campismo oficial. Portanto, comprar uma série de terrenos e criar condições para que as pessoas que não gostam de acampar que o possam fazer com toda a comodidade.
ComUM: Não ficam satisfeitos? Já o ano passado tinhas dito que ia haver o triplo dos lava-loiças, o triplo das casas de banho, agora há esse anúncio de 2019. Querem sempre melhorar o parque?
João Carvalho: Sim, sim. Ainda ontem me perguntavam: mas porque é que vocês estão sempre a mexer no terreno? Tu este ano entras no pórtico e do lado direito tens uma zona verde que não existia – foi desbravada, era floresta intensa -, limpamo-la e vamos ter bancos de jardim, já tem relva, tem zonas de descanso… Acho que temos de mimar as pessoas! É um festival diferente, é um festival que vive muito desta relação, desta cumplicidade, portanto acaba uma edição, ou melhor, durante a montagem desta edição já estamos a pensar nos melhoramentos que vamos fazer nos próximos anos.
Por exemplo, há bocado o Arlindo Machado, que é um dos responsáveis aqui do terreno, disse-me que precisava de falar comigo que era uma conversa séria, e de repente manda-me olhar para o horizonte, para ver se eu não via nada de especial. E eu: “não, não estou a ver!”. Mas a cara dele continuava a dizer que parecia ser um problema complicado.
Não, era só porque finalmente vamos ter o recinto principal e o Vodafone FM sem cabos a passar no ar! Só para veres como vivemos as coisas, “isto é sonho antigo!”, dizia ele. Isto porque também criamos um novo sistema de rede elétrica subterrâneo, mas só agora é que vimos o resultado quando se tiraram os cabos e realmente fica muito mais bonito.
ComUM: De quem é que parte este investimento?
João Carvalho: Da Ritmos e também da câmara. Digamos que é um investimento conjunto.
“Os nomes grandes são caros e são cada vez menos”
ComUM: O preço do passe geral está nos 100 euros. É o passe geral mais caro que Paredes de Coura já teve. Há condições para baixar em 2019?
João Carvalho: Não, porque com o investimento que estamos a fazer no recinto, nós queremos é no próximo ano melhorar, mais uma vez, o recinto e começar a apostar mais ainda na programação. Este é um festival cujo objetivo não é mercantilista, obviamente que o que nos move é “temos de pagar o festival e temos de ganhar dinheiro”, todos temos vidas. Mas a história do festival foi de bilhetes grátis, depois passou para um bilhete simbólico, depois passou para a internacionalização, depois para os nomes grandes e agora sentimos que o público já exige mais nomes grandes. Se bem que este é um festival de tendências, apresentar novidades, esses nomes grandes são também necessários para que as pessoas venham.
Só que os nomes grandes são caros e são cada vez menos. Se olhares para o cenário dos festivais internacionais, para os nomes que já vieram ao Paredes de Coura, ao Primavera Sound, ao Alive ou a outros festivais, eu lanço o desafio e digo: escolhe cinco cabeças-de-cartaz para o Primavera Sound, cinco para o Paredes de Coura e cinco para o Alive. É muito difícil, porque não há muitas bandas grandes.
Hoje há as bandas intermédias, as bandas que nascem todos os dias como cogumelos e que têm imenso talento, mas as bandas de carreira… Ou pegas nas bandas antigas que podem voltar, uma espécie de Nick Cave, Neil Young, Pixies, Radiohead, mas que também já vieram cá muitas vezes; ou entras pelo hip-hop, e aí sim nascem fenómenos gigantes quase todos os anos, um Travis Scott, um A$AP Rocky. Mas a verdade é que não são assim tantas. Se pensares em cinco cabeças-de-cartaz para três festivais diferentes, vais ver que tens dificuldade em encontra-los, ou porque já cá vieram, ou porque já se repetiram muitas vezes, ou porque não estão em digressão, ou porque simplesmente não existem.
ComUM: Há um público que já vem a Paredes de Coura mais pelo “ambiente” e não tanto pela música, que é a impressão com que muitas pessoas que vêm a Paredes de Coura há mais anos ficam. Com bastantes nomes desconhecidos para essas pessoas, achas que faltava mais alguma coisa ao cartaz ou estás satisfeito?
João Carvalho: Falta sempre mais alguma coisa, eu nunca estou contente com um cartaz. Nunca, nunca. Nem no Primavera nem no Paredes de Coura. Nunca. E se perguntares a outro programador qualquer, nunca ninguém está satisfeito, podes sempre ter mais alguma coisa. É o cartaz ideal? Não, não é o cartaz ideal. Tem bons nomes e é dos melhores cartazes de sempre? Eu acho que sim, porque juntar Fleet Foxes com Arcade Fire, com Jungle que tem um disco novo, com Skepta que está a dar cartas no hip-hop… Tens depois novidades de Lucy Dacus, primeira vez cá, DIIV que se não é a primeira vez, é a segunda vez cá e vem dar uma única data na Europa, os The Blaze, que tenho a certeza absoluta que se vão agigantar e para o ano ou daqui a dois anos serão cabeças-de-cartaz de qualquer festival da Europa…
Portanto eu estou contente com o cartaz! Agora, falta sempre mais alguma coisa. A gente quer sempre mais alguma coisa, claro.
Às vezes os artistas tornam-se tão grandes que se tornam insensíveis”
ComUM: Falaste nos Arcade Fire, e os Arcade Fire surgiram depois de um cancelamento da Björk. Tanto no comunicado do festival como no comunicado da página da Björk, como aconteceu noutros concertos em festivais, foi justificado com “questões logísticas”. Quais foram estas questões logísticas?
João Carvalho: As questões logísticas são sempre a desculpa de um artista. Os grandes artistas são procurados em todo o mundo, têm essa facilidade, marcam e desmarcam como querem. No caso da Björk, eu fiquei realmente aborrecido porque era um nome que nós queríamos muito, que já tinha falhado também no Primavera Sound…
As questões logísticas, dizem as boas normas, que não se deve contar o que se passa (risos). Mas foi a justificação que nos deram.
ComUM: E estás satisfeito com essa justificação?
João Carvalho: Eu não, fico sempre descontente.
ComUM: Mas ficas ressentido com a Björk?
João Carvalho: Eu fico, mas não devia, isto é o ABC da contratação, mas eu fico sempre. Há uma banda, por exemplo, que eu gosto muito e nunca mais ouvi, que são os Kills. Tivemos perto de os voltar a trazer para Paredes de Coura duas ou três vezes, e desmarcavam sempre relativamente perto da data do anúncio.
Eu acho que o mundo da contratação também tem de ser feito com consideração, e às vezes os artistas tornam-se tão grandes que se tornam insensíveis. Quer dizer, para eles cancelar mais um concerto é como tu cancelares um café com um amigo e não pode ser assim, porque um concerto tem milhares e milhares de pessoas. Felizmente, não há muitas bandas assim, mas ainda há algumas.
Portanto eu gosto das bandas sensíveis, bandas como os Arcade Fire, que este ano perceberam que tínhamos um problema para resolver, e abdicaram de tocar em três festivais para tocar só num. Isto quer dizer que podiam ganhar três vezes mais indo a três festivais, mas lembravam-se do recinto, lembravam-se de como este era um festival genuíno. Eu gosto de bandas com memórias, bandas com sentimentos e bandas com consideração.
ComUM: Sobre outra banda cuja vinda a Paredes de Coura está algo problemática, as Pussy Riot…
João Carvalho: Não está problemático! Até porque a principal vocalista das Pussy Riot, que é a líder do movimento, não foi presa. Foram presos outros elementos, que entretanto foram soltos. Portanto está confirmado esse concerto. Foi uma promoção extra (risos).
“Felizmente hoje fazem-se bons projetos, há boa música e hoje até é difícil escolher só cinco bandas”
ComUM: Outra particularidade do cartaz é o facto de virem treze bandas e grupos portugueses ao festival, quatro deles do Minho, ao recinto principal. É uma subida a pique desde outras edições. Qual foi a motivação para tantas bandas portuguesas?
João Carvalho: É verdade. Eu há sete, oito anos, tinha dificuldades em escolher três bandas portuguesas, porque não havia muita qualidade. Eu sentia sempre que o festival não tem quota, não tenho que garantir nenhuma quota nacional, o festival é nosso, a programação é nossa, e portanto sequer que ter alguma banda portuguesa, mas achamos sempre que o devíamos fazer. Mas houve anos que foi difícil fazê-lo, houve anos até que não tivemos nenhuma ou tivemos uma ou duas. Precisamente porque não havia muitas bandas.
Felizmente hoje fazem-se bons projetos, há boa música e hoje até é difícil escolher só cinco bandas. O objetivo seria ter uma, duas por dia, e depois aparecem coisas tão boas que não resistimos. Bandas como os Linda Martini ou The Legendary Tigerman que têm discos novos e que fazia sentido voltarem, ou depois projetos como a Surma que já devia ter vindo a Paredes de Coura. Portanto quase que tens essa necessidade, não uma necessidade, repito, de quota de música portuguesa, mas uma necessidade de programação, porque são realmente bons projetos. E depois também fazem este equilíbrio com as coisas pequeninas que aparecem no estrangeiro, que até poderiam ter mais impacto, mas na balança da qualidade, chegas à conclusão que é melhor ter a Surma do que alguns projetos internacionais que me ofereceram.
A razão é essa. A qualidade da música portuguesa, que cresceu imenso, e também a pouca quantidade de palcos destes festivais para eles se apresentarem. Encontrar bandas cujo sonho é tocar em Paredes de Coura é todos os dias. Isso mexe comigo, comove-me ouvir projetos que hoje são grandes projetos nacionais dizerem-me que decidiram ser banda porque vieram a Paredes de Coura. Conheço dezenas de histórias dessas bandas que agora são hoje bandas grandes e decidiram formar uma banda depois de virem a determinado concerto a Paredes de Coura.
Portanto também tenho essa obrigação moral, percebes, sabendo eu que outros festivais não apostam assim tanto na música portuguesa. Agora, se vai ser uma tendência? Não, aumentar não. Provavelmente até diminuir.
ComUM: Referiste isso das bandas que foram formadas devido a Paredes de Coura, e as três bandas com quem o ComUM falou, os Grandfather’s House, os smartini e os Dear Telephone, disseram todas que era um sonho tocar em Paredes de Coura depois de verem concertos cá. Vês então Paredes de Coura como um festival influenciador para os grupos?
João Carvalho: Sim, vejo. Vejo, porque tenho ouvido muitas histórias, mesmo, dezenas, para não dizer centenas. Muitas bandas que eu conheci, que me garantiram isso, que decidiram ser banda em Paredes de Coura. Acho que Paredes de Coura também influenciou a forma de ouvir música em Portugal, não tenho qualquer problema em parecer pretensioso com isso, não tenho dúvidas que isso aconteceu. Estamos aqui há 25 anos, formamos tendências…
Repara, Paredes de Coura sempre foi um festival indie, com aposta em novos projetos: foi aqui que apareceram pela primeira vez em Portugal os Flaming Lips, os Queens Of The Stone Age, os Mr. Bungle, os Coldplay, os Yeah Yeah Yeahs… Enfim, são dezenas e dezenas de bandas que estiveram aqui pela primeira vez em Portugal. E portanto, na altura, festival indie havia este. A programação dos outros festivais, se fores ver na história, era mais comercial. Hoje a tendência é toda a gente ter uma programação mais indie, chamemos-lhe assim.
Portanto também me parece, e aqui não quero ser pretensioso, que influenciamos a forma de programar nos outros festivais. Mas a forma de ouvir música em Portugal garantidamente que influenciamos e ainda bem, há uma geração que cresceu a vir a Coura e que cresceu a partilhar bandas que vêm a Paredes de Coura, há gente que se conheceu em Paredes de Coura, que casou e que tem filhos e influenciou os filhos, temos aí a nossa marca e é um orgulho grande.
(Pode ler aqui as reportagens sobre os Grandfather’s House, os smartini e os Dear Telephone)
ComUM: Uma banda que entrevistamos, os Grandfather’s House, vão estar no palco principal e são destas bandas que nasceram há cerca de cinco anos, e que fazem parte do boom de bandas do Minho. Podemos ver cada vez mais bandas portuguesas, que começaram há cerca de quatro, cinco anos, a tocarem no palco principal, em vez de apenas palcos secundários, como tem sido costume nos últimos anos?
João Carvalho: Sim, se houver qualidade, isso pode acontecer. Os Grandfather’s House, realmente… A Rita e o Tiago, o irmão, ganharam aqui um concurso há sete, oito anos, do Jornal de Notícias (JN), do qual eu era também júri na altura em que tínhamos uma parceria com o JN, e tocaram no palco Jazz na Relva e eu nem me lembrava disso.
Entretanto fui ver um concerto deles em Braga; aliás, não é por coincidência que há muitas bandas de Braga e Guimarães. Eu não posso andar em digressão nacional sempre a ver bandas e como moro em Braga atualmente, tento ver os concertos em Braga. Vejo muitas coisas interessantes e às vezes sinto-me até injusto com algumas bandas que há pelo país fora que eu vou ouvindo – tudo o que me enviam, eu oiço -, e há realmente muita qualidade. Mas depois eu gosto de ver ao vivo, para ver o que é que eles valem ao vivo; há coisas maravilhosas que eu tenho ouvido e depois vou ver ao vivo e afinal a voz não é aquela, porque na gravação tinha efeitos, e afinal o baixista não é tão bom como parece, e eu gosto de ver.
Sim, vamos continuar a ver bandas a crescer em Paredes de Coura. Eu tenho pena, por exemplo, este ano de não ter trazido os Bed Legs, que já cá estiveram. Agora, também não quero cair sempre na repetição, porque há tanta banda, há tanta coisa boa com tanto talento para se mostrar, e eu já me perdi um bocado na tua pergunta (risos)…
ComUM: Se vias capacidade nas bandas como essas, como os Bed Legs e Grandfather’s House, de subir ao palco principal.
João Carvalho: Ah sim, sim, vejo. Aqui é uma questão de ter talento, não é uma questão de ter simpatia ou menos simpatia pela banda: tem talento, toca; não tem, não toca. Os Grandfather’s House decidi pô-los no festival e abrir o palco principal precisamente num concerto que fiz com eles em Vigo [Super Bock Under Fest], que eu nem tinha na equação trazê-los a Paredes de Coura, porque achei que “ok, estiveram cá há dois anos, parece-me a mim que era ser muito rápida a repetição”. E vi-os em Vigo, e achei que cresceram imenso. Em termos de performance e forma de vestir e de look, estavam muito bem, na essência musical estavam melhor ainda, e foi ali que eu decidi.
Às vezes as pessoas pensam que é aquela coisa que se arrasta, e não, às vezes é um momento. “Ok, vejo determinada banda, quero isto”. E foi o que aconteceu nos Grandfather’s House.
“Vou desligar o telefone garantidamente em Blaze”
ComUM: Há alguma banda para o qual estejas mais ansioso? Há algum concerto para o qual tu olhes para o cartaz e digas: “não, nesta altura quero estar com o telemóvel desligado, quero ficar a olhar para o concerto”?
João Carvalho: Claro que há! Olha, os primeiros são os The Blaze. Os Blaze são de um estilo de música eletrónica, não é um estilo que eu seja um grande fã, e posso dizer de certeza absoluta que foi a banda que mais ouvi este ano. Estou desejoso de ver os Blaze,e estou muito orgulhoso de sermos nós a apresenta-los em primeira mão porque tenho a certeza absoluta que vão ser grandes. Quero muito ver os Big Thief, até porque tenho muitos amigos que já os foram ver e que me dizem que são absolutamente geniais ao vivo. Os King Gizzard, porque é sempre um improviso maravilhoso e eu gosto realmente muito muito deles, por isso é que os estamos a repetir. A repetir também os Slowdive, porque é daquelas bandas que se virmos todos os fins-de-semana, não nos chateamos, pelo menos eu quando gosto muito de uma banda acontece isso comigo. E os Arcade Fire, porque os Arcade Fire vão fechar o festival e acho que vai ser assim um acontecimento, acho que vai ser uma coisa apoteótica. Mas depois temos a Lucy Dacus, que estou muito curioso para vê-la ao vivo, temos os Fleet Foxes que eu gosto num outro registo…
Agora desligar o telefone? Vou desligar garantidamente em Blaze, vou desligar garantidamente nos Arcade Fire, por razões obviamente diferentes… Uma coisa é estar a ver a magia acontecer, e outra é veres a Champions League. Os Arcade Fire são um jogo da Champions League, sabes que corra bem ou corra mal, é um bom jogo. Se me perguntares mais de Arcade Fire ou dos Blaze atualmente, eu digo-te que até gosto mais dos Blaze ou dos King Gizzard, mas obviamente que tem de ser ver os Arcade Fire por tudo o que eles representam para a música, pelo regresso ao lugar onde foram felizes naquele célebre cartaz de 2005 onde estiveram também Nick Cave, The Nationals, Foo Fighters, Pixies, enfim, foram tantos…
ComUM: Foi logo a seguir a eles apresentarem o “Funeral”.
João Carvalho: Foi, exactamente, e lembro-me do vocalista da banda, o Win Butler, ir para lá para cima vender o merchandise! Estás a ver, imagina hoje uma banda que vem com oito autocarros, três tour buses, uma mega estrela mundial, e em Paredes de Coura ali a vender o “Funeral”, precisamente. Eu comprei-lhe um! (risos)
“Eu não sei como é que há gente que consegue viver sem música, a música para mim é fundamental”
ComUM: Falaste nalguns grupos pequenos, mas como é que selecionam nomes como Frankie Cosmos, Marlon Williams, nomes que não são muito conhecidos?
João Carvalho: Frankie Cosmos foi porque… Olha, porque ouvi no Spotify! Ando sempre a ouvir música.
ComUM: É a ouvir recreativamente ou a ver outros festivais?
João Carvalho: Recreativamente, sim. Esses exemplos que deste foi recreativamente. Frankie Cosmos foi, descobri, já não foi este ano, foi o ano passado. Hoje tens essa facilidade, estás a ouvir determinada coisa que depois sugere outras bandas, e eu normalmente oiço 30 ou 40 bandas por dia. As pessoas pensam que é impossível, mas eu oiço! Para já, porque ando muito de carro; e depois ouço sempre música em casa.
Aborrece-me quando alguém me diz “eh pá, agora não acompanho nada porque não tenho tempo para ouvir música”. Tu consegues fazer TUDO a ouvir a música. Tudo! consegues cozinhar, consegues trabalhar, consegues ir à casa de banho… Consegues fazer tudo, essa desculpa é inaceitável. Aliás, eu não sei como é que há gente que consegue viver sem música, a música para mim é fundamental, a música mexe com o teu estado de espírito. Tu acordas e se ouvires determinada música, ficas com determinada disposição.
Mas isto a propósito de como é que eu descubro as bandas. Esse foi assim. O Marlon Williams… Como é que foi o Williams? Também foi assim. Depois acompanhei no South by Southwest, e tinha lá um amigo que me disse: “das melhores coisas que eu vi, ao vivo”. É que ainda por cima ele ao vivo é muito, muito bom. Tens meia dúzia de pessoas em quem confias imenso, neste caso era o Hugo da Omnichord. E o Hugo estava maravilhado com aquilo. E eu que já gostava de Marlon Williams, que já tinha feito proposta, nesse mesmo dia forcei que estávamos a precisar de fechar o cartaz e o Marlon Williams fechou no dia a seguir. E fiquei a saber que o ano passado ele tinha estado no Porto 15 dias de férias. Ainda não sendo um cantor conhecido veio para o Porto, ia passar meia dúzia de dias, gostou tanto que ficou 15 dias no Porto, portanto isso também ajudou na contratação.
ComUM: No dia 15, quem vai fechar? The Blaze ou King Gizzard & The Lizard Wizard?
João Carvalho: The Blaze, porque é esse o acordo que temos com eles, e é música eletrónica para acabar em festa.
ComUM: Segundo dia, será Fleet Foxes?
João Carvalho: Não, por acaso não. Vai ser Jungle. Eu gosto de acabar com festa! Porque acabar com Fleet Foxes podia ser acabar muito calminho e eu gosto de ver as pessoas a sair mexidas, a sorrir e com adrenalina.
ComUM: Terceiro dia, DIIV, Skepta ou Slowdive? Estamos aqui a apostar para ver qual deles é…
João Carvalho: Podia ser qualquer um dos três, a verdade é essa! Mas vai ser o Skepta. E no último dia, é óbvio quem vai terminar.
“Garantidamente que para o ano o festival se chamará Vodafone Paredes de Coura”
ComUM: Há expectativa para encher?
João Carvalho: Quando esta entrevista for para o ar, o sábado já esgotou. Há pouco faltavam 300 bilhetes, portanto provavelmente hoje ao fim do dia estarão vendidos. Os passes sim, estão a vender no ritmo do ano passado. Portanto vai ser uma edição como no ano passado, com a vantagem de termos melhores condições e de termos zonas de descanso e de termos zonas onde as pessoas podem circular.
ComUM: Mais um ano com a Vodafone a patrocinar o festival. Olhando para o futuro, 2019 contará também com o patrocínio principal da Vodafone? Ou há outras marcas em vista?
João Carvalho: Nós temos marcas interessadas, e temos uma bela parceria com a Vodafone. O máximo que pode acontecer no próximo ano é termos mais uma ou duas marcas, mas respeitando sempre o facto de a Vodafone ser o main sponsor, até porque temos mais um ano de contrato. Portanto garantidamente que para o ano o festival se chamará Vodafone Paredes de Coura.
Mas já há aí outras marcas, inclusive internacionais, interessadas.
ComUM: Há intenção em renovar o contrato?
João Carvalho: Com a Vodafone, sim, sim. Nós entendemo-nos bem. A Vodafone facilmente percebeu que este não era um festival para comunicar de uma forma gritante ou folclórica. Repara, tu entras no recinto e tu vês logos nas laterais do palco, e o Vodafone na zona VIP. Não vês oferta do brinde fútil, são tudo coisas úteis, seja barcos de borracha, seja almofadas de água ou lanternas, tudo o que se oferece é útil.
Nós recusamos patrocinadores, Paredes de Coura tem recusado patrocinadores, porque não queremos ter patrocínios a todo o custo. Não queremos ter pessoas vestidas de animais selvagens a oferecer produtos à entrada do festival, não queremos pessoas vestidas de garrafa a incomodarem as pessoas quando estão a ver um concerto. Temos recusado muitos patrocinadores. Todos aqueles que temos e que vamos conquistar são escolhidos a dedo e a Vodafone obviamente que é até hoje o patrocinador que melhorou percebeu o Paredes de Coura, portanto queremos continuar com eles porque eles entendem a nossa forma de estar, de comunicar.
ComUM: E há a mesma opinião, a mesma intenção…
João Carvalho: Por parte da Vodafone? Claro!
ComUM: Não, há essa mesma predisposição e opinião em relação às marcas no NOS Primavera Sound?
João Carvalho: Sim, mais ainda! Posso dizer que este ano, o Primavera recusou mais de dez patrocinadores. O Primavera neste momento é um festival muito apetecível para as marcas, só que nós não queremos que as marcas estejam no Primavera como estão nos outros festivais. Não é que tenhamos nada contra os outros festivais, mas nós queremos que os nossos eventos pareçam salas de espetáculo onde a publicidade não seja intrusiva e apareça de forma subtil. Ok, um festival não se faz sem marcas? É verdade. Agora, as marcas têm de saber comunicar, não é? Não pode vir para Paredes de Coura uma estrutura com dois andares como está no Alive, porque não se enquadra na natureza! Não faz sentido.
“Eu quero que as marcas que sejam sedutoras”
Não permitimos, por exemplo, que os patrocinadores tenham música e som. Eu imagino as pessoas a pensar e a conversar sobre o que acabaram de ver, não é levar com barulho das marcas enquanto procuram outro palco ou enquanto vão jantar. Os festivais também são espaços para conversar e para que as pessoas repousem. Ver música é divertido mas também é desgastante, e o que eu acho é que para onde os festivais hoje em dia têm de ir- e não quero pretensioso -, mas parece-me que nós estamos um bocadinho a influenciar a forma dos outros festivais também comunicarem, e ainda bem. Porque os festivais não têm que ser Queimas das Fitas, com todo o carinho que eu tenho pelas Queimas das Fitas, nem eventos barulhentos, seja de forma auditiva ou visual. E a Vodafone está-nos sempre a dizer que sim, que temos razão.
Eu dou sempre o exemplo de uma marca, dou sempre este exemplo, não é um exemplo inteligente mas que é assertivo para as pessoas perceberem. Eu se quiser seduzir uma rapariga ou se tu quiseres seduzir uma rapariga, não lhe vamos gritar ao ouvido! Não vais ser folclórico, vais ser sedutor. E é isso que eu quero que as marcas façam, que sejam sedutoras, que seduzam. Uma forma de seduzir para uma marca é, por exemplo, dar um brinde que te fez imensa falta, e que tu vais dizer: “ei, se não fosse a Vodafone, como é que eu teria carregado o meu telemóvel ou como é que eu teria descarregado aquele livro que andava à procura?”. As marcas têm de ser um complemento, e não uma coisa intrusa. Não têm que te chatear, antes pelo contrário, têm que te ajudar e é a melhor forma que tens de levar uma marca na cabeça. Repara, a Super Bock, por exemplo, faz bares novas para Paredes de Coura, faz bares de madeira bonitos, não vêm aqueles contentores com 500 logos, e chegaram facilmente à conclusão que o retorno é melhor assim do que quando tinham aqueles logos todos.
Eu tenho a noção de que as marcas estão contentes. Primeiro obviamente hesitam, porque têm que investir, porque têm que fazer uma comunicação diferente num festival onde podem aproveitar, mas acabam por nos dar razão.
ComUM: Para terminar, há mais alguma coisa que queiras dizer sobre o festival, o cartaz, o que as pessoas podem encontrar aqui?
João Carvalho: O que eu quero sempre que as pessoas façam em Paredes de Coura é que se divirtam. E dos maiores orgulhos que eu tenho é nunca ter existido um conflito que fosse, uma coisa complicada, é ser um festival muito de paz, de amor, de bem-estar. E eu quero é que as pessoas se divirtam, que tenham boas condições, que usufruam, que façam amizades… Essa é a parte essencial. Depois, obviamente que vejam bons concertos. É isso que nos une, é o amor pela música. Um amor pela música que depois já se transformou num amor por Coura e num amor por uma grande família, e é bonito ver em Paredes de Coura que as pessoas não se conhecem mas facilmente fazem uma amizade, e facilmente se inserem num determinado grupo de pessoas. Portanto eu quero que as pessoas se divirtam, que venham para aqui e sejam felizes!