Após uma ausência de quatro anos entre tours e alguns singles, Ryan Hemsworth lança o seu terceiro álbum, Elsewhere. O projeto é carregado de sonoridades mais animadas e positivas, para além de um grande número de colaborações.

O produtor e DJ canadiano já não contava com um LP no seu catálogo desde 2014, ano no qual lançou o curto, mas inspirador, Alone for the First Time que, em conjunto com colaborações com artistas como Mitski, Tinashe e Tory Lanez o conduziram para o sucesso.

Esse projeto, juntamente com os EPs lançados e o primeiro álbum, Guilt Trips, permitiram destacar o estudante de jornalismo no panorama do Indie Eletrónico, pelo incrível e rebuscado uso de samples, principalmente a nível das vozes, acompanhados por instrumentais melancólicos e saudosistas ou experimentais de ponta. As temáticas muitas vezes abordam sentimentos de culpa, necessidade e desconexão, inspiradas pelo afastamento proveniente das suas variadas tournées pelo mundo, tocando em palcos que vão desde o Japão aos Estados Unidos.

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E foi no meio das tours que muito deste álbum foi planeado por Hemsworth, procurando colaborações com artistas dentro e fora da editora que criou, Secret Songs. Após 2016, ano em que lançou múltiplos singles, foi somente em 2017 que se viu a possibilidade de lançamento de um novo álbum completo, com o single Four Seasons.

Sem dúvida a típica produção do DJ continuava bastante presente nesta faixa, mas fora disso, pouco ou nada estava aqui semelhante a projetos posteriores do artista. Com influências do Afrobeat, com uma estética mais movimentada e animada, e sem qualquer tipo de edição na voz, fora o auto-tune. Era definitivamente algo fora do esperado.

Porém, só a 21 de Setembro, é que se conseguiu observar até onde o canadiano tinha puxado as suas próprias barreiras. A faixa de entrada, This Feeling, surpreende pela batida Funk incrivelmente cativante, curada por uma letra simples e direta. A canção tem uma sonoridade que pode ser equiparada à do português Moullinex, que coincidentemente também possui um álbum chamado Elsewhere na discografia.

Fica bem claro desde o início que Hemsworth utiliza as suas várias colaborações ao longo deste álbum como um veículo para uma maior variedade e oportunidade de influências ao longo das 12 canções que o preenchem. Embora a produção se encontre no pináculo a nível pessoal do artista, com uma construção belíssima à volta de cada uma das partes de Elsewhere, também não deixa de haver um pequeno abandono daquilo que o tornava único.

Sade, que retira inspiração da artista de mesmo nome, incluindo até uma referência a um dos seus hits “The Sweetest Taboo”, conta com bastante forro a nível vocal e uma exibição elegante e simultaneamente moderna de R&B, pautada por uma harmonia atraente e que fica no ouvido.

Lagoons, é uma balada mais intimista e profunda, limada pela palete suave, mas densa, dominada pelo produtor canadiano. A presença vocal de Daniela Andrade, cantora canadiana de fama proveniente da plataforma YouTube, eleva o teto e desafia um bocado as noções do último álbum do DJ, Alone for The First Time.

Guilt Trips também marca a sua presença e musicalidade sobre a forma de Ego Ride. Uma faixa instrumental extraordinariamente estranha, que usa variados elementos desde xilofones a sintetizadores vigorosos. Soa vanguardista mas simultaneamente pura e fundamentada.

Special Girl e Think About U demonstram também uma força em obrar dentro da harmonia de outros artistas, com a primeira a resultar da colaboração com o ganense SK, que contribui com a voz e estética, e Tomggg com um impacto eletrónico passivo na percussão. Já a segunda conta com Joji, e reflete as batidas lo-fi, solitárias e cabisbaixas do cantor, com a direção geral e a experiência artística de Hemsworth a complementar a sua gama vocal de maneira bastante solidificada e delineada.

A última faixa do álbum, Animal, com Robin Dann, conta com toda uma diversidade sonora que nos acaba por deixar esperançosos em relação ao futuro do artista. Os primeiros minutos trazem nostalgia da simplicidade e simultânea estranheza do álbum anterior, e um certo sentimento de relaxamento e finalidade digno do fecho de um álbum. E é então que, por volta dos três minutos, somos apanhados de surpresa pela beleza e simplicidade de instrumentos de corda e crescendos de piano, que nos trazem à memória bandas como Sigur Rós.

Canções como For U, One of One e The Butterfly Effect retiram grande parte do núcleo daquilo que já ouvimos noutros artistas, sem reinventar nada. São os pontos mais entediantes em todo o álbum, por adicionarem pouca multiculturalidade e pluralidade sónica, que pode ser encontrada noutras partes do projeto, que são mais interessantes e fora da caixa.

Beep Beep também peca em certa parte por estas razões. Porém, conta com uma presença mais afirmada da mão do produtor, com uma maior azáfama musical e quebras sistemáticas que a fazem soar um pouco menos comum.

Em geral, Ryan Hemsworth demonstra uma incrível versatilidade e maturidade ao longo deste projeto, conseguindo adaptar-se de forma notável a um gigantesco número de colaborações.

No entanto, como é habitual, quando existe uma mudança do registo sonoro tão grande de álbum para álbum, existem algumas arestas que não estão bem limadas. Apesar da experimentação de Elsewhere ter momentos incríveis, não deixa de haver espaço para um pequeno sentimento de que o canadiano está a perder algumas das habilidades que o faziam único em prol de um som mais genérico.