O facto é inegável: o futebol foi, é e sempre será a modalidade com mais notoriedade em Portugal. A grande maioria das crianças convive com o designado ‘desporto rei’ desde tenra idade e não seria absurdo afirmar que uma percentagem elevada tem mesmo o sonho de construir uma carreira como futebolista profissional.

À partida, este pressuposto nada tem de errado. A prática de qualquer atividade física é sempre louvável e a vida de futebolista tem muitos aspetos positivos. Apesar disso, alguns factos ocorridos durante a última semana vieram mostrar que nem tudo é um ‘mar de rosas’ para aqueles que efetivamente conseguem chegar à elite do futebol.

Em declarações proferidas à revista Kicker, Renato Sanches, médio internacional português, afirmou não estar feliz no Bayern Munique e colocou em cima da mesa a possibilidade de sair do clube alemão para jogar com mais regularidade. Em causa não está o valor futebolístico (ou falta dele) do jogador –  o propósito deste artigo não é avaliar isso –, mas sim a forma como a carreira de Renato Sanches tem sido conduzida e gerida.

O jovem surgiu com 18 anos no plantel principal do Benfica, foi decisivo na conquista do campeonato nacional e contribuiu também para a vitória no Campeonato da Europa por parte de Portugal. Estavam assim presentes todos os ‘ingredientes’ para se ter uma ‘receita perfeita’…

A política de endeusamento praticada pelos adeptos do clube do jogador contrastou com a de quase ódio praticada pelos adeptos das formações adversárias. Para além disto, o excessivo acompanhamento por parte da comunicação social acabou por ser prejudicial para o jogador. Deixou de ser notícia apenas o plano desportivo, ou seja, aquilo que realmente importa, para se passar a discutir se o médio trocou de penteado ou se fez uma nova tatuagem. A tudo isto ainda se juntou as desconfianças relativamente à idade do atleta.

Se o início do caso de Renato Sanches data de há três anos, a verdade é que há outro jovem português a emergir neste momento. João Félix tem estado em destaque no Benfica e acabou por ser chamado à seleção principal de Portugal.

Mais uma vez, o foco rapidamente deixou de ser aquilo que o jogador produz dentro de campo e passou a discutir-se a sua capacidade para a ‘prática da natação’, se a sua cláusula deve ser 200 ou 201 milhões de euros (valores claramente excessivos para qualquer jovem da idade de João Félix) ou se o seu carro é adequado para um jogador do Benfica. As comparações com Cristiano Ronaldo começaram a ganhar força e esqueceu-se, por completo, que se fala de um jovem de apenas 19 anos.

Sendo certo que é obrigatório para um atleta fazer um trabalho de preparação mental forte, a verdade é que uma maior dose de equilíbrio entre aquilo que é o apoio dos adeptos do clube do jogador, a crítica dos apoiantes dos clubes adversários e o destaque dado pela comunicação social é fundamental para o desenvolvimento do futebol português. Aos 18/19/20 anos, os jogadores estão na reta final da sua formação, ainda têm muito que crescer e exercer-se este tipo de pressão é bastante negativo.

É possível gostar sem colocar os jogadores num pedestal, à parte de tudo o que é a sociedade. É possível não gostar sem odiar, sem desejar que o jogador do clube adversário se lesione com gravidade ou algo do género. É possível a comunicação social acompanhar a carreira de um jogador sem exageros. Cabe a cada interveniente da modalidade contribuir para o crescimento dos jovens portugueses e, consequentemente, para o crescimento do futebol em Portugal.