O antigo fotojornalista foi convidado a participar, esta semana, nas XXII Jornadas da Comunicação da Universidade do Minho.

Alfredo Cunha foi orador, esta quarta-feira, no painel “Desinformação: Mensagem e meios” nas XXII Jornadas da Comunicação da Universidade do Minho. Em entrevista ao ComUM, o fotógrafo partilhou as memórias de quando fotografou o 25 de Abril e o período de descolonização e falou ainda do seu tempo enquanto fotógrafo oficial dos Presidentes da República António Ramalho Eanes e Mário Soares.

O antigo fotojornalista considera que ainda aprende enquanto fotógrafo, porque “há sempre coisas novas a acontecer”. Alfredo Cunha conta que o jornalismo vai fazer sempre parte da sua vida, apesar de ter deixado a profissão em 2012. “O Ciclo da Vida das Mulheres” é o livro que está a preparar, com imagens desde 1970 até ao presente.

 

ComUM: Na linha militar, tinha 20 anos quando fotografou a Revolução e é seu o icónico retrato a Salgueiro Maia. Na altura, quando lhe ligaram a informar do acontecimento, o que pensou de imediato?

Alfredo Cunha: Eu já sabia que era um golpe de estado, nós estávamos à espera. Tínhamos a informação de que ia haver um golpe de estado. Tinha havido uma tentativa um mês antes e nós já sabíamos para o que íamos.

 

ComUM: Entre a Revolução do 25 de Abril e a descolonização, que acontecimento preferiu fotografar?

Alfredo Cunha: Não consigo responder a isso. Fotografei os dois com a mesma intensidade, mas de forma diferente. O 25 de Abril fotografei à medida que foi acontecendo, enquanto que a descolonização fotografei tendo em conta o que estava a acontecer. Ou seja, tive consciência de que ia acontecer qualquer coisa de muito grave, que ia ser uma tragédia e, na altura, estava tudo em festa, portanto em Portugal não se dava muita importância à descolonização. Mas, de facto, a descolonização é um trabalho mais elaborado, mais pensado e mais espaçado no tempo.

 

ComUM: O que é que havia de diferente em fotografar Ramalho Eanes e Mário Soares?

Alfredo Cunha: Era muito diferente. O Eanes era muito austero, muito formal e o Soares era o oposto, era completamente informal e nada austero. Era um homem que vivia muito bem a vida. O Mário Soares achava que a vida era para ser vivida e desfrutada e o Eanes tinha uma visão mais militar, mais disciplinada. Mas ele também era divertido, não tanto como o Mário Soares, tinha um tipo de humor mais sério.

 

ComUM: Qual o momento mais feliz que já conseguiu retratar enquanto fotojornalista?

Alfredo Cunha: O 25 de Abril, claro! O 25 de Abril é o momento mais feliz da minha carreira de jornalista.

 

ComUM: O que é para si o seu material fotográfico? É muito exigente na sua profissão?

Alfredo Cunha: Sou. O material fotográfico é uma ferramenta de trabalho. Os meios tecnológicos são a minha forma de me expressar, por conseguinte eu tenho de os dominar. Não posso ser dominado por eles.

 

ComUM: Depois de retratados acontecimentos tão importantes, o que sente que lhe falta fazer?

Alfredo Cunha: Eu já acabei a minha profissão de jornalista. Agora estou a fazer projetos editoriais. Já publiquei vários livros, sobre o 25 de Abril, sobre a sociedade, acabei de publicar um livro na Tinta da China sobre retratos. Neste momento, estou a fazer um livro sobre as mulheres. Conseguinte, digamos que eu continuo um fotógrafo, não um fotojornalista, mas na atividade de editorial.

 

ComUM: Em concreto, esse livro é sobre o quê?

Alfredo Cunha: Chama-se “O Ciclo da Vida das Mulheres”, desde que nascem até que morrem, passando pela infância, juventude, idade adulta, velhice, trabalho. Temos lá muitas estudantes, praxes, procissões, prostitutas de striptease. Índia, China, Estados Unidos… É um livro de ambição global, planetária. É feito em 30 e tal países, desde que começou em 1970 e acaba agora.

 

ComUM: Deixou de ser jornalista. Alguma vez pensou deixar a fotografia?

Alfredo Cunha: Não. Nem pensar. Eu sempre fui fotógrafo. Nasci fotógrafo, o meu pai era fotógrafo, o meu avô era fotógrafo. Acho que comecei a fotografar aos sete anos. Estou prestes a fazer cinquenta anos como fotógrafo, não como jornalista. A minha carreira de jornalista começou em 1970 e acabou em 2012. Estive 42 anos no ativo e agora sou apenas fotógrafo. Mas se é verdade que saí do jornalismo, o jornalismo não saiu de mim.

 

ComUM: Sente que ainda aprende coisas novas com a sua atividade?

Alfredo Cunha: Sim, sim. Não só tecnologicamente. A evolução tecnológica no jornalismo e na comunicação é quase diária, mas a forma de abordar e a forma de escrever é sempre nova, é sempre surpreendente. Os novos fotógrafos surpreendem-me com a sua nova visão que têm do mundo. Os novos jornalistas, alguns, pela sua escrita também me surpreendem. Há sempre coisas novas a acontecer.

 

ComUM: Existe alguma matéria que tenciona aprender?

Alfredo Cunha: Eu sou um jornalista de velha escola, quando iniciei não havia cursos de Comunicação. Na altura, a escolaridade mínima para se aceder à profissão era o sétimo ano liceal, o que equivale ao décimo primeiro ano hoje. Teoricamente, eu seria um analfabeto.

 

ComUM: Mas as coisas mudam com o tempo…

Alfredo Cunha: Agora eu gostava de aperfeiçoar o meu inglês, de aprender línguas. Não que tenha grande atração, mas gostava de fazer um curso de multimédia. Gostava de ter um ano sabático em que fosse fazer formação. Sei aquilo que sou capaz de fazer bem, mas também sei aquilo que faço mal e gostava de ter formação outra vez. Gostava de vir para a universidade, por exemplo.

 

ComUM: Para além da educação, considera que as viagens são uma experiência positiva?

Alfredo Cunha: A formação, a educação e a viagem são cultura. A viagem abre-nos os horizontes, abre-nos para outras formas de pensar. Quando a gente se senta no sofá e calça as pantufas… esquece. É sempre estar ativo. Eu tento, pelo menos.

 

ComUM: Perdeu-se alguma coisa na comunicação entre pessoas desde o seu tempo de juventude?

Alfredo Cunha: Perdeu-se e ganhou-se. Perdeu-se rigor, mas ganhou-se mais qualidade, mais formação.