As eleições europeias ocorreram de 23 a 26 de maio. Nos 28 estados-membros – até no Reino Unido – decidiu-se o futuro da UE para os próximos cinco anos. Em Portugal, elegeram-se 21 eurodeputados, mas, a julgar pelas campanhas, escapou-me o ‘euro’ em ‘eurodeputados’. E os discursos após os resultados mostraram isso.  Aliás, os jornais, esta segunda-feira, enchiam-se de “e se fosse nas legislativas?” e do “voto de confiança” que os portugueses deram após o cenário de “crise política”.

Se, em grande parte da Europa, viu-se a extrema-direita a subir – e consequentemente, a morte anunciada do lema da União Europeia, “unida na diversidade” – em Portugal fiquei sem saber em quem os portugueses confiam. Deve ser realmente estranho que 68,63% da população não se identifique com um dos 17 partidos, além dos votos em branco e nulos. Mas de quem é a culpa? Pois, normalmente diz-se que a culpa morre solteira, mas por cá está bem viva. Nestas eleições, a culpa está casada e numa relação poligâmica.

Os políticos, que se encontram surpreendidos, culpam os jornalistas. Os jornalistas culpam os leitores. E aqueles que, sabe-se lá porquê ficaram em casa, culpam os jornalistas e os políticos. Se nenhum deles vier culpar o outro pela abstenção, aparece sempre alguém a dizer: “A culpa, claramente, é dos jovens”. Não fosse Portugal um país demograficamente envelhecido, mesmo que os jovens tenham apelado ao voto através das redes sociais.

Mas – e desculpem-me a insistência – falemos dessa entropia que são os meios de comunicação. Se uns decidiram extrapolar os dados das europeias para outubro, outros trabalharam para divulgar a UE, promoveram debates e explicaram o que era a União Europeia. No entanto, nos debates não se discutiu a política europeia, falou-se do nosso tão belo Portugal. Semanas antes falamos dos professores. E como estas eleições não eram a greve dos camionistas de matérias perigosas, ninguém correu para as bombas de gasolina votar. Apesar da culpa ser de todos, a comunicação social falhou, mais uma vez.

Há bastantes conclusões que se podem tirar quando quase 70% da população não vai às urnas. A primeira é que 70% das pessoas despreza a democracia. 70% dos portugueses não quer saber da UE e 70% dos portugueses esqueceu-se da luta que enfrentou para adquirir o direito ao voto.

Descobri, também, que os portugueses deviam fazer as malas e preparar-se para uma ‘Portsaída’ (sim, o termo Brexit tem muita mais classe), visto que 70% dos portugueses não quer saber da União Europeia.

E a solução para a abstenção não passa por obrigar a votar, porque isso era perder o sentido da palavra democracia. Talvez, e a palavra “talvez” é muito cruel, passe por uma consciencialização. Ontem, votávamos por coisas que são mais nossas do que as pré-campanhas para outubro. Votávamos pelos migrantes. Votávamos pelo Erasmus. Votávamos o tão famoso artigo 13. Votávamos pelas alterações climáticas. Votávamos pelos nossos direitos. Votávamos pela União Europeia. Mas só 31% dos portugueses é que usaram a sua palavra.

A minha voz importa. Não deixo que escolham por mim. O direito ao voto é dado como adquirido, mas a democracia é demasiado frágil para a deixarmos adormecer.