Passados dois anos do lançamento de This Old Dog, o cantor canadiano Mac DeMarco regressa com o mais recente álbum Here Comes the Cowboy. Longe de arriscar uma saída da sua zona de conforto, o artista faz deste novo projeto uma extensão daquilo a que já nos tem habituado a ouvir: relatos de um quotidiano, que se fazem acompanhar de melodias embriagadas, à mistura da febre do amor.
Seguindo o caminho do álbum que lhe antecedeu, Here Comes the Cowboy resume-se a uma compilação de 13 faixas que arrastam consigo uma sonoridade que abraça a melancolia e introspeção da vida de Mac Demarco. No entanto, ao contrário do que acontece em This Old Dog, o novo álbum acabou por resultar numa mistura de ideias dispersas, colocadas em ritmos e melodias aleatórias.
Não é que a estética e a produção “desmazelada” e “preguiçosa” das composições do artista sejam um aspeto negativo, muito pelo contrário. Provavelmente é capaz de ser a característica que mais permite salientar a peculiaridade e distinção de DeMarco dentro da generalidade do panorama musical.
Porém, a combinação entre o teor emocional das letras do álbum e uma produção repetitiva, feita ao sabor do vento, não cria uma boa ligação, na medida em que o sentido das canções fica perdido. Isto não torna Here Comes the Cowboy um mau disco, mas consegue conferir-lhe uma atmosfera aborrecida.
A faixa-título é a música de abertura deste quarto álbum de estúdio do cantor. Torna-se limitado o que se pode dizer relativamente a ela, dado que se baseia na repetição, de princípio a fim, da frase “Here comes the cowboy”. Para além disso, o ritmo e a batida seguem também esta repetição enfadonha, que pouco ou nada acrescentam à faixa, a não ser uma introdução para a entrada no mundo nostálgico de Mac DeMarco.
“Nobody” é a canção que se segue e é nela em que se torna mais clara a história que o álbum pretende contar a quem o ouve. Pode ser encarada como uma balada tristonha, que se faz acompanhar de guitarras abafadas e sintetizadores cabisbaixos. A letra que arrasta consigo é simples mas metafórica, podendo suscitar várias interpretações. Relacionando-a mais com o cantor, provavelmente ele quer revelar-nos a sua vontade de ser um outro alguém, ao mesmo tempo que se consciencializa de que não é possível (“There’s no turning back / To nobody / There’s no second chance / No third degree”). O ritmo sem grandes dinâmicas consegue acompanhar a melancolia da letra, formando-se aqui uma monotonia agradável de se ouvir.
“Finally Alone” e “Little Dogs March” prosseguem com o alinhamento mais introspetivo do álbum, focando aspetos do quotidiano do artista. Ambas construídas com melodias à base de batidas monocórdicas e dedilhados simples, as faixas expõem um Mac DeMarco com necessidade de fugir à rotina, com vontade de se isolar e se tornar em alguém solitário (“Finish your ride, hop off and hide / Now that you’re finally alone”).
Por outro lado, e mais referente a “Little Dogs March”, também é vincada a saudade que a infância é capaz de deixar no cantor (“Hope you had your fun / All those days are over now / March on, little dog”). Em termos comparativos, o que distingue uma canção de outra é o ritmo: a primeira tem um ritmo mais acelerado, de maneira a fazer juz à agitação de querer mudar de vida; a segunda, com um ritmo mais lento, tem o intuito de caracterizar as longas e demoradas vivências da infância.
A tristeza que se manifesta em Here Comes the Cowboy também se transfigura para uma vertente mais amorosa, dando aqui origem à tal febre do amor e aos delírios de Mac DeMarco sobre o assunto. “Preoccupied”, “K”, “Heart by Heart” e “Skyless Moon” são as quatro faixas que permitem entrar numa viagem profunda entre o coração e o sentimentalismo do artista. Melodias calmas, leves e quase anuladas ajudam, a quem ouve, a prestar atenção à mensagem que DeMarco pretende transmitir quando canta.
Dentro deste conjunto, “K” é a que mais se destaca, não só pela lírica mais composta com que é constituída, mas também por só ser tocada ao som do dedilhado de uma guitarra. Isto transforma esta faixa numa espécie de poema cantado/declamado pelo cantor à sua amada. (“K, anytime it feels as though my love has gone away / K, settle down, turn around, and take this song, and let it play”).
“Choo Choo” e “Baby Bye Bye” são as duas faixas que destoam deste registo em tons de cinzento, conferindo ao álbum alguma cor. “Choo Choo” só se destaca pelas batidas mais aceleradas que tem, que serve de lufada de ar fresco no meio de tanta monotonia. Quanto à letra, tudo o que se pode ouvir limita-se a “Choo choo, take a ride with me”.
No que toca a “Baby Bye Bye”, provavelmente é a mais dinâmica do disco, o que torna o fecho do álbum num momento agradável. Iniciada ao som de piano, a faixa vai entre batidas sistemáticas, momentos de dedilhado simples e maracas. O facto de ter segundas vozes já a torna, de certa forma, especial, dado que as restantes são cantadas com uma única voz. Para além disto, a canção renasce numa espécie de Funk, juntamente com gritos de cowboy de fundo cantados com expressividade, depois de um fade-out gradual. Esta “divisão” da faixa faz com que pareça existir uma outra música no final, se bem que depois fica uma compilação engraçada.
É desta maneira que Mac DeMarco se despede de Here Comes the Cowboy, deixando aqueles que o ouvem com alguma sensação de insatisfação por soar tudo ao mesmo. Embora o artista tenha deixado sempre bem claro que a sua música se faça entre o descontraído e pacífico, sem grandes alvoroços, este é um álbum que não deixa vontade de se ouvir até ao fim e, se deixa, é com muito esforço.
Álbum: Here Comes The Cowboy
Artista: Mac DeMarco
Data de lançamento: 10 de maio de 2019
Editora: Mac’s Record Label / Universal Music