Após fazer parte dos grupos Fingertips e Darko, Zé Manel lança o primeiro álbum em nome próprio. Em Off, o artista conta uma história de amor “vivida entre 2012 e 2014”. Contudo, ao invés de dois anos, a narrativa fica resumida aos 12 meses do ano, que dão nome às canções que compõem o trabalho. Este período, apesar de ser descrito com belíssimos instrumentais, deixa muito a desejar na sua lírica.
Além das 12 faixas, o álbum conta com “Intro” e “Ontem Morreu”. A primeira explica o surgimento do relacionamento e o estado atual do mesmo. Zé Manel afirma que aquilo que mais queria era ser o melhor possível para a pessoa com quem estava, para que esta pudesse ser ainda mais feliz e, quem sabe, ajudá-la a crescer/renascer: “Tudo o que sempre quis / Foi ver-te feliz / E fazer parte da tua matriz”, apoderando-se de rimas demasiado forçadas para transmitir a mensagem. Apresenta exemplos daquilo que construíram, os sins e os nãos que, ao longo do tempo, partilharam. Para além disso, mostra-se triste por ver aquela realidade acabar, pedindo “divide mais 1 dia por perto de mim”.
“Ontem Morreu”, a última faixa do projeto, explora a fundo o término do relacionamento. O começar a esquecer de quem está ao nosso lado e o desaparecer das lembranças dos momentos partilhados, tudo por um gesto egoísta. “Lembrei-me de esquecer que me fartei de te perder”. Ao longo da canção, percebe-se que o artista sente algum arrependimento no que se passou, contudo acaba por aceitar a realidade. “Num gesto particular fechei a porta / Envelhecida de um sentimento que não se comporta ao pé de ti”. Esta faixa conta com um instrumental estranhamente reconhecível e, apesar de contar com algumas notas interessantes, a sua letra não varia muito.
“Se o tempo parar e o amor vacilar / Manda-o seguir / Faz as pazes com o que passou / Diz adeus a um ciclo que findou”, este é o conselho que o artista pretende transmitir em “Janeiro”. Procura demonstrar que, apesar dos bons momentos, chegou a um ponto em que não compensa continuar. E, por isso, é preferível seguir em frente, uma vez que o futuro é incerto e nunca se sabe o que se poderá vir a alcançar. Posteriormente, afirma que “foi no 6 de janeiro” que tomou a decisão de assumir o relacionamento. Porém, a estrada que construiu ao lado da outra pessoa, aos poucos e poucos, começou a ruir.
Em “Fevereiro”, Zé Manel afirma que lhe custou ouvir o quanto “desprezas as rezas que cantei por nós”, explicando que já não reconhece com quem está. Esta diferença, o acordar ao lado de quem já não se conhece, torna o artista num “escombro e cinza que resta de um quadro sem voz”. O cantor demonstra, assim, a incapacidade de continuar a tentar, culminando com o verso “eu não te sei amar”. Nesta canção, a voz do artista, de algum modo, parece não encaixar com o instrumental.
“Março” conta com a letra, um pouco corriqueira, de Pedro Chagas Freitas e explora uma realidade comum em vários relacionamentos, o viver com demasiada intensidade o mesmo num curto espaço de tempo. Desde a partilha de lençóis às discussões, “o começo e o fim de uma fogueira”. Para além disso, aborda a temática da distância enquanto um problema real que é tratado como “uma espécie de ilusão”, como um “tapar com a estrada a falta de razão”.
“Abril”, em colaboração com Tozé Brito, corresponde a uma carta aberta ao outro elemento da relação. Explora o momento em que a esperança prevalece e, por isso, existe uma busca de soluções para o que está a acontecer – “Vamos tentar outro espaço / Vamos dar aquele abraço e voar para longe daqui”. O artista questiona abertamente “diz-me quando é que vais saber / Se sou aquele doido que vais para sempre querer”. Apesar de apresentar um instrumental característico, que facilmente seria utilizado numa serenata, e variação de vozes graças à participação de Tozé Brito, a canção é demasiado monocórdica, tornando-se até aborrecida.
Já “Maio”, em parceria com José Cid, aborda as consequências positivas e negativas de amar alguém: a entrega total repleta de fé, sem certeza do que poderá vir a acontecer, podendo culminar numa queda repleta de um “perigo iminente”. Menciona o medo constante de o outro não sentir o mesmo e a mudança repentina que resume o amor a “nada no final desta estrada que caminhamos”. O instrumental aparenta ser uma tentativa falhada de aproximação a grupos como HMB ou The Black Mamba.
“Junho” faz menção a Monsanto, uma freguesia do concelho de Idanha-a-Nova que apresenta uma arquitetura religiosa imensa. Sendo assim, podemos deduzir que Zé Manel procura ajuda divina, a busca por uma esperança para a resolução dos problemas do relacionamento. “Vês que ainda há fé que existe um talvez”. No videoclipe desta faixa, podemos ver o artista a dar uma vista de olhos no Instagram da pessoa amada, reavivando todas as memórias e vontades de ter a pessoa de volta. Poderíamos dizer que o antigo ditado “longe da vista, longe do coração” já não é assim tão fácil de aplicar quanto parece.
Já em “Julho”, o artista afirma que a esperança morreu, algo que o leva a “decidir mudar o rumo desta história”. Esta canção conta com a participação de Ella Nor, cantora e atriz portuguesa, vencedora do Festival RTP da Canção 2015. Mais uma vez, apresenta um discurso demasiado quotidiano e rimas forçadas, como desistir, carpir, resistir, prosseguir, etc.
“Agosto”, com música e letra de Luísa Sobral, conta a necessidade constante de viver aquilo que nos completa com a maior intensidade possível. Esta pressa faz com que, em apenas oito meses, o outrora vivido já não exista – “Quando a chuva cai, mas ninguém vê / Que não, não é verão / Quando nada aquece o coração que foi / Mas já não é”. No entanto, o instrumental não transparece uma tristeza total com o término, demonstra uma certa aceitação e a busca por aquilo que de bom pode vir desse fim. O videoclipe também reflete esta perceção, um vídeo repleto de combinações de cores e expressões faciais de admiração da vida.
Com a participação de Surma, “Setembro” explora o melhor modo de superar a tristeza vivida no fim de um relacionamento. “E é tão mais fácil não querer saber / de ti, de mim, de nós do que já passou”. No início, faz-se acompanhar de um instrumental soturno, muito mal concebido, que ao invés de transmitir melancolia transmite apenas estranheza. De seguida, o cenário melhora com a presença de um piano. No entanto, a voz do artista parece não se enquadrar novamente.
“Outubro é mau / Outubro é frio, amor” afirmam Zé Manel e Sandra Pereira, vencedora da edição de 2010 do Ídolos. Demonstram que o tempo seco e a queda das folhas de primavera condicionam o modo como o luto amoroso é vivido. Mais um mês, mais uma faixa que se assemelha a todas as outras. Cada mês deveria corresponder a um tema ligeiramente diferente, no entanto, aparenta falar sempre sobre o mesmo.
Apesar de vivermos numa era cada vez mais tecnológica, em “Novembro” o artista dá força à expressão “dá tempo ao tempo” – “Novembro / Do quase que me lembro / Ficaste lá para trás”. Zé Manel admite que a passagem do tempo nos permite ter uma visão mais ampla da vida e perceber que os prazeres imediatos cumprem o seu propósito apenas por leves momentos, que a falta de amor próprio implica uma vida de aparências e que para se viver um verdadeiro amor há que abandonar essas realidades.
“Dezembro”, com Leigh Nash marca a dor e saudade que fica quando nos lembramos dos momentos partilhados com o ser amado. Esta poderia ser considerada um novo clássico de faixas de amor de Natal, ao tratar, como todas as outras, de um coração partido, cuja única cura seria estar junto da pessoa amada. “Para mim não é natal / Se não estás aqui”.
Apesar de termos de reconhecer o mérito do artista pela quantidade de parcerias e bons instrumentais, o álbum surge como algo demasiado confuso. Muitas das vezes, as letras são demasiado simplistas pela linguagem demasiado quotidiana e tentativas forçadas de rimas. Para além disso, são um pouco incongruentes, misturando timelines distintas de um modo incompreensível.