Este domingo o santuário bracarense foi considerado Património Cultural Mundial da UNESCO. O funicular conta com 136 anos de história.

O Santuário do Bom Jesus de Braga é um dos monumentos mais reconhecidos da cidade de Braga. Quer seja pela fé cristã ou pela vista sobre a cidade, muitos são quem o visita. O caminho até lá cima nem sempre é fácil. E se uns escolhem o escadório para apreciar a beleza do santuário, outros sentem-se atraídos pelo mais velho funicular em serviço do mundo.

São 13h55, o ascensor do Bom Jesus prepara-se para mais uma subida. Construído sobre os flancos da montanha, onde a sofrida caminhada da paixão de Cristo é representada. Dentro da carruagem predomina o idioma espanhol e as famosas selfies.Ao longe ecoa “tal qual o corpo da cidade / que manhã cedo ensaia a dança / de quem, por força da vontade, / de trabalhar nunca se cansa”, versos que ditam o fado de quem lá trabalha.

Movido por um sistema de contrapeso de água, o ascensor liga, há mais de um século, a parte baixa da montanha ao ponto mais alto, junto à estátua equestre de São Longuinho. Para Varico Pereira, vice-presidente da Confraria do Bom Jesus, “nada mudou a não ser as pessoas”. Contudo, escolher o elevador para subir a encosta traz consigo as mesmas experiências desde a sua inauguração, visto que “mantem as mesmas características”, acrescenta o vice-presidente.

Muitas pessoas e histórias passam pelos bancos de madeira do ascensor. Desde quem faz da arte o ganha pão às pessoas que experienciam momentos singulares, num lugar, para muitos, banal. Adriano Lopes Ferreira começou a mover o ascensor em 1978, apesar de uma pausa devido a condições económicas, regressou em 2003. “Antigamente, a máquina fotográfica era uma garrafa de vinho às costas”, recorda o funcionário de 59 anos.

Se para uns o que fica são as fotografias ou a fé cristã que devotam no santuário, outros guardam memórias mais pessoais. Raquel Silva, aluna da Universidade do Minho, recorda a viagem que fez no seu ano de caloira. “Durante muito tempo, o Bom Jesus de Braga foi o destino de eleição da minha família para desfrutar o verão”, conta a aluna. A jovem descreve que a viagem “tinha um sabor especial”. “Voltar a fazer esse percurso de elevador, mas desta vez sozinha, foi um recuar ao passado e um impulso para todo o futuro que me esperava em Braga”, recorda a recém-licenciada.

Os carris e a água são barulhos que acompanham a viagem pelo funicular que nem todos percebem como se move. A primeira viagem no funicular, a 25 de março de 1882, teve a sua peculiaridade. “O empresário e o motorista tiveram de fazer a viagem para mostrar às pessoas que era seguro”, observa Varico Pereira. E se para Renata Serafim, bracarense, o percurso é “uma experiência única, apesar de inicialmente um bocado assustadora”, as memórias de infância fazem Raquel Silva responder sem pensar: “só podia ser magia que o fazia mover”.

É no ano de 1880 que se começa a fazer história na encosta do Bom Jesus. Eduardo Pires de Oliveira, historiador de 68 anos, conta a vida de Manuel Joaquim Gomes, a mente por detrás do atual museu vivo. A ideia para o elevador surge durante uma viagem à Suíça, devido a problemas de saúde. “Ele sabia que ia ser espetacular. Ele sabia que ia chamar a atenção”, realça o historiador.

O Santuário do Bom Jesus candidatou-se a Património da Humanidade da UNESCO em 2014 e a Património Mundial em 2018. “Foi o primeiro funicular construído na Península Ibérica, permanecendo ainda hoje como o mais antigo em serviço no mundo a utilizar o sistema de contrapesos de água. Da autoria do suíço Nikolaus Riggenbach, foi realizado sob supervisão do engenheiro português Raul Mesnier de Ponsard”, lê-se na última candidatura.

Foi neste domingo que o santuário se consagrou Património Cultural Mundial da UNESCO. E, segundo o Presidente da República, o Bom Jesus do Monte é “um dos ícones do Portugal católico, o Bom Jesus é também um ex-libris da cidade de Braga, cidade milenar, anterior à nacionalidade, cidade romana, portuguesa e universal”.

O percurso de cerca de 274 metros acompanha o verde da encosta. Segundo o vice-presidente da Confraria do Bom Jesus “os planos para o futuro do elevador são os mesmos de há 136 anos”. No entanto, Varico Pereira confessa que a Confraria deseja “que, durante o ano todo, haja mais atividade no elevador, no sentido em que as pessoas deixem de trazer o carro para o Bom Jesus, possam estacionar o carro lá em baixo e fazer a subida no elevador”.

Com 136 anos de história, o funicular faz 18 viagens por dia. De meia em meia hora as duas carruagens cruzam-se pelo caminho. Quem desce traz novas histórias, os que sobem preparam-se para escrever outras.

Texto: Ana Patrícia Silva, Cátia Barros e Mariana Oliveira