O pequeno livro de 41 páginas é dedicado “a todo e qualquer Bracarense que tenha o desejo de conhecer, ainda que mui resumidamente, a História da sua (e nossa) cidade de Braga”. Apesar de ser uma obra de 1985, João de Braga aborda a centralização, a eutanásia e dúvidas religiosas, com o auxílio de constantes comparações e subtis ironias.

João Peixoto de Almeida, também conhecido por João de Braga, conta-nos a novela da família dos Românticos. Estes, “sendo vulgar o uso de certos apelidos como os Silvas e os Pereiras” davam desde logo nas vistas. Além disso, levantava uma busca por justificações de tal diferença: “nobreza ancestral”, “descendentes de antigos Pretores Romanos” ou uma “mera fantasia”?

De qualquer forma, a resposta baseia-se numa mera união teórica entre Brácaros e Romanos que teria resultado no nascimento de Valério Calpetano. Esta história passava de boca em boca e era narrada pelos componentes da família. No entanto, as incertezas em torno do acontecimento culminavam em tal confusão e descrédito que Chico Malmequer, ““diplomado” em mexericos”, aproveitava para zombar com a família. Dizia: “Olhem que estes Românticos detêm o império da mentira, inventam raízes e arranjam a coifa protetora. Depois falam de documentos que, eles próprios, suprimem. São mesmo Caliptranos… indocumentados”.

A narrativa era contada tendo por base um “pseudo-relato, escrito num pergaminho, por sua vez desaparecido”. Deste modo, a história de Portugal e, especificamente, de Braga, também se encontrava turva, baseada apenas em testemunhos contraditórios. Uma realidade que até aos dias de hoje se verifica.

De acordo com o autor, “Braga” significa “o muro que guarnece uma fortaleza ou mesmo até a própria fortaleza, assim como, no plural, tem o significado correspondente a calças curtas, ousando-se até dizer: “não se apanham trutas com bragas enxutas”. Uma cidade protegida pelo Monte de Castro e pelo Montariol, a norte; pelos Castros de Gualtar, pela Consolação e pela Falperra, a leste; pelo Castro de Ferreiros e pelo Monte de Custódias, a sul; e a poente pelo Castro das Caldas. Regida pelo Cristianismo. No entanto, sem certidão de nascimento.

Apesar de Braga possuir um conjunto imenso de símbolos emblemáticos, João de Braga foca-se na Fonte do Ídolo. Esta serve, inclusive, de imagem de capa. O monumento, era outrora tido como templo dedicado a Tongenabriago, Deus das Águas. Servia ainda de panorama para os demais: “se encaminhavam para a Fonte, com a finalidade de ver passar as mulheres e raparigas que iam desfilando”. Fonte onde Valério Calpetano (Romano) e Márcia (Brácara) se avistaram pela primeira vez.

A descrição imensa e imensamente carinhosa de Márcia dá logo a entender o rumo da história: de atração total. “Suprema beleza (!): um rosto oval, o traçado do nariz, inserido como única saliência, nascia exatamente, na devida proporção, sobre a boca rosada e de recorte harmonioso, tudo formando conjunto de extraordinária beleza, acrescendo ainda, ter por suporte um corpo de magníficas e atraentes proporções.” No entanto, é uma conquista demorada e afetada pelas impiedades da vida.

Bracara Augusta (A novela que emergiu dos tempos) corresponde a uma obra desafiadora. Primeiramente, pela utilização de um vocabulário rebuscado e pelas constantes referências desconhecidas ao público em geral. Seguidamente, porque desafia bracarenses a não só refletirem sobre a história, mas também sobre a forma como esta é fundamentada e documentada.