Fear Inoculum é o mais recente álbum da banda norte-americana de Post Metal. Divididos entre a expressão progressiva e alternativa do seu som, os Tool são dos grupos mais importantes e populares do seu meio.
Nem os 13 anos que separam este trabalho do seu predecessor foram motivo para que a banda fosse esquecida pelos fãs ou pelos críticos. O alarido e expectativa criados à volta deste novo projeto são o resultado de uma carreira marcante e da influência e sucesso de uma discografia inesquecível, especialmente pelas obras primas Lateralus e Aenima.
A complexidade da construção dos ambientes imersivos e hipnóticos assentes em time signatures invulgares, sujeitas a constantes mudanças, já não são novidade para ninguém. Aliás, a crítica maior que se pode fazer a Fear Inoculum é o facto de, 13 anos depois, não haver grandes novidades. Mas quão errado ou condenável pode isso ser quando o trabalho apresentado anteriormente é tão bom?
Certamente, o conceito musical e a identidade que a banda construiu de si não são tão inovadores e assombrosos como antes. E pode-se dizer com alguma confiança que este álbum não é tão bom no que se propõe a ser como foram os projetos mencionados em cima. De qualquer modo, isso não pode ser motivo para esquecer as virtudes e qualidades do mesmo.
Fear Inoculum não é o projeto mais intenso e bem conseguido dos Tool. Mas é provavelmente o mais hipnótico. São sete músicas que quase podiam ser uma. Com cerca de 80 minutos de duração, dá a sensação que não é maior apenas para não fugir à capacidade máxima normal de um CD.
Numa viagem longa, as canções parecem cinematográficas, muitas vezes psicadélicas, e estranhamente desenvolvidas sobre as suas bases rítmicas. As influências em King Crimson, Led Zeppelin, e Swans ou Godspeed You Black Emperor são curiosamente notáveis, mas não retiram unicidade ao som do grupo.
As camadas por cima de camadas de riffs esquisitos, precisos e detalhados, envolventes e densos, destacam os vocais mais comedidos e delicados de Maynard. Neste LP, o cantor sente-se menos enérgico e vibrante em prol de uma abordagem mais emotiva a cada canção.
Em alguns momentos, é justo dizer que o disco soa cansativo e até ligeiramente aborrecido. Alguns temas parecem não ser bem explorados o suficiente em relação ao quanto são desenvolvidos.
A existência de alguns interlúdios é apreciável, mas nem sempre estes são aproveitados da melhor maneira. “Chocolate Chip Trip” parece pouco venturosa, quase cliché e excessivamente tecnicista, acabando por ser pouco mais que um solo enorme de bateria, encaixado num ambiente eletrónico pouco sofisticado.
Em muitas das vezes, para chegarmos aos momentos que realmente valem a pena, temos de esperar demasiado em entretantos não tão interessantes e marcantes. Os mesmos ambientes, apresentados com sonoridades similares, genericamente falando, sem grandes desenvolturas nem desvios além do virtuosismo e fineza dos músicos, não são sempre suficientes. Não deixa nunca de, no entanto, haver algo para apreciar em cada um dos 80 minutos do projeto.
O final do álbum é absolutamente fantástico, com a tremenda “7empest”. Frenética e mais agressiva, o sete no título é indício claro de que este número é a temática central do álbum. Que, curiosamente, ou não, tem 7 faixas. Aliado à própria artwork que lhe é associada (que não é, de todo, digna de uma banda como os Tool) vai de encontro ao caráter hipnótico, alucinado e psicadélico que é explorado em Fear Inoculum.
Momentos de puro êxtase como o solo de guitarra que arranha o coração dos ouvintes, numa distorção agressiva que só ganha mais intensidade com a velocidade e força da bateria e do baixo que a acompanha, são aquilo por que vale a pena aguardar. E saber apreciar o processo de construção, que torna esses momentos tão impactantes quando efetivamente surgem, é imperial para se gostar do projeto na sua globalidade.
A música mais atmosférica é “Culling Voices”, mas dá a clara sensação de que merecia tomar um caminho diferente que nos libertasse um pouco do que apregoa e transmite, até para que isso tivesse um sabor diferente quando regressasse. Um exemplo disto é o início do álbum, com a faixa homónima, que se apresenta progressivamente e com calma, mas que, quando finalmente se sente completa, faz valer a pena e dá sentido ao processo gradual de evolução que pudemos apreciar antes.
Claramente, tem as suas falhas e pode até não estar ao nível das expectativas que uma carreira tão marcante relembrada ao longo de 13 anos de silêncio naturalmente criam nos fãs da banda. No entanto, este não deixa de ser um álbum excelente, incrivelmente executado e ao alcance de muito poucos grupos.
Em defesa dos Tool, as maiores críticas que lhes posso apontar são difíceis de aceitar como justas. Porque os sucessos e virtudes do passado de um artista não deveriam nunca servir para desvalorizar outros trabalhos do mesmo.
Além disso, excetuando os contratos manhosos que sujam um pouco a indústria da música e que obrigam os artistas a produzirem x em tempo y, nunca a arte deve ter prazos, e os 13 anos daquelas pessoas não são motivo para criticar os defeitos do projeto que apresentam. Porque as pessoas têm tendência a esquecer que os artistas são muito mais do que só aquilo que possamos conhecer deles.
Este é um álbum excelente, complexo e envolvente, assombrado pelos seus intérpretes, que se torna por vezes aborrecido. Uma produção pouco ambiciosa e uma insistência e “obsessão” percetíveis e aceitáveis, em momentos que talvez não fossem merecedores dessa fé cega que lhes é depositada, não contribuem para uma experiência melhor para o ouvinte. Porque, apesar de não deixar de ser uma escolha artística o modo como se transformam essas ideias tão lentamente, por vezes dá a ideia de que elas não são boas o suficiente para se sustentarem a si próprias apenas pela sua essência mais primordial.
Fear Inoculum é claramente uma mais valia para a coleção de quem quer que seja, ainda que não vá marcar a história da música. Convém apenas relembrar que isso não se pode exigir de banda nenhuma por motivo algum.
Álbum: Fear Inoculum
Artista: Tool
Data de Lançamento: 30 de agosto de 2019
Editora: Volcano e RCA