Num conjunto de oito livros com título de publicação da mortalidade, da autoria de Valter Hugo Mãe, deixamo-nos levar por um artista que, numa compilação de poemas, nos transporta para algo que não vivemos. Conhecemos Valter pelos seus romances, tendo o segundo – remorso de baltazar serapião – ganho o Prémio Literário Saramago. Antes disso, havia publicado também muitos livros de poesia.

Num único volume, publicado em março de 2018, o autor reúne alguns dos seus poemas, onde agrupa livros sem referir a sua primeira publicação. Um livro cru sem introdução ou alguma anotação para guiar o leitor. Alguns poemas sofreram alterações. Contudo, as quase 200 páginas parecem esconder uma versão do sujeito poético em constante mudança, como se passasse por um processo de metamorfose.

Na terceira parte do segundo livro, pornografia erudita, encontramos um sujeito poético vestido de inseguranças e medos. “brincávamos a cair nos braços / um do outro como faziam as atrizes / nos filmes com o marlon brando e / suspirávamos sem saber habituar o / coração à dor / (….) a minha mãe avisava valter tem cuidado / não briques assim vais partir uma perna / vais partir a cabeça vais partir o coração / estava certa foi tudo verdade”, lê-se.

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Ao longo dos diferentes livros encontramos as marcas estilistas do autor, muito semelhantes às de José Saramago, onde o uso de pontuação e letras maiúsculas é escasso. Talvez por ser uma junção de livros, a fluidez de leitura não é precisa ou obrigatória. Quem espera ler poemas que se completam entre si não procura este livro.

No poema john balance está morto, o leitor encontra um certo encanto nas palavras de Valter Hugo Mãe. Poucas páginas depois, dentro do mesmo livro – terceiro livro, livro das maldições – o autor escreve um poema intitulado o cu de jean genet com dedicatória “para jean-paul satre”. O poema contem apenas um verso: “genet demorava entre as trincheiras”.

Os poemas de Valter Hugo Mãe, em especial os que encontramos mortalizados nesta publicação, têm algo de diferente dos seus romances. Deixam-nos envolver na sua escrita, relembrando a urgência de amar, mesmo com os danos que a ação acarreta. A publicação da mortalidade relembra, então, que quem escreve poesia imortaliza a alma, e quem a lê deixa-se tocar.