Rashid manteve os versos políticos a que nos habituou no primeiro álbum de estúdio, Hora de Acordar. Com temáticas que põem em cheque vários aspetos da sociedade brasileira, lança Tão Real.

O sétimo disco a solo na carreira do rapper paulista chega-nos num formato diferente. Tão Real está divido em duas temporadas, como se fosse uma série. A primeira temporada, lançada em setembro, foi recebida com curiosidade pelos ouvintes, pois foi apresentada em conjunto com dois episódios de um documentário e um site oficial. A experiência proposta pelo álbum continua a 11 de outubro, com a estreia de dois episódios inéditos do documentário.

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A inspiração é clara: o quotidiano da cidade de São Paulo. Trata-se de um projeto que vem das ruas para as ruas. Mas nem por isso deixou de haver espaço para sonoridades para além do clássico Boom Bap dos anos 90.

E é essa ideia que Rashid reforça logo na primeira faixa. “Conceito (de Rua)” começa com a introdução de um jornalista a perguntar sobre o conceito do novo álbum, sendo que o rapper responde que o conceito é de “rua”. Logo a seguir, começa a rimar sobre um instrumental bem Underground, onde questiona se o ouvinte é realmente quem ele diz ser quando ninguém está a ver.

Todo O Dia” é uma mistura bem conseguida de ritmos entre Rap e Reggae e conta com a participação do cantor paulista Dada Yute. A faixa tem uma abordagem mais política, onde o rapper toca nas feridas da sociedade ao expor, por exemplo, casos de racismo. Nos versos, “Faz piada com Mbappé / E depois se desculpa, do alto do seu privilégio, que ele não aceita ter”, critica o youtuber Júlio Cocielo por proferir comentários racistas em relação ao jogador francês Mbappé, durante o Campeonato do Mundo de 2018.

Mais para a frente aparece “Tão Real”, uma reflexão mais pessoal do rapper sobre a sua vida. A letra fala um pouco dos seus problemas como ser humano, para além de músico, como canta no início: “Quando a cortina fecha, quando o show acaba / E a solidão a poucos palmos, eu tento não temer mal algum / Procuro em palavras a fé de um salmo / Respiro calmo, atravessando o inferno e ‘cês pedindo álbum.

Finalizando aquela que seria a primeira temporada, “Superpoder” é feito em colaboração com a cantora carioca Lellê. É obra para se ouvir numa segunda de manhã, quando se quer acordar esperançoso e aproveitar a simplicidade da vida.

A segunda temporada inicia com “SSNS“, um Trap que possui um tom até meio sombrio. Com uma maior repercussão do Rap, Rashid levanta questões relacionadas com o dinheiro. Fala sobre a dificuldade de vencer na vida, o pouco dinheiro pago aos trabalhadores e as mentiras vendidas pelos canais de comunicação, e como se aproveitam da música Rap.

O disco também tem espaço para o Pop e algo mais romântico. “Sobrou Silêncio”, colaboração com a cantora Duda Beat, fala sobre a frustração recorrente de um relacionamento.

O disco termina com “Um Mundo de Cada Vez”. É um R&B de belo porte, com Drik Barbosa na rima e Wesley Camilo no refrão. A música aborda algumas questões existenciais do ser humano. Rashid, mais uma vez, canta sobre as diferenças da nossa vida em: “Quase um roteiro de Kubrick / Mudar um mundo sem desarrumar o outro / Isso é um cubo de Rubik, hein?”. Tal como num cubo de Rubik, assim deve ser feito com o mundo: tentar montar um lado sem desarrumar o outro, salientando a importância da vida de cada um.

Ao ouvir todo o repertório, posso dizer que Rashid, mais uma vez, fez algo diferente. A ordem das faixas, manteve um clima de surpresa ao longo do álbum, já que cada uma é diferente da anterior, seja na batida ou no assunto. Mostrou ainda liberdade criativa no formato, ao mostrar-se envolvido com a cultura Pop e com a tecnologia. Havia uma única regra em relação ao conceito do disco: “ser da Rua”.