Tristeza e Alegria na Vida das Girafas: o mundo pelos olhos de uma criança

Depois do sucesso nos teatros, Tristeza e Alegria na Vida das Girafas chega aos grandes ecrãs com a realização do já nacionalmente reconhecido Tiago Guedes. O trabalho português conta com um elenco e banda sonora de luxo, ao mesmo tempo que trata a aventura de uma menina e o seu urso de peluche.

A longa-metragem acompanha a vida de uma menina de dez anos que vive com o pai, desempregado e com dificuldades financeiras. A protagonista conta também com a companhia de um urso de peluche, Judy Garland, que se revela o seu único amigo e, de certa forma, o seu alter-ego.

O corte da TV cabo e a impossibilidade de “visualizar o Discovery Channel” revela-se o ínicio da aventura para Girafa (assim era apelidada pela falecida mãe) e Judy. Ambos procuram o primeiro-ministro, já que é o único que pode decretar uma lei que autorize o roubo de 53 507€, o necessário para a rapariga poder comprar o canal até ao fim da sua vida.

O trabalho do elenco de Tristeza e Alegria na Vida das Girafas é, certamente, um dos pontos de destaque. A protagonista, Maria Abreu, de 11 anos, é extremamente convincente a representar uma menina aparentemente impenetrável pelas emoções e que dedica toda a sua vida a estudar o dicionário. Tonan Quito, por sua vez, interpreta o urso Judy Garland. Com um texto que muito facilmente poderia cair no ridículo nas mãos erradas, a dupla estabelece uma fantástica química, o que cria no público empatia pelo peluche.

É de destacar, também, a última cena de Judy, que sublinha a versatilidade do ator. Depois de passar todo o filme num registo cómico, Tonan consegue criar um sentimento de melancolia no espectador. Por último, Tiago Rodrigues maravilha com o monólogo em que o seu personagem – o pai de Girafa- simula uma conversa entre ele próprio e a sua falecida esposa, a pedido da menina.

Em adição, é de salientar ainda a excelente banda sonora, da autoria do aclamado vocalista dos Ornatos Violeta, Manel Cruz. A escolha das músicas é feita de forma cuidada, para embalar os momentos mais emotivos da longa-metragem. No entanto, penso que a seleção foi curta, deixando a desejar mais da voz do vocalista.

A gestão do trabalho de câmara é outro ponto interessante. São intercaladas na narrativa filmagens do telemóvel de Girafa, que contribuem para a representação do seu ponto de vista.

Tristeza e Alegria na Vida das Girafas trata, de forma belíssima, temas fortes, como o processo de crescimento humano, a dor da perda e o luto. Há, contudo, também a passagem por temáticas como a economia e a política das estruturas portuguesas, através dos olhos de uma criança que não entende os adultos.

A complexidade dos assuntos é contraposta, no entanto, pela aparição de personagens aleatórias que contribuem para o desenvolvimento da protagonista. Estas últimas podem, para muita gente, ser o ponto fatal do filme, mas acredito serem necessárias para a construção do estilo próprio, característico do mesmo.