João Vieira é DJ Kitten pelos X-Wife e conhecido também pelo seu projeto mais pessoal, White Haus, com o qual regressa com um novo álbum, Body Electric. São várias as influências que se espalham ao longo das 12 músicas aqui presenteadas: Pop Eletrónica, Acid House e Funk são algumas delas. Mas também vemos certos elementos de bandas como Talking Heads e o No Wave de Sexual Harassment. Mas será que isto faz um bom álbum? Resposta curta: não.

Resposta longa? O álbum começa, decentemente, com “Stop”. Os synths iniciais relembram Gost e Pertubator, com o carismático synthwave, a contrabalançarem um no outro. No entanto, só duram seis segundos e é aqui que entra a voz de João Vieira – um dos aspetos que menos gostei do álbum inteiro. Os vocais finos, inicialmente, não foram um problema, mas ao longo do álbum começaram a cansar.

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Enquanto canta sobre sentimentos de liberdade, de que ninguém o pode parar de se divertir, somos presenteados por um instrumental “de bater o pézinho”. Um baixo viciante, “electrifyingsynths e uns claps aqui e ali. A “Stop” não me parecia muito má, a primeira vez que ouvi o álbum. Mas depois, na segunda e terceira vez, já não podia mais com ela – ou com qualquer outra faixa, aliás.

Bodies”, a terceira música, conta uma sátira à “cultura do corpo” e a obsessão pela imagem que as pessoas têm na atualidade. Segundo João Vieira, é “(…) algo que nos persegue no nosso dia a dia quando fazemos zapping na tv, quando circulamos pelas redes sociais (…)”. A letra fala, de forma inclusiva, sobre corpos de todos os feitios e tamanhos.

Em termos instrumentais, o baixo fica a uma nota de virar a bassline de “Another One Bites the Dust”, dos Queen. De facto, é cativante – não que seja difícil, quando se assemelha tanto a uma das músicas mais catchy da história da música. A eletrónica e o ritmo clássico dos anos 80 e 90 estão aqui afincados, num estilo à la Madonna. Há ainda elementos de voz mais spokenword e menos cantada, com refrões a relembrar David Bowie, se a voz do Bowie fosse irritante.

Chegamos à quarta faixa, “My Lips Are Sealed”, single de apresentação do disco. Aqui vemos mais elementos do Acid House/Techno, que eu apreciei bastante. Influências da música e voz sedutora de Prince estão, similarmente, presentes. Aliás, os temas de sensualidade, intimidade, amor, sexo, prazer vêem-se espelhados, de certa forma, em cada faixa.

A quinta faixa, “Step Right Up” remete para um instrumental de Hip-Hop do fim dos anos 70, mais funky e leve. Contudo, sempre que tento ouvir melhor o som, os vocais estragam-me a concentração. É difícil conseguires reparar nos pequenos detalhes instrumentais que White Haus mete nas suas músicas quando há uma voz esguia a distrair-te.

Save a Little Time For Me” é o ponto mais alto de Body Electric, não pelos vocais – não é de admirar – mas pelo instrumental. Tem os aspetos mais lo-fi do álbum inteiro e aquela pontinha de Jazz no fim concede um belo fecho à faixa, que acaba com um fade-out – a forma mais preguiçosa de finalizar qualquer música.

Doctor’s Orders” é a faixa mais “experimental” (termo posto de forma leve) do projeto inteiro. Os trompetes, quase como atirados ao calhas, dão uma bela sensação de Free Jazz à mistura. Duas vozes falam entre si, presumindo que sejam as duas de João Vieira. Uma mais franzina e outra mais crescida. A primeira discursa sobre como os dias costumavam ser divertidos, emocionantes, mas que agora são apenas… uma “merda”. A segunda concorda e diz que é apenas parte de crescer. Segundo a minha interpretação, temos aqui o João Vieira, adulto, a falar com a versão de criança dele. Face a este problema, o adulto diz ao miúdo, posto de uma forma popular, “é a vida…” e que se quisesse mudar as coisas “então, boa sorte…”.

Body Electric estava, minimamente, bem encaminhado, depois destas últimas duas faixas. Mas depois vem a “Sugar Daddy” e voltamos para a mediocridade, aborrecimento e vocais que só me deram vontade de parar de ouvir o projeto. É, de longe, a pior faixa do álbum inteiro. O refrão é tanto irritante como aborrecido. A forma como ele força certas vozes só aumentaram o meu nível de “revirar os olhos”.

Table For One” seria uma boa faixa se João Vieira não cantasse por cima. João Vieira está bastante familiarizado com o Techno, já que também é DJ, e isso vê-se nesta faixa. A melodia é excecionalmente atrativa e dançável. Foi a primeira vez que abanei a cabeça a ouvir uma música de Body Electric. As curtas e rápidas batidas que iniciam a música, que são posteriormente acompanhadas por um synth hipnotizante, fazem desta faixa uma das melhores… até João abrir a boca.

O mesmo dito anteriormente aplica-se a “Tell Nobody”. Mais uma boa faixa eletrónica arruinada pela voz angustiante. Apenas uma faixa instrumental ajudaria este álbum tremendamente. Ao menos tinha alguma música decente para ouvir, ao invés de ficar à espera que a atual acabasse para passar para a próxima – isto repetido 12 vezes.

Bem, o que eu vos posso dizer com este projeto de White Haus é que sons “catchy” não tornam o álbum tolerável. Uma música? Talvez. 12 delas? Nunca. White Haus é aquele artista que tu vês ao calhas quando estás num festival. Ouves duas músicas e vais buscar um fino, vais para outro sítio.

Mas nem tudo é mau. Os vocais são irritantes, os refrãos entediantes e maçudos e as letras deixam a desejar por algo com mais material e consistência. Mas dou cinco estrelas à produção. Consegue-se distinguir bem cada som particular nos instrumentais. E digo outra vez que o álbum seria dez vezes melhor se fosse só 100% instrumentos e 0% vocais. A única coisa que salva este projeto, minimamente, é isso mesmo.

Body Electric pode ter o intuito de “eletrificar o vosso corpo” com batidas rápidas, mas, com esta eletricidade, nem uma luz de presença acende. Porque é o que é este álbum é, uma mera presença de fundo enquanto fazes outra coisa.