Cerca de 30% dos estudantes desistem da licenciatura e só metade dos alunos é que terminam nos anos estipulados.
As Salas 24 estão cheias e a máquina de café avariada. Janeiro vai a meio e não há dúvida que a primeira época de exames chegou para os alunos da Universidade do Minho. A agitação nas salas de estudo é muita entre sebentas e rabiscos em folhas. Cerca de 29% dos alunos abandona o Ensino Superior, segundo um estudo da Direcção-Geral de Estatística da Educação e Ciência.
Mariana Barbosa Gomes encontra-se nesse grupo. É estudante de Direito, mas a matrícula está congelada. “Antes de Direito estive em Ciência Política”, lembra a jovem. Nenhum destes cursos ofereceu a Mariana o sinal verde para continuar.
“Vi pessoas verdadeiramente motivadas e com a sua própria luz refletida ao fundo do túnel. Eu não tinha luz nenhuma. Senti que andava lá a procrastinar e que aquele não era o meu propósito”, recorda a aluna em relação ao seu primeiro ano em Direito. Durante esse ano Mariana não completou os créditos suficientes para efetuar a inscrição no segundo ano do curso.
O curso de Direito é o 17º curso da academia minhota com menos desistências (11,9%), segundo os dados revelados pelo Ministério da Educação e da Ciência no portal infocursos. Num total de 58 licenciaturas e mestrados integrados, Medicina é o curso com menor percentagem de alunos que desistiram após um ano (3,3%).
É no início da vida adulta que milhares de jovens precisam de decidir que curso querem. No ano letivo de 2019/2020 cerca de 46 mil alunos entraram na universidade. João Martins é um deles. Deixou o conforto da casa dos pais em Viana do Castelo e alojou-se em Braga para seguir um sonho. “Nunca tive dúvidas do que queria fazer”, admite o estudante do primeiro ano de Ciências da Computação na academia minhota.
“Chegar à universidade foi perceber que maior parte dos meus colegas não sabiam o que queriam. Muitos acabam por gostar do curso, mas é mais um acaso”, relembra o aluno citando alguns colegas de curso.
“Senti-me frustrada por não obter os resultados que esperavam de mim”
Mariana, apesar de não ser colega de turma de João, é uma dessas alunas. A incerteza do que queria fazer começou no seu nono ano de escolaridade. Frequentou, por pressão social, o curso de Ciências e Tecnologia até ao último período do 11º ano. “Informei-me se era possível mudar para Línguas e Humanidades e a resposta foi positiva, mas tinha um risco”. Todas disciplinas que Mariana escolheu seriam feitas como aluna externa, “a nota que tivesse no exame era a nota final”.
“Foi um risco que decidi correr. Senti-me frustrada por não obter os resultados que esperavam de mim”, realça a jovem. Apesar de tudo, conseguiu completar o secundário com sucesso. Porém, o “pesadelo” estava prestes a começar. “Sempre adorei defender os meus ideais e, dentro das letras, era o único curso que os meus pais achavam aceitável”. Encontrou em Direito uma opção que “juntava o útil ao agradável”.
O agradável depressa começou a trazer um travo amargo no dia-a-dia da ex-aluna. “Não gostei das pessoas, não gostei do ambiente. Não me consegui identificar com tudo o que via, mas pior: detestei tudo o que era falado em aula”.
Acredita não estar sozinha. Como ela muitos estudantes decidem abandonar a universidade. É o caso de Bruna Silva, atualmente tem 23 anos e estuda Artes Visuais no Instituto Politécnico do Cávado e do Ave (IPCA), mas há três anos era uma das alunas que deixou o curso de Filosofia na UMinho.
Filosofia ocupa o 11º lugar na lista de cursos com mais desistências durante o primeiro ano de curso, com cerca de um quarto dos alunos a desistirem.
Bruna ambicionava desde nova seguir Design Gráfico, mas já tinha chumbado duas vezes no exame nacional de História das Artes. “Acabei por usar o exame de Português e escolher alguns cursos ao calhas”. O destino levou-a a Filosofia e, apesar de “ciente que não era aquilo que queria”, decidiu ficar durante um ano. “Estou certa que conhecer um pouco das outras áreas nunca é mau”, conta entre risos. O apoio da mãe foi importante, contudo admite que “nem todos têm pais tão compreensivos”.
Agora Bruna está bem. Feliz por frequentar um Curso Técnico Superior Profissional e sem receio de estar a traçar um caminho diferente da maior parte dos colegas da sua idade. Já Mariana encontra-se do lado oposto e sem apoio dos pais.
“Andei um ano a enganar os meus pais, não tinha coragem de lhes dizer que chumbei”. Contou-lhes a medo e, apesar de terem reagido mal, apercebem-se que têm de dar tempo à filha para amadurecer ao seu próprio ritmo. “Decidi fazer uma pausa. Estou agora a trabalhar. Estou a crescer sozinha e a refletir na minha vida”.
Quanto ao futuro, ainda a medo, sente que já encontrou a tal “luz ao fundo do túnel”. E, apesar de sentir que teve de tomar uma decisão numa idade “tão prematura”, chuta para o ar: “acho que Ciências da Comunicação é o meu curso de sonho”. No entanto, por agora, precisa de tempo para si mesma. “Andei três anos a saltitar, preciso de paz interior. Preciso de acreditar nas minhas palavras”.