2020 começou com um acontecimento inédito no mundo do cinema. Pela primeira vez, um filme estrangeiro ganhou o prémio de Melhor Filme nos Academy Awards, genericamente conhecidos como os Óscares. Que impacto tem esta conquista na forma como os espetadores norte-americanos olham para os filmes estrangeiros?

Falo de Gisaengchung, Parasitas em português, do realizador sul-coreano Boon Jong-Hoon, que nessa noite também levou para casa o Óscar de Melhor Filme Internacional. No entanto, já um mês antes, Jong-Hoon tinha dado que falar durante a cerimónia dos Globos de Ouro, ao afirmar que “quando [os americanos] ultrapassarem a barreira de uma polegada das legendas, conhecerão muitos mais filmes incríveis”.

Alvo de críticas por uns e aplausos de outros, é inegável que nos deixou a pensar acerca do paradigma norte-americano no que diz respeito ao visionamento e posterior reconhecimento de filmes estrangeiros. A indústria cinematográfica de Hollywood é a mais antiga e mais bem-sucedida em termos de receita e a língua inglesa é uma das mais faladas do mundo, assim encontramo-nos perante a fórmula perfeita para uma predominância americana no cinema.

De acordo com dados recolhidos no website Box Office Mojo, em 2013 a receita conjunta de filmes estrangeiros nos Estados Unidos da América foi de 15 milhões de dólares, denotando-se uma queda acentuada quando comparamos com os números de 2007, 38 milhões de dólares. Para além de não assistirem filmes legendados, os norte-americanos também não possuem a tradição de os dobrarem, pelo que diminui ainda mais a probabilidade de assistirem filmes oriundos de outros países. Portanto, por que se torna importante falar disto?

O cinema é uma fonte de conhecimento social e possui elementos extremamente importantes no que toca à promoção de diversidade cultural, ou seja, à aquisição de conhecimento acerca de outras culturas, contribuindo para o aumento da tolerância. Tomando o caso de Parasitas, são retratadas duas classes sociais opostas e a forma como coexistem no contexto das grandes cidades Sul Coreanas.

Perante este contexto aparentemente negativo, é possível nomear alguns aspetos positivos como a existência de um maior acesso a filmes estrangeiros e um crescimento da familiarização com legendas, ambas consequências da internet. Isto é algo de que a Netflix já se apercebeu e Greg Peters, Diretor Executivo de Produto da empresa, revela que estão a ser reforçados os conteúdos fora dos Estados Unidos. Para além disso, esses esforços têm sido compensados, como é o exemplo da série alemã Dark, cujos espectadores são 90% estrangeiros.

Deste modo, considero a atribuição de um Óscar de Melhor Filme a um produto de cinema internacional um marco na história da indústria cinematográfica. Mais importante ainda, considero este um ponto de partida, já tardio, para o alerta da importância do visionamento de filmes estrangeiros para a promoção das diferentes culturas.