João Bessa, docente da Escola de Medicina da Universidade do Minho, é o novo Presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental.
Promover a participação e renovação da sociedade a que vai presidir, impulsionar a investigação clínica e fundamental em psiquiatria, potenciando a proximidade com a sociedade civil são alguns dos objetivos de João Bessa. A tomada de posse é este sábado, em Lisboa, e o mandato do docente corresponde ao triénio de 2023-2025.
Desenvolver iniciativas inovadoras de formação clínica é um dos planos de João Bessa. Em entrevista ao ComUM, o docente detalha este objetivo: “esta eleição para presidente eleito da sociedade é um pouco reconhecimento daquilo que nós como equipa, na Escola de Medicina, temos feito”, começa por dizer, salientando alguns exemplos.
A nível pré-graduado, um dos métodos é trazer a perspetiva do doente para as aulas de psiquiatria. Com isto, há o testemunho de uma forma direta e sem interlocutores, mas também “muito positiva e com esperança daquilo que é viver com uma perturbação”. A nível pós-graduado, existe um curso de introdução à especialidade de psiquiatria chamado I-Psiquiatria, onde é possível jovens médicos interagirem com a simulação clínica de ocorrências.
Em relação ao Orçamento do Estado para a saúde, João Bessa declara: “a área da saúde mental, do cuidado à pessoa com doença psiquiátrica tem sido, de certa forma, negligenciada naquela que é a atribuição das verbas necessárias”. Há necessidade de criar condições físicas para receber as pessoas, “em fases às vezes de grande sofrimento”, e de contratar e formar novos técnicos, pois este é um domínio “muito exigente” em termos de recursos humanos.
“Há uma preocupação interna no bem-estar psíquico dos nossos alunos, não é só na questão pedagógica. Preocupamo-nos também com a pessoa e essa é a raiz da Escola de Medicina”, conferencia João Bessa em relação à vulnerabilidade da saúde mental dos estudantes. Aborda o risco de burnout pelo grau de exigência do curso de medicina e destaca o trabalho de acompanhamento feito pela Escola.
A questão do apoio prende-se com o desenvolvimento de estratégias. Por um lado, o ambiente de trabalho dos alunos que facilite o bem-estar físico e psíquico, nomeadamente, a acessibilidade ao corpo docente. Por outro lado, a ajuda aos alunos que se encontrem em situações de sofrimento psíquico e que precisem de apoio e, nesse âmbito, existe a Comissão de Apoio ao Aluno em dificuldades.
No entanto, o professor realça que “não é um fenómeno exclusivo nem da Universidade nem de Portugal”, está “em diversas áreas do conhecimento e da formação académica”.
Neste seguimento, os dados do relatório de 2019 do Observatório Português dos Sistemas de Saúde (OPSS) foram tópico de análise. Contextualizando, Portugal ocupa, na lista dos países desenvolvidos, o terceiro lugar no consumo de antidepressivos e o primeiro em ansiolíticos. Para o docente,o primeiro passo é “conhecer bem o fenómeno” e, por isso, não chega olhar para os números. “É preciso perceber em que situações é que estão a ser prescritos esses fármacos, por quem é que estão a ser prescritos esses fármacos e durante quanto tempo”.
Sublinha a ideia errada de que é no contexto da psiquiatria que os medicamentos estão a ser prescritos de maneira indiscriminada. A maioria das perturbações leves a moderadas são tratadas nos cuidados de saúde primários e, estes fármacos, “não podem nem devem ser utilizados para tratar sintomas, como por exemplo, a insónia”.
“Os dados desse observatório têm que ser complementados, têm de ser detalhados e mais aprofundados”, refere o psiquiatra. Contudo, acredita que há cada vez mais consciencialização, por parte da comunidade médica, de que o problema existe.
Por último, João Bessa considera que, em Portugal, ainda há alguns “défices” na acessibilidade ao conhecimento sobre saúde mental. Existe igualmente a permanência de questões importantes relacionadas com o estigma sobre as perturbações psiquiátricas e a saúde mental, todavia, assiste-se a um conjunto de iniciativas que têm combatido essa visão deturpada. “Acho que há um caminho interessante que tem sido percorrido nos últimos anos que passa muito pela sensibilização da nossa população”, admite.