Chegou a meio da época ao Minho. Jogou, viu e festejou duas subidas em tempos de pandemia. Depois da vida ter estado em risco, o algarvio Tavinho traçou a tática para o futuro enquanto recordou o passado, em entrevista exclusiva ao ComUM.

Foi fora de campo que Tavinho teve o adversário mais difícil. No jogo mais importante de toda a sua caminhada, onde a vida ameaçou mostrar-lhe um cartão vermelho, o avançado não tremeu e voltou ao relvado depois de alguns dias em coma. O atual jogador do FC Vizela recordou que posteriormente ainda teve “a carreira em risco”, mas que nunca lhe passou pela cabeça desistir. O foco e a persistência deste atleta de 26 anos levaram-no a festejar duas subidas esta época, a acompanhar o sonho de chegar à Liga NOS, e quem sabe, a um cantinho especial em Espanha. Entre o lembrar de um treinador que lhe é especial, “duas facadas assim sem mais nem menos”, a dificuldade de conciliar o trabalho com o futebol e as expectativas vizelenses para 2020/21, Tavinho reviveu a curta carreira que teve um intervalo esta época, quando ainda nos quadros do SC Farense teve uma lesão que interrompeu a sua afirmação.

Fotografia: SC Farense

Subiste de divisão com o SC Farense, onde estiveste metade da época, e com o FC Vizela, o teu clube atual. Como foram os festejos com a situação que se vive agora?

Estava em casa quando soube. Recebi uma mensagem no WhatsApp e depois festejamos todos por via Zoom. Bebi uma cerveja e a primeira coisa que fiz foi atirar-me para a piscina com a camisola do Vizela. É diferente festejar assim, preferia estar dentro de campo.

Esta foi na verdade a tua terceira subida na carreira. A primeira acabou por ficar manchada por um momento difícil. O que te lembras dessa noite?

Naquele dia ia jogar [ainda pelo SC Farense] contra o Olhanense, e onde acabamos por ganhar. Garantimos os play-offs e o mister deu três dias de folga. Já tínhamos cumprido um dos grandes objetivos. Fomos sair e divertimo-nos a noite toda. Depois quando a gente saiu houve um indivíduo que não conheço que chegou por trás de mim, chamou-me e deu-me duas facadas assim sem mais nem menos.

O que pensaste nesses momentos?

Estive quatro dias no hospital e estive em coma. Naquele momento só pensei no meu filho. Tinha acabado de o ter, tinha dois meses, o pensamento foi só e exclusivamente ele.

Depois de estares livre de perigo, em que situação ficou a tua carreira?

Tive a carreira em risco. Quando consegui falar, apesar da dificuldade, doía-me muito a garganta e os pulmões. Eu perguntei ao medico se havia a hipótese de voltar ao futebol e ele disse-me “depende do progresso que tiveres aqui, não te posso dar uma resposta”. Só passado quatro ou cinco dias é que voltei a perguntar e o médico respondeu-me “sim, podes ficar tranquilo”. E aí é que fiquei feliz por poder voltar a jogar à bola e voltar a fazer o que eu gosto, apesar de ter sido difícil ao início.

Na formação tiveste alguém que te marcou para o resto da carreira. Quem foi e porque é que o consideras especial?

O treinador da minha formação, o Bruno Saraiva. Se não fosse ele apostar em mim eu não estaria onde estou, não era o jogador que sou hoje. Já esteve na Primeira Liga no SC Olhanense, onde conseguiu a manutenção, mas acabou por sair. É um grande treinador e uma excelente pessoa.

No início da carreira tiveste de conciliar o futebol com o trabalho. Como é que se gere esses dois mundos ao mesmo tempo?

Há muitos clubes que estão no Campeonato de Portugal que não são profissionais, e há muita gente que tem de juntar o trabalho e o futebol. Não se ganha muito dinheiro em certas equipas. Eu, por exemplo, cheguei a faltar muitas vezes aos treinos. Nem sempre era fácil conciliar os horários. Muitas vezes treinávamos à noite e eu trabalhava, então tinha de faltar aos treinos.

Até que ponto algum dia chegaste a pensar em desistir do futebol face às outras obrigações?  

Nunca me passou pela cabeça desistir. Sempre estive focado e consegui chegar a um bom nível. Já estive na Segunda Liga e voltei agora, espero atingir a Primeira Liga que é o objetivo de todos os jogadores que jogam no terceiro escalão.

No SC Farense passaste de uma aposta regular para um jogador com poucos minutos. O que aconteceu para essa mudança de estatuto?

Eu na pré-época estava muito bem, o mister apostava em mim e jogava. Depois no início tive uma lesão, uma hérnia inguinal e isso atrasou-me um bocadinho. O treinador tentou voltar a apostar em mim. Joguei contra o Cova da Piedade, mas não estava com o ritmo que ele queria e que era preciso para mim. Depois passou mais uma semana e voltei-me a lesionar outra vez, por causa da hérnia, não estava bem sarado. Eu tentei apressar, mas foi a pior coisa que fiz.

Fotografia: FC Vizela

Chegaste ao FC Vizela durante esta temporada. O que te fez viajar de uma ponta do país para a outra, e ingressar numa divisão inferior?

O projeto. Eu já acompanho o FC Vizela algum tempo. Há três anos seguidos, se não me engano, que vão aos playoffs e estão quase sempre ali na subida à Segunda Liga e depois não conseguem. E o que me atraiu foi o projeto deles este ano. Falei com a direção e com o mister e aliciou-me bastante, foi um passo importante para eu vir para aqui.

Já contas com alguns minutos nas pernas na segunda divisão. Consideras a formação vizelense preparada para responder às exigências que a subida traz?

Sim, considero. A gente tem uma boa equipa. Certamente que o treiandor e a direção vão trazer reforços, o que é bom para o FC Vizela se aguentar na Segunda Liga. Podemos fazer um bom campeonato.

Qual é a adaptação mais difícil: passar das distritais para o Campeonato de Portugal, ou passar do Campeonato de Portugal para a Segunda Divisão? E porquê?

O maior impacto foi a subida à Segunda Liga. É muito complicado. Todas as equipas têm qualidade, os jogadores são muito bons. A adaptação mais difícil foi essa. A intensidade, a qualidade, tudo é mais difícil.

No FC Vizela, apesar de pouco tempo, tiveste a possibilidade de disputar uma série mais nortenha e no SC Almancilense e SC Farense uma divisão mais algarvia. Que diferenças realças de uma região para outra em termos futebolísticos?

Há muita qualidade nas duas regiões. Mas o que eu assinalo mais diferente é a intensidade. Cada lance que os nortenhos vão é para morrer, como se fosse o último.

Que planos defines a nível individual daqui para a frente? Tens algum sonho?

Fazer um bom campeonato na Segunda Liga, poder ajudar os colegas alcançar o objetivo, e poder marcar o número máximo de golos e assistências. Um sonho é o Real Madrid, mas para chegar lá é preciso trabalhar muito, mas quem sabe.

Como defines o balneário vizelense?

A malta é muito divertida. Top, dos melhores balneários que apanhei.

Qual o jogador mais engraçado da equipa?

Aqueles gajos são uma cambada de macacos, são todos muito divertidos. Mas o Koffi é muito engraçado, é demais.

Tavinho

Fotografia: Paulo Jorge Magalhães/Global Imagens

Qual é o jogo que te ficará sempre na memória pelos melhores motivos?

Este ano contra o Braga B. Tinha acabado de chegar, tinha feito duas semanas, não fiz o primeiro jogo com o Marítimo B, e contra o Braga B marcou-me muito ter feito dois golos e ter a minha mulher e o meu filho assistir. Consegui ajudar a equipa. Nunca mais vou esquecer.

E pelos piores?

Foi um jogo com o Sacavanense. Na altura [ainda no SC Farense] não havia play-offs e bastava o empate para a gente se manter em cima e poder ir à final. Acabamos por perder por 2-1, falhámos o acesso e foi muito triste vir de Sacavém para o Algarve, parecia um funeral.

Quem foi o melhor jogador com que partilhaste balneário, e o melhor jogador que já defrontaste?

O melhor com que joguei não consigo, foram muitos. Como adversário destaco o Cássio Scheid, ele foi meu colega de equipa passados uns meses. Na altura eu estava no Almancilense e ele no Farense, acho que foi por causa desse jogo que fui para lá depois.