Para o professor que lecionou durante 20 anos, a aprendizagem é “um processo de intercâmbio, em que todos temos sempre algo para dar e algo para receber”.

Joaquim Fidalgo, professor e jornalista, é membro da equipa docente do ICS desde 1998.  Apesar de estar reformado desde abril, o comando das duas unidades curriculares que detinha, assumiu-as até ao final do ano letivo. A sua última aula foi a 4 de junho.

Em entrevista ao ComUM, falou de como foi passar os seus conhecimentos aos jovens, dos desafios da carreira. No fim, deixa um conselho para “chegar o mais perto possível do sonho”.

ComUM- Qual o balanço que faz destes anos enquanto professor?

Joaquim Fidalgo- Faço um balanço muito positivo, embora sejam os alunos quem estão em melhor posição de fazer balanços da atividade dos professores. Fui jornalista durante 20 anos e professor de jornalismo nos 20 anos seguintes. Julgo que consegui ligar bem estes dois tempos, trazendo para a sala de aula muita da experiência e da reflexão que fui acumulando em trabalho: na rua, com as pessoas e na redação. Entendo que uma boa articulação entre o campo profissional e o campo académico é muito útil na formação de jornalistas e é isso que há muitos anos tentamos fazer na UMinho. Eu, pessoalmente, também sou, de algum modo, um exemplo dessa articulação, o que me permitiu ter sempre uma grande preocupação, tanto com o estudo e a reflexão teórica, como com o desenvolvimento aprofundado de saberes práticos.

ComUM- Quais as experiências que mais o marcaram durante o seu percurso na Universidade do Minho?

Joaquim Fidalgo- Eu também fui, de certo modo, aluno na Universidade do Minho, pois, enquanto dava aulas, também me preparei para fazer um doutoramento, o qual terminei em 2007. E essa foi uma experiência muito marcante, claro! Outra foi, logo nos primeiros anos, a direção de um jornal mensal, o UMjornal, que acabou ao fim de dúzia e meia de edições, porque se tornou incómodo para o poder – coisa que acontece a muito bom jornal por esse mundo fora. Foi muito marcante ainda todo o processo de transição para o chamado “modelo de Bolonha”, que implicou uma alteração profunda dos nossos cursos e planos de estudos. Marcou-me igualmente o período de dois anos em que fui diretor do Departamento de Ciências da Comunicação, com muito trabalho e muitas canseiras, mas com interessantes desafios para gerir no dia a dia. Marcou-me, enfim, a realização de alguns congressos cá na casa, com grande capacidade organizativa da nossa parte e grande mobilização de toda a gente: docentes, estudantes, funcionários. É exemplo o Congresso Internacional da IAMCR em 2010. E mais momentos marcantes podia enumerar, felizmente! Marcaram-me, acima de tudo, as pessoas com quem tive a sorte de partilhar vida durante tantos anos e de quem acabei amigo.

ComUM- Durante estes anos, o que é que mais aprendeu com os seus alunos?

Joaquim Fidalgo- Aprendi, sobretudo, um grande princípio: que todos nós podemos e devemos aprender com toda a gente. O processo de aprendizagem não é, no essencial, um processo de “transmissão de dados” de uma gente para outra, mas é, sobretudo, um processo de intercâmbio, de correlação, de troca permanente entre uns e outros, em que todos temos sempre algo para dar e algo para receber. E quando digo “algo”, não é só dados, conteúdos, matéria; é atitudes, é comportamentos, é modos de estar e de viver, é razão e é emoção, é pensar e é sentir. E para estas relações de aprendizagem, nós vimos sempre com os nossos mundos próprios, com as nossas experiências únicas, com as nossas perspetivas pessoais – e temos, portanto, sempre muitíssima coisa para a troca!

 ComUM- Qual o sentimento que fica? A satisfação de ter cumprido um ciclo ou a angústia de sair?

Joaquim Fidalgo- Não tenho qualquer angústia pelo facto de ver chegar ao fim, por naturalíssimas razões de idade, esta fase da minha vida. Claro que não me importava de ainda só ter 40 ou 50 anos, mas isso não é possível. Chego à reforma com alguma naturalidade, satisfeito pelo muito que pude fazer, em muito diversas situações profissionais, durante mais de 40 anos de intensa atividade, mas com vontade de continuar a viver. Acabou um ciclo, não acabou a vida. Continuarei ligado à UM enquanto investigador no nosso Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS), continuarei a sentir esta casa muito como a minha casa, e vou fazer- agora com mais tempo- muitas outras coisas de que gosto: ler mais jornais e mais livros, jogar golfe, cantar com os amigos e tocar muita música, ajudar as filhas e brincar com os netos, cuidar melhor do jardinzito lá de casa, comprar peixe e cozinhá-lo com prazer, passear junto ao mar espantoso da minha terra… Não falta que fazer, e bom!

ComUM- Mudava alguma coisa no seu percurso?

Joaquim Fidalgo- De certeza que mudava coisas no meu percurso, se agora o fosse fazer outra vez, mas não sou capaz de indicar nada em concreto. Todas as nossas escolhas de vida são função dos momentos em que as fazemos e dos contextos em que estamos envolvidos. Um novo contexto implicaria, muito provavelmente, decisões diferentes. Isso não implica arrependimento pelas que foram tomadas antes, nos contextos em que o foram.

ComUM- Se tivesse de dar um conselho aos jovens que ambicionam fazer carreira na área do jornalismo, qual seria?

Joaquim Fidalgo- Dava o conselho que dou sempre quando me perguntam isso: não desistas! Se queres mesmo ser jornalista, não desistas. Pode demorar meses, pode demorar anos, pode ser necessário ir por caminhos mais diretos ou por caminhos mais sinuosos, pode ser preciso trabalhar num meio diferente do que se quereria, mas o importante é não desistir. E ir caminhando no sentido de chegar o mais perto possível do sonho.