Para os Bombeiros Voluntários de Braga, a principal dificuldade no combate aos incêndios está na atitude da sociedade.
Não há hora para o despertar de uma chama. Com o lema “vida por vida, todos por um”, inicia-se mais um dia na corporação dos Bombeiros de Braga. Para Pedro Dias, sub-chefe da corporação, o turno começa às sete da manhã. Nestes dias não há hora de saída. Não há garantia de regressar. Não há planos com os amigos ou com a família. Existe sim um sentimento de medo na hora da partida. Tal como o Pedro e, segundo o PORDATA, existiam, no ano de 2018, 27.649 bombeiros inscritos em Portugal.
Devido ao elevado risco de incêndio, Portugal encontra-se em estado de alerta. De acordo com os dados provisórios disponibilizados pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, ICNF, à agência Lusa ,entre 1 de janeiro e 30 de junho, do presente ano, registaram-se 2.143 incêndios rurais pelo país.
Face a este panorama, a cidade bracarense representa um dos pontos de maior risco. Segundo a informação disponível na página do Facebook dos Bombeiros Voluntários de Braga, só no mês de julho ocorreram 44 incêndios florestais. Em conversa com o ComUM, Pedro Ribeiro, Comandante dos Bombeiros Voluntários de Braga, sublinha que esta não é uma realidade nova. “Agora no verão temos esses incêndios com maior intensidade, com maior dimensão, efetivamente, por causa das condições meteorológicas”, realça. Contudo, esclarece: “Nós funcionamos, 24 a 24 horas, de segunda a segunda, 365 dias por ano, os bombeiros estão sempre cá, nunca podem parar”.
De momento, a atuação da Corporação dos Bombeiros Voluntários de Braga encontra-se dividida em três setores: os serviços de socorro imediato, o transporte de doentes e os serviços de presença, tais como as cerimónias civis e religiosas. Contam com o apoio de 90 operacionais e oito viaturas.
Com a chegada da covid-19, a respetiva corporação sofreu uma queda acentuada na mão de obra disponível. Cátia Silva, adjunta do comando, relata a situação. “Até no voluntariado tivemos dificuldades, eram muitos os receios por parte das famílias, somando-se os voluntários que são profissionais de saúde pelo que não podiam comparecer.” Para a profissional, foi um dos períodos mais difíceis e exigentes.
Por sua vez, para Pedro Ribeiro, a maior dificuldade esteve sempre lá: lidar com os carros inaptos para o combate dos incêndios. “Já têm uns aninhos, estamos sempre a fazer apelos e há pessoas que continuam a perguntar se os bombeiros não são do Estado e a resposta é não”, declara. E Pedro Dias acrescenta: “Nós dependemos em exclusivo do nosso trabalho. Aliás, nós fazemos o transporte de doentes não urgentes para podermos ter uma receita ao final do mês, para podermos pagar aos nossos funcionários.” Segundo o subchefe, o único valor atribuído pelo Estado é relativo ao serviço de emergência hospitalar. O valor pode ir desde 5.75 euros até aos 11 euros por pessoa, dependendo dos escalões ou taxas de saída. “É um serviço muito mal pago que obriga as associações a procurar mecanismos para poder cumprir com as suas obrigações”, salienta.
No entanto, nem tudo é negativo. De acordo com o comandante dos Bombeiros Voluntários de Braga, desde há seis anos para cá, que a corporação recebe apoios do Município. “De momento o valor acordado é de 15 mil euros anuais, tendo já sido feita uma promessa de um aumento para o ano de 2021, para o valor de 30 mil euros anuais”, esclarece. Outro dos pontos em acordo passa pela construção de um novo quartel em 2021. “Quando à noite a sirene interna chama as pessoas por causa de um incêndio, a maior parte das pessoas tropeça nas escadas porque não há espaço”, explica. Para Pedro Ribeiro, o essencial é que haja dignidade no exercício da profissão.
Todavia, as ajudas do município não são suficientes. Segundo o Comandante, por mês, os bombeiros necessitam de reunir a quantia de 50.000 euros, de forma a atender às necessidades dos veículos, recursos físicos e humanos, entre outras despesas.
Neste seguimento surge a importância do apoio da sociedade. De forma a apaziguar o valor, uma das fórmulas tem consistido na aquisição de sócios. Por sua vez, o número mantém-se aquém do esperado. “Numa sociedade com 20.000 habitantes, só existem 2000 sócios”, aclara. De momento, para os sócios, o valor da quota anual é de 12 euros, ou seja, um euro por mês.
Não obstante, aos olhos de Pedro Ribeiro, na altura do verão o mediatismo aumenta os apoios. Apoios esses que passam pela entrega de garrafões de água à corporação. Ainda assim, “não só de água vive o bombeiro”, remata o comandante. Como tal, deixa um apelo às empresas: “Nós agradecemos o carinho, porque evita despesas extra, mas, às vezes, o que acontece é que certas empresas em vez de gastarem o dinheiro em determinados eventos, passem a olhar para nós, façam uma doação para conseguirmos adquirir um carro-tanque.” Para o profissional, esta seria a chave para um maior sucesso no combate aos incêndios.
De forma a enfatizar a necessidade de apoios, recorda ainda que todos os anos existe um recrutamento de novos elementos através das páginas de Facebook e do Instagram. Como tal, explica o processo de inscrição. Para a inscrição, a pessoa deve ter como escolaridade mínima o 9º ano. É feito um inquérito a nível interno e, posteriormente, passam por mais três estágios: o processo de formação, o processo de estágio e a conclusão da recruta. No total o processo tem a duração de um ano. “Queremos muito ter cá bombeiros, mas cada vez mais esta profissão exige que tenhamos cuidado na seleção”, admite.
À parte do trabalho dos bombeiros, existe ainda, na cidade bracarense, um outro órgão fulcral na hora H: o Comando Distrital de Operações de Socorro. Atualmente, possui 19 membros aos quais cabe assegurar a vigia. De acordo com o Comandante Operacional Distrital de Braga da ANEPC, Hermenegildo Abreu, só no ano de 2019, ao longo de todo o distrito, foram realizadas 102.140 ocorrências, distribuídas entre incêndios industriais, florestais, urbanos e transportes rodoviários; acidentes; danos em infraestruturas e vias de comunicação; pré-hospitalar, entre outras.
Perante o panorama atual de incêndios, a verdade é que em ambos os casos, os profissionais deixam um apelo à sociedade, reforçando que pequenos gestos podem fazer toda a diferença. Hermenegildo Abreu ressalta ainda que, nesta época difícil, “todos somos proteção civil.”