Júlio Ferreira, atleta de taekwondo português, que representa também a Universidade do Minho, foi campeão europeu na categoria de pesos olímpicos em Sarajevo, ao vencer na final o espanhol Jon Cintado. Em entrevista ao ComUM, o atleta do SC Braga falou sobre o balanceamento necessário entre a vida académica e a a vida de desportista.
A sensação de ser campeão europeu
Para Júlio Ferreira, ser campeão europeu “teve um gostinho especial”, porque foi a primeira vez que o atleta obteve o primeiro lugar na categoria de pesos olímpicos. Para além disso, foi a primeira conquista depois da paragem devido à pandemia e, conseguir este resultado, depois de muito tempo parado, é sinal que se faz um “excelente trabalho em Portugal”. O minhoto de 26 anos orgulha-se ainda de poder “levar o nome do clube e o do seu país aos mais variados cantos do planeta”.
A paixão pela modalidade
Com necessidade de praticar uma modalidade, Júlio Ferreira acabou por entrar no Taekwondo “por acaso”. “Comecei, como em qualquer desporto, por aprender a parte mais técnica”, revela. Mais tarde, chegou à fase das competições e a partir daí tudo “ganhou um sentido”. Com o tempo, os resultados do português começaram a aparecer e, com a ajuda de todos os incentivos, ficou mais fácil manter o foco nos objetivos planeados.
O taekwondo também acabou por transmitir ao atleta ferramentas fundamentais para enfrentar problemas do dia-a-dia. A modalidade exige “adaptabilidade” e uma “alta capacidade de reação em situações de pressão”. “Conseguimos resolver problemas com alguma rapidez e até trabalhamos melhor sob pressão, porque estamos habituados a esse ambiente”, esclarece o jovem atleta.
Para além disso, sendo o seu desporto uma arte marcial, desenvolve nos praticantes um sentimento de respeito e disciplina. “Ajuda-nos a separar momentos mais sérios de momentos mais lúdicos”, afirma o atleta, e acrescenta que, por vezes, essas caraterísticas são uma mais valia no âmbito das relações interpessoais.
Adaptação em tempos de pandemia
Com a chegada da pandemia da Covid-19, os desportos com maior contacto, incluindo as artes marciais, acabaram por ser fortemente afetados. O atleta português revela que foi seriamente prejudicado, “estávamos [Júlio Ferreira e equipa técnica] numa fase de preparação para os pré-olímpicos e chegámos a estar na Bélgica, dois dias antes do início do confinamento”. Durante o tempo de confinamento, “a única hipótese era um trabalho mais físico e técnico feito em casa e não tanto tático, porque é impossível replicar o que é um atleta à nossa frente a reagir às nossas ações”.
Em setembro, Júlio Ferreira começou a treinar em equipa, mas ainda com algum receio, “usando sempre máscara e trabalhando sempre com o mesmo atleta para reduzir o risco de contágio”. No início de novembro e com o aproximar das provas, “começamos a treinar mais situações combate corpo a corpo, mas sempre com a noção das responsabilidades que temos que ter fora do treino”. Para já, o atleta informa que ainda não houve nenhum problema. Em relação às provas que já aconteceram durante a pandemia, Júlio Ferreira comenta que a organização do Campeonato da Europa não foi “perfeita”, mas que houve preocupações de forma a manter os atletas isolados e fora de perigo.
A realidade de um atleta-estudante
Para além de atleta de taekwondo, Júlio Ferreira é também estudante na Universidade do Minho e terminou o mestrado em Arquitetura na passada quarta-feira. O bracarense sublinha a compreensão dos professores e da própria universidade e deixou claro que “é possível fazer ambas as coisas”. O atleta destaca ainda que a Universidade do Minho e as outras instituições, como o SC Braga, o Comité Olímpico e mesmo a FADU “foram sempre muito compreensivas e ajudaram-me das maneiras que podiam para que conseguisse conciliar”.
Mesmo com a compreensão de todas estas instituições, Júlio Ferreira confessa que, por vezes, torna-se “difícil” e que, no seu caso, “a arquitetura é um curso muito prático e há coisas que acabam por ser impossíveis de fazer”. O atleta expressa que existem momentos em que se têm de concentrar num dos lados e deixar o outro para segundo plano durante algum tempo.
No entanto, Júlio Ferreira afirma que tem “sorte”, porque o gosto pela arquitetura consegue acompanhar de alguma forma a paixão pelo taekwondo. “O desporto permite-me viajar, conhecer culturas e modos de construir completamente diferentes e, certamente, o meu leque de referências arquitetónicas cresce devido a isso”. Conjugar as duas atividades “tem sido uma experiência fenomenal para o meu crescimento como arquiteto, como atleta e até mesmo como pessoa, porque permite-me ter mais noção da realidade”.
Objetivos para o futuro
Em termos académicos, Júlio Ferreira destaca gostar muito do estudo e da investigação e demonstrou vontade em continuar a evoluir a nível académico. Quanto à parte profissional mais direcionada para a arquitetura, “o meu sonho era ter o meu próprio gabinete, se possível até trabalhar sozinho”, menciona o atleta.
Relativamente ao desporto, “o principal objetivo são os jogos olímpicos do próximo ano”. “A curto prazo, temos sete/oito meses até aos jogos e claro que vencer faz parte dos objetivos”, afirm ainda o bracarense. Depois de realizados os jogos mais próximos, Júlio Ferreira pretende continuar ligado ao taekwondo: “manter-me na competição durante mais algum tempo, talvez até Paris 2024”. Mais tarde, e numa fase mais avançada, o atleta desvenda que gostava de tornar-se treinador, de forma a dar a conhecer aquilo que aprendeu. Por fim, o atleta do SC Braga afirma que tudo isto depende de muitas variantes e que “o objetivo principal será sempre realizar os projetos a que me proponho”.
Depois de atingir dois marcos importantes da sua vida – acabar o mestrado na sua área e conseguir um título de campeão europeu – Júlio Ferreira demonstrou ainda ter várias ambições a diversos níveis. O jovem atleta português agradece ainda à Universidade do Minho e ao Departamento de Desporto, por o terem ajudado sempre e por, de certa forma, o terem tornado uma pessoa melhor.