O ano de 2020 foi um ano intenso e peculiar. Mesmo sendo marcado como um dos anos mais difíceis da história, conseguimos assinalar um número significativo de produções que se destacaram. A música, o cinema e a literatura conseguiram, assim, sobressair mais uma vez e trazer-nos um pouco mais de conforto e paz. O ComUM fez uma compilação dos melhores filmes, séries, músicas e livros que este ano nos trouxe, para rever, relembrar ou iniciar na memória.
Cinema
Os 7 de Chicago – Para contextualização, The Trial of Chicago 7 corresponde a uma obra cinematográfica do mesmo argumentista de produções como o drama The West Wing (1999–2006), a série televisiva The Newsroom (2012–2014) e os filmes biográficos The Social Network (2010) e Steve Jobs (2015). Perante esta panóplia, não ficamos indiferentes à qualidade constante dos seus produtos. The Trial of Chicago 7 não foge à regra.
O drama histórico de Aaron Stocking conta-nos a história de oito homens acusados de incitar à violência na cidade de Chicago durante Convenção do Partido Democrata: Abbie Hoffman e Jerry Rubin do Partido Internacional da Juventude, Tom Hayden e Rennie Davis da Sociedade de Estudantes pela Democracia, David Dellinger, líder do Comité de Mobilização Nacional pelo Fim da Guerra no Vietnã, Bobby Seale, presidente nacional do Partido dos Panteras Negras e Lee Weiner e John Froines ativistas menores. Contudo, mais do que contentes por estarem entre os acusados, “nos Óscares dos protestos, é uma honra estarmos nomeados”. Esta afirmação demonstra o sentimento permanente na obra, o orgulho em defender-se no que se acredita. No entanto, falta saber se esse orgulho será suficiente para conquistar o pretendido (Título Original: The Trial of the Chicago 7).
O Dilema das Redes Sociais – Dirigido por Jeff Orloski, o documentário é uma análise pura do lado negro das tecnologias, mais precisamente da função manipuladora das redes sociais nas mentes dos seus usuários. Toda a verdade sobre o funcionamento corrosivo destas plataformas, como o Facebook, Youtube, Instragram ou Twitter, é exposta em 94 minutos de tensão. Vários ex-especialistas dos diversos algoritmos guiam o espectador nestas relevações chocantes, demonstrando todo o processo de controlo sob quem usufrui das redes sociais. Parece que nem tudo é um mar de rosas. Várias vezes, durante a obra cinematográfica, surge a ideia de que “se não estamos a pagar pelo produto, então nós somos o produto”, e é isso que o torna tão real, mas tão perturbante (Título Original: The Social Dilemma).
The Queen’s Gambit – A série segue a história de Beth Harmon, uma jovem prodígio que, após ficar órfã aos nove anos, aprendeu a jogar xadrez com os dos funcionários do orfanato onde foi acolhida. Beth rapidamente se tornou numa jogadora exímia, demonstrando a destreza de jogadores com o triplo da sua idade. O êxito imediato e algo inesperado da série advém, em grande parte, do enredo. Apesar de ter uma premissa que, normalmente, não entraria nos padrões de interesse da maioria das pessoas, o arco de Beth foi o suficiente para sustentar um dos maiores sucessos do ano. Sem ter medo de mostrar os tormentos por detrás do génio, The Queen’s Gambit é um retrato honesto e cru do preço a pagar por uma mente brilhante e sem paralelos. Por entre toda a aura de fascínio do mundo pela inteligência singular da jovem prodígio, Beth traz consigo os resquícios de um passado turbulento para um presente incerto, onde luta constantemente contra vícios e obsessões.
Outer Banks – A série da Netflix retrata a vida de um grupo de amigos que vivem em Outer Banks, Carolina do Norte. Vivem numa sociedade repartida em dois, os “Pogues” e os “Kooks”, cuja rivalidade é sentida no culminar da ação. O que destaca a série é o seu enredo: enquanto investigam o paradeiro do pai do líder do grupo, após uma tempestade ter afetado a população e despertado uma variedade de mistérios a serem resolvidos pelo grupo, eles próprios sofrem dificuldades que tornam esta obra cinematográfica intrigante. A série televisiva norte-americana de drama adolescente passasse no verão e, por essa mesma razão teve um grande impacto nos espectadores, uma vez que devido à pandemia o verão não foi aproveitado da mesma maneira que nos anos anteriores.
Dark – As viagens entre o espaço e o tempo são ambições que a Humanidade sempre demonstrou e a série alemã da Netflix, Dark, concretiza de forma fenomenal estes conceitos. Com estreia em 2017, a série que conta a história de uma pequena cidade em que desaparecimentos sem explicação e acontecimentos paranormais espalham medo pela sua população, não foi um smash hit, logo na sua primeira temporada. Foi, com a segunda temporada, lançada em 2019, que personagens como Jonas e Martha tomaram conta dos fãs desta produção de ficção-científica. Caracteriza-se pelo enredo único, inesperado, repleto de drama e emoção e que, apesar de em certos momentos parecer que as ações em nada se relacionam umas com as outras, quando vemos o último episódio, compreendemos que todos os momentos foram necessários para o desfecho. A série supera-se temporada após temporada, e neste ano, com a produção a chegar ao fim, foi com muita tristeza que choramos o alinhar dos 3 ciclos que a constituem. No entanto, mesmo acabando, esta terceira temporada destacou-se no evoluir da história e evidenciou-se a melhor das três.
Música
Midnight Sky – Lançada a 14 de Agosto de 2020, “Midnight Sky” corresponde à sétima composição do sétimo álbum de Miley Cyrus, Plastic Hearts. Propositadamente ou não, a música está associada ao número 7, comummente conhecido como o número da perfeição. Dizer que algo alcançou a perfeição é uma tarefa árdua. No entanto, “Midnight Sky” roça o limiar da sublimidade. Inspirada nos anos 80, é-nos dada a conhecer uma artista mais madura, que, por entre os mais variados brilhos, aproveita para nos falar de assuntos sérios, nomeadamente a desconstrução e normalização do “para sempre”.
Physical – Dua Lipa dizia que “common love isn’t for us”, não sei se ela estava certa ou não, mas que ela estava desejosa pelo contacto físico durante a noite toda, é algo que a mesma não esconde. Depois de ter dominado o cenário musical no fim de 2019, a artista entrou em 2020 com um segundo single poderoso para promover o segundo álbum, Future Nostalgia. “Physical” é uma música power pop e synth-pop e faz o nosso esqueleto tremer de vontade de dançar toda a noite sem querer saber das tristezas da vida. Foi um ano difícil e “Physical” foi o hino perfeito para nos alegrarmos. O sucesso da faixa foi estupendo, alcançando a marca de 500 milhões de reproduções no Spotify.
Rain On Me – O segundo single de Chromatica, de Lady Gaga, foi lançado a 22 de maio e quebrou a internet. A colaboração entre a artista e Ariana Grande atingiu o topo da Billboard .Uma música pop com inspiração dance, disco e até deep house empodera o ouvinte e convida a encontrar beleza na dor. “Rain on Me” é, então, a libertação das mágoas e o começo do processo de cura – “I’d rather be dry, but at least I’m alive”.
Cardigan – Composta e produzida pela cantora norte americana Taylor Swift, juntamente com Aaron Dessner, a canção faz parte do oitavo álbum de estúdio da artista, Folklore, lançado em julho de 2020. Trata-se de uma balada de folk acompanhada por um instrumental suave e melancólico, construído à base de sons de bateria, violino e piano. Liricamente, a faixa explora um triângulo amoroso fictício através da perspetiva de uma mulher chamada Betty, cujo nome é título de uma outra composição do mesmo disco.
Sweet Melody – O próprio nome denuncia a razão por esta música pertencer à lista. Amelodia marca uma nova era nas Little Mix. Para além de apresentarem ritmos mais complexos e coreografias mais elaboradas, foi depois de este álbum que Jesy Nelson abandonou o grupo por tempo indefinido. Apesar disso, é uma faixa que dá espaço a que todas se mostrem nas suas melhores versões e é daquelas que vamos ouvir muitas vezes, mesmo depois de 2020 acabar.
Literatura
Mapeador de Ausências – O novo romance de Mia Couto passa-se em Moçambique, nos períodos de pré e pós-independência. Conta-nos a história de Diogo Santiago, um professor universitário de Maputo, que, após vários anos, se desloca à sua terra natal, a cidade da Beira, para receber uma homenagem. A sua ida corresponde a uma autêntica viagem no tempo, Diogo relembra o tempo em Moçambique era uma colónia portuguesa. Do seu pai ganhou o gosto pela poesia e lembranças aterradoras, nomeadamente duas viagens a locais de massacres cometidos pela tropa colonial e a perseguição da PIDE.
O Avesso da Pele – O livro corresponde a uma obra de ficção literária brasileira. O seu autor, Jeferson Tenório, é já conhecido por narrativas como O beijo na parede (2013) e Estela sem Deus (2018). Em 2020, conta-nos a história de Pedro que, após a morte do seu pai, assassinado numa abordagem policial, procura resgatar e reconectar-se com o passado da sua família. Através do resumo apresentado, conseguimos perceber, desde logo, que serão abordadas relacionadas com a identidade individual e a complexidade do racismo.
Alguém está a Mentir – Esta obra era um dos livros mais esperados no ano de 2020 pelos amantes de thrillers. O livro é uma espécie de cluedo: um rapaz é assassinado e a história gira em volta dos cinco amigos que estiveram com ele na noite da sua morte. Quem o terá assinado? Esta é a pergunta que move a história desta obra que, apesar de ser um bom entretenimento, deixa algo a desejar. O final é bastante espectável, apesar de a autora tentar, algumas vezes com sucesso, confundir o leitor. No entanto, existem alguns pormenores que fogem a realidade, o que descredibiliza a obra e a torna menos interessante. Em suma, é um bom livro de entretenimento, e também para os iniciantes no gênero.
Dilúvio sem Deus – Em plena pandemia e num ano tão atípico como o de 2020, Joana Amaral Dias lança Dilúvio sem Deus. A leitura deste livro torna-se mais pertinente do que nunca. Em análise estão as grandes cheias do Tejo de 1967, cujo impacto foi mais penoso nos bairros lisboetas pobres. A autora relembra as vítimas esquecidas neste acontecimento e procede a tecer duras críticas à inércia do regime de Salazar. O déspota escolheu ignorar a tragédia e censurar os meios de comunicação social que tentavam noticiar a ocorrência. As vítimas poucas assistências receberam. Foram deixadas à mercê do destino. Perante tais relatos, o leitor concluiu que a condição socioeconómica foi e ainda é determinante na autopreservação humana perante a iminência de uma catástrofe. São 53 os anos que separam as cheias de 1967 e a pandemia, mas através desta leitura concluímos que ambas partilham muitos aspetos comuns.
A Coragem de Cilka – A obra de Heather Morris retrata, de forma crua e implacável, um depois do Holocausto. Cilka sobreviveu á vida no campo de concentração, no entanto, devido ao que fez para sobreviver, é punida sem misericórdia. Acusada de colaborar com os nazis, é mandada para a Prisão de Montelupich, em Cracóvia, onde tem de trabalhar forçadamente durante 15 anos. O livro é repleto de uma frieza estrema que habita a dureza da escrita. No entanto, é por causa disso, que o leitor não passa impávido ou de ânimo leve pela história, acabando por sentir duramente aquilo que Cilka sentira.
Artigo por: Ana Margarida Alves, Bruna Sousa, Ilda Lima, Inês Loureiro, Joana Dantas, João da Silva, João Sousa, Maria Pinto Freitas, Maria Sá, Mariana Pinto Fernandes e Patrícia Silva