Chega dezembro e o espírito de Natal invade ruas, casas e pessoas. Começam as correrias para comprar os presentes mais especiais, os petiscos mais apetecíveis, o peru e o bacalhau. A agitação de todos estes momentos repete-se ano após ano e a banda sonora que a acompanha também.

A lista de canções de Natal é infindável, mas as rádios, as plataformas online e as superfícies comercias insistem em não atualizar a playlist. Para além dos costumes já vindos da sociedade, cria-se em nós outra tradição: a de ouvir em loop os mesmos temas, todos os anos. Todos os anos, vários artistas se empenham para lançar um novo hit natalício, na esperança de que permaneçana mente dos consumidores e nas listas das rádios. Porém, são escassos os que têm essa sorte.

Christmas Saves The Year”, lançada este mês, tem todo o potencial para ser a música de Natal de 2020. Contudo, ainda não a ouvi uma única vez na rádio ou nas grandes superfícies comerciais. Também os Coldplay têm um dos mais belos temas natalícios alguma vez lançados, “Christmas Lights” e, uma vez mais, é uma faixa esquecida na gaveta. O que prevalece são os clássicos. Se não são os originais, são versões. É como se a indústria estivesse viciada, ou como se houvesse uma recusa ao que é novo e fresco e uma persistência em manter os temas conhecidos, porque, afinal, já é certo que vai haver adesão.

É impossível tocar neste ponto e o nosso cérebro não nos levar imediatamente para um tema em específico: “All I Want For Christmas Is You”, de Mariah Carey. São 26 os anos que nos separam do lançamento daquela que é a canção de Natal mais popular do Spotify em pleno 2020. De 24 de novembro a 30 do mesmo mês, o tema teve uma média de um milhão de streams diários na mesma plataforma nos EUA. Em 2019 e 2018, contou com pouco mais de 600 mil e 800 mil streams, respetivamente, durante o mesmo período. Tornou-se na música de Natal número um de 2019, no top 100 da Billboard, na que mais semanas ficou no top 10 do Reino Unido e no tema de uma artista feminina mais ouvido no Spotify em 24 horas. Três recordes validados pelo Guinness. É um clássico que domina a época natalícia.

Os contextos sociais e culturais são cruciais. É importante recordar o antigo, mas também dar espaço para que novas canções sejam feitas e, acima disso, escutadas. O problema não está em manter os clássicos, mas sim em não se dar oportunidade ao que é novo. Não podemos culpabilizar apenas a grande indústria pela falta de diversidade, porque esta age sempre com a vista em cima das maiores preferências dos consumidores. Mas, se não nos mostram novas opções, como podemos então conhecê-las? É um ciclo sem fim. O que é certo é que não vamos poder mergulhar no mar de temas que grandes artistas têm para oferecer se permanecermos nesta inércia ou no comodismo. Porque quem decide também é quem as ouve.

Chega dezembro e as ruas começam a cheirar a Natal. Surgem luzes em cada esquina, as árvores saem das arrecadações e a música começa a ecoar. É impossível negar que, acima das decorações, são as canções que mais nos ajudam, inclusive impulsionam, a entrar no espírito natalício. Contudo, a banda sonora deste Natal vai ser a mesma da do ano passado e, possivelmente, a do Natal de há 20 anos. Numa altura em que a diversidade musical nunca foi tão grande, estamos estancados numa playlist que não evolui. Se a música retrata uma grande parte da sociedade, o que é que se pode dizer de uma cultura que se prende aos mesmos temas ano após ano?