A equipa do Paris Saint-Germain e Moussa Marega já fizeram mais pelo escrutínio do racismo no desporto este ano do que as imensas campanhas de sensibilização e apelo ao fairplay a que constantemente assistimos. Mostraram-nos que realmente o desporto é o espelho da sociedade e é preciso mudar muita coisa nestes dois mundos.
O racismo esteve sempre presente no mundo desporto, mas há muitos outros atos discriminatórios que são banalizados por uma abordagem extremamente permissiva. De que adianta fazer com que os jogadores entrem em campo com camisolas e tarjas de apelo à igualdade, quando o espetáculo permanente que nos rodeia é o da falta de respeito pelo próximo? Veja-se os programas que preenchem as noites dos canais de televisão. Muitos contribuíram para essa irreal normalidade com que se tratam temas tão delicados e instigaram ódios latentes.
É muito simples mostrar apoio e solidariedade em todos os casos indignos que se tornam mediáticos. Difícil é evitar que estes se repitam e que todas as pessoas tenham uma voz. Não há uma solução milagrosa imediata, mas há atitudes e mudanças que têm de ser tomadas (e rápido). Relembre-se o caso de Moussa Marega que, no início do ano, ao abandonar o jogo em Guimarães, fez com que os portugueses refletissem sobre os comportamentos no desporto e os limites da rivalidade e paixão desportiva. Mas o que é que teria acontecido no “país do futebol” se o maliano não tivesse saído do relvado? Completamente nada! Aliás, o Tribunal de Guimarães até anulou a multa de 750 euros aplicada a um adepto do Vitória SC presente no episódio. Caminhamos em que sentido?
Mais recentemente, os jogadores do PSG e do Basaksehir também protagonizaram um momento histórico numa partida da Liga dos Campeões ao sair do campo. O jogo foi suspenso depois de alegados insultos racistas do quarto árbitro em direção a Pierre Webó. O racismo voltou a ser o assunto do dia e as reações ao incidente intensificaram-se, com a #NoToRacism a estar novamente nas trends das diferentes redes sociais. “Racismo e qualquer outro tipo de discriminação não têm lugar no futebol” foi o mote da UEFA após o incidente. É simples dizer isto, mas agora é preciso dar vida a esta frase.
Ainda houve quem dissesse que o racismo está na moda, como se falássemos de uma minissaia nos anos 60, mas a estupidez, de facto, nunca acaba. Na verdade, estas pessoas personificam (infelizmente) um pensamento coletivo dominante em Portugal. O racismo existe e continuará a existir enquanto, em vez de o assumir e combater, mantivermos o tabu e ignorarmos as nossas responsabilidades sociais. Todas as semanas há, em muitos recintos desportivos, manifestações de racismo dirigidas a atletas, árbitros, treinadores e até à pessoa que está ao lado na bancada. O desporto tem força suficiente para travar esta luta, mas tem de partir de cada indivíduo querer ser um agente de uma mudança desesperadamente necessária.
É fundamental repreender comentários racistas e xenófobos e é obrigatório que estes sejam punidos. Não é normal alguém estar um jogo inteiro a fazer comentários como “volta para a tua terra” e outras coisas ainda mais graves. Transpondo para a sociedade em geral, é surreal um homem ser assassinado a tiro na rua depois de ouvir “preto, vai para a tua terra”. E não é normal, apesar de todos os episódios de racismo e xenofobia que conhecemos, isto continuar a acontecer sem escrutínio. Num país onde o amor pelo futebol e pelo desporto em geral está acima do respeito pelo próximo, é preciso urgentemente mudar atitudes e mentalidades.