Baseado no romance de Philippa Gregory, Duas irmãs, um Rei é uma verdadeira obra-prima de drama histórico. O filme estreou em 2008 e reflete, não só um dos períodos mais escandalosos na história da coroa britânica, mas também uma época decisiva para a história europeia.

Numa intriga grandiosa e sensual, o romance e a traição são o pano de fundo para as escolhas e decisões de duas irmãs, Anne (Natalie Portman) e Mary Boleyn (Scarlett Johansson). Estas, impulsionadas pela ambição cega da sua família, têm que competir pelo amor do Rei Henry VIII (Eric Bana). Com base nas suas próprias personalidades, seguem caminhos diferentes, o que às vezes as coloca em conflito com o rei, com o povo da Inglaterra, com suas famílias e, até mesmo, entre elas.

A trama começa quando a rainha, Catarina de Aragão (Ann Torrent), é incapaz de gerar um herdeiro masculino. Assim, o homem de família Boleyn planeia tornar a sua filha mais velha, Anne, amante do rei.

No entanto, Anne, teimosa e desbocada, tem outros planos e aproveita esta oportunidade para, eventualmente, se casar com um fidalgo. Ao mesmo tempo, Henry apaixona-se pela inocente Mary, apesar de esta já se encontrar casada. O pai das irmãs, ganancioso por uma posição privilegiada na corte, impulsiona as filhas a fazerem tudo o que for necessário para agradar ao rei, com o objetivo de que uma, não importa qual, conceda um filho ao monarca.

A sorte da família Boleyn parece estar garantida quando Mary fica grávida. Contudo, quando quase sofre um aborto espontâneo, fica confinada à cama pelo resto da sua gravidez. Anne é convocada para evitar que a atenção do rei se desvie para outra mulher, mas “o tiro sai pela culatra” quando a irmã mais velha busca o afeto do soberano para si mesma. Agora, mais sofisticada e inteligente do que nunca, nega ao rei os seus favores sexuais, garantindo o seu interesse contínuo, ao ponto de este jurar nunca mais partilhar a cama com a esposa nem sequer falar com Mary, na esperança de, eventualmente, poder possuí-la.

A parte mais interessante da história é mesmo esta manipulação que Anne tem sobre o monarca, ao ponto de lhe exigir que anule o seu casamento real. “Quem tudo quer, tudo perde”, e nestes tempos de absolutismo tirano, romance ardente, caprichos e falta de fidelidade, o rei fazia o que queria e ainda lhe sobrava tempo para cortar relações com Roma e o Papa, por este não lhe dar o divórcio pretendido. Henry torna-se, então, o governador supremo da Igreja da Inglaterra, divorcia-se e assim passa a Inglaterra do Catolicismo ao Protestantismo.

Numa análise mais formal da obra cinematográfica, a narrativa foi bem conseguida, não só pelo excelente argumento e um elenco incomparável, mas também, pelo guarda-roupa notável. Este é de uma extrema qualidade e requinte, mas sem recair na ostentação. Para além dos figurinos, a direção artística é também digna de atenção, desde os cenários aos adereços.

Em termos de jogos de luz, reina a obscuridade. No entanto, a obra cinematográfica não se torna melancólico, mas sim concorre para um bom desempenho visual da obra. Do mesmo modo, a câmara recorre a panoramas laterais e enquadramentos à distância, colocando o espectador na posição daquele que espia ou que descobre algo, de íntimo ou privado.

O próprio retrato da monarquia não sucumbe à simpatia para com a casa real. Este sucumbe a um menosprezo radical, dado à manipulação, à hipocrisia, à ambição e à tirania feroz que reinam durante todo o filme.

Em suma, a história conta que talvez o rei não se devia ter preocupado tanto com o seu fracasso em produzir um herdeiro legítimo do sexo masculino, porque, ironicamente, é a sua filha Elizabeth que reinará o país por 45 longos anos. Pelo conhecimento amplo da história, existem imensas curtas ou longas-metragens, entre séries e filmes, que abordam este acontecimento. Contudo, este é um dos melhores filmes não só sobre este tema, mas um dos melhores dramas históricos já realizados.