Comemora-se esta sexta-feira, dia 19 de março, o Dia Internacional do Artesão, que reconhece a profissão e valoriza o legado que se passa entre gerações. O ComUM esteve à conversa com António Ramalho e os irmãos Baraça, artesãos barcelenses inseridos na tradição, que contam a sua experiência na área e o que os levou a querer honrar o trabalho dos seus antepassados.
“Ser artesão é criar, inovar e sentir-se bem com aquilo que se faz”
O artesanato consiste em criar “peças únicas, com qualidade e muito valor cultural e patrimonial”. Assim é o entendimento de António Ramalho sobre a sua profissão, que exerce há mais de 40 anos. Embora a tradição surja como um dos seus motes, a inovação é também palavra-chave, pois, “com o passar dos anos, a tendência é que a tradição se perca”, considera o artesão.
Para António Ramalho, tudo começou entre 1975 e 1976, com um pequeno cavalinho de barro. “Ainda a minha bisavó era viva, tinha sete anos talvez”, recorda. A sua bisavó, Rosa Ramalho, e a sua mãe, Júlia Ramalho, ambas artesãs, foram sempre a sua maior inspiração e o principal motivo para dar continuidade a este legado. O artista começou por ajudar a sua mãe e, com o passar dos anos, foi ganhando o gosto pela arte. “A minha mãe teve cinco filhos e, quando éramos pequenos, pedia ajuda para fazer algumas coisas e eu ficava sempre à beira dela”, revela.
Quando começou a assinar as próprias peças, sentiu que ganhou voz própria. “Os clientes vinham cá a casa e pediam-me para fazer algo sobre algum tema. E eu, em vez de fazer como a minha mãe e a minha bisavó sempre fizeram, tentava fazer à minha maneira”, afirma. Isto significava aproximar-se de um universo mais profano, sobre o qual sempre demonstrou um interesse maior, recordando, por exemplo, os “cabeçudos” que a bisavó fazia.
Para Ramalho, o artesanato é “um trabalho de grande responsabilidade”, na medida que se enquadra num meio tradicional familiar. Porém, não considera que este seja valorizado. “Não há quem queira pegar nisto, é um pouco mais difícil, porque os jovens não se agarram tanto às tradições familiares”, reflete. Acrescenta ainda que o artesanato ocupa o lugar de “uma luta diária”, que se sobrepõe às outras formas de arte que vão aparecendo e que aliciam mais facilmente as camadas jovens.
“O artesanato é uma prova de resistência”
Vítor e Moisés Gonçalves, mais conhecidos como os “irmãos Baraça”, têm um grande amor à cerâmica herdado da avó, Ana Baraça. Apesar de esta ser uma figura de “grande orgulho e inspiração” para ambos, os irmãos procuram sempre evoluir as suas peças “aos tempos atuais”, mantendo, contudo, o estilo que lhes foi transmitido.
O gosto pela cerâmica começou quando ainda eram pequenos, recordam. Ambos andavam na escola e a avó já os chamava para “brincarem com o barro”. Contudo, só depois de um primeiro contacto com exposições e feiras de artesanato por todo o país, convivendo com artesãos de diversas artes, é que começaram a ganhar “uma voz própria” e um “sentido de pertença na comunidade”.
Mesmo em tempos difíceis, Vítor e Moisés manifestam querer sempre “fazer mais e melhor”. Os seus clientes são também “uma grande fonte de motivação”, uma vez que os levam a “experimentar coisas diferentes com exigência e perfeccionismo”. Para além disso, afirmam uma “grande vontade de passar e ensinar esta arte” aos filhos, mas “só o tempo o dirá”.
Na atual situação pandémica, António confessa que o artesanato, por ser “tantas vezes desvalorizado”, torna-se ainda “mais complicado de gerir”. Apesar de tudo, mesmo sem feiras e exposições, o artista tem continuado a “produzir para aumentar o stock” e mostra-se esperançoso de que “melhores tempos virão”. As mesmas dificuldades são referidas pelos irmãos Baraça, que, mesmo assim, se sentem “aliviados” por terem conhecido “um meio muito vantajoso de venda”: as vendas online, pelo site e pelas redes sociais. Neste sentido, pretendem continuar a atividade, mesmo quando “tudo voltar ao normal”.
Artigo por: Francisca Alves e Raquel Rodrigues